sábado, 16 de julho de 2011

 Sergio Neumann

...e é para a minha filha, a pequena Sophie que eu dou tudo o que eu tenho de mais precioso.

Dou-te meu amor.


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...e amaivos uns aos outros como eu vos amei.

 









Theobald Daudt Vollman


O fim da guerra


Na fronteira do estado germânico com a França, um pelotão de soldados do exercito alemão, apesar da primavera de 1918 não ter sido uma das mais quentes; cansados e com pouca munição, olhavam para o céu, esperando cair das nuvens à salvação que eles aguardavam a meses, depois de terem combatido o inimigo sem obterem nenhum avanço.
Após horas de um silêncio que deixou vários deles em estado de loucura, um soldado entra correndo pela trincheira gritando:
_ Capitão, Capitão, onde esta o Capitão. Tenho ordens vindas de Berlim para ele e devem ser entregues imediatamente!
_ Ele está ao sul, soldado Vollman.
_Dank, Dankchum, - responde o jovem soldado de pouco mais de 18 anos e recém empossado no posto de ajudante de ordens, por ter ele salvo a vida de três combatentes em um bravo ato de lealdade e desprendimento como havia dito o próprio coronel alemão quando o condecorou com a insígnia de leal soldado da Alemanha.
Ao encontrar o capitão, um senhor de aproximadamente 45 anos e já cansado da batalha, Vollman diz com euforia, a noticia que ele atravessou mais de 15 km em meio à batalha, para entregar ao seu comandante:
_ Herr capitão, estas ordens acabaram de chegar de Berlim.
O capitão, ao olhar para o rosto daquele jovem soldado e deixa que pequenas lágrimas se formem no canto de seus olhos, se esquece de sua disciplina militar e o abraça dando graças a Deus pelo fim da guerra após quatro longos anos.
_ vamos voltar para casa! Disse o capitão ao soldado Vollman.
_ vamos para casa, capitão, vamos voltar para casa!
E assim, o valente soldado alemão sai por entre os demais soldados ainda entrincheirados e aos gritos, ele explode em uma alegria que contagia todo o pelotão, os soldados só ouviam Vollman gritando:
_a guerra acabou, a guerra acabou!!!
Chegava ao fim, a 1ª guerra mundial, a Alemanha havia assinado o armistício na “Floresta de Compiègne” e aquele 11 de novembro de 1918 era dia de comemorar em todos os cantos da Europa.

De volta para Neumunster


Após uma longa viagem em um trem cargueiro de volta para casa, vários soldados que estavam no front, desembarcaram em Berlim e Vollman não quis ficar para as festas entre seus amigos de farda e rumou imediatamente para a estrada para Neumunster, uma cidade com pouco mais de 2,000 habitantes, aproximadamente 250 km ao norte de Berlim. A notícia de que a Alemanha perdeu a guerra quando os políticos e diplomatas se sentaram a mesa de conversação de Versalhes ainda não havia se espalhado por entre os soldados e eles achavam que tinham saído vitoriosos. Só meses depois ficaram sabendo da verdade.
Quando chegou a estrada que liga Berlim a Dinamarca, Vollman ia pedir carona, um ato muito comum naquele período e um caminhão que transportava animais, parou e perguntou para onde ele ia?
_ para casa, para Neumunster. Respondeu Vollman.
_ entre, é para lá que eu vou. A viagem até lá é bela, mas eu gosto de ter companhia estou indo buscar uma carga de flores e lá nascem as mais belas da região! Disse o chofer daquele veiculo.
Quando faltava pouco mais de 500 metros para a entrada da cidade, Vollman pediu para desembarcar, queria ir andando até a sua cidade natal.
Vollman, após ter agradecido a carona, inicia a sua caminhada em direção a sua amada cidade e a cada passo enchia o pulmão de ar, para como dizia ele, matar a saudade da carne, pois o espírito só se acalmaria quando encontrasse a sua família, o seu lar. Ele estava com saudades da cidade e ele se lembrava muito bem de suas ruas curtas e estreitas, de suas casas em estilo enxaimel e quase todas com flores nas janelas, as crianças tinham uma pequena praça muito bem arborizada, em frente à prefeitura, de onde Dr. Hess, prefeito e médico da cidade, observava a todos da janela de seu gabinete como se fossem seus filhos. A cidade era bucólica e não havia muitos bares ou lugares desse tipo, lembrava-se também de sua casa, uma humilde casa de três cômodos na Rua Dortmund nº 42, do outro lado da cidade em direção ao norte, próximo à estrada que seguia para a Dinamarca e que diziam os moradores da região, que quem abriu aquela estrada foi o próprio César, imperador de Roma. A verdade é que esta é uma das estradas mais antigas da Europa e é uma das mais belas também e os viajantes que passam por ela ficam maravilhados nos dias de primavera quando eles percorrem mais de 60 km de estrada, margeadas por imensos campos de flores.
 Theobald Vollman também queria ver alguém que para ele era muito especial e que dias antes de partir para a guerra, havia feito promessas de amor. Seu nome era Verna Sixel, de família tradicional da Berlim antiga, Karl Sixel havia sido secretário do Ministro da Guerra de Bismarck e fez fortuna com a venda tecidos, produzidos em uma pequena fabrica ao sul de Berlim. Seu filho, Otto, já com pouco mais de 35 anos veio morar em Neumunster com a sua família. Assim a pequena Verna, com seus lindos cachos dourados de seu curto cabelo que emolduravam seu rosto redondo e seus lindos olhos verdes conheceu Theobald Daudt Vollman. Um jovem sem futuro promissor na cidadela em que vivia e que ao deparar com o convite que o governo alemão fazia a todos os jovens do país para virarem “herói” em defesa da pátria, não pensou duas vezes e se alistou na 4ª Cia. de Armeiros.
Para não desagradar a sua única filha, Otto havia permitido a Vollman cortejar a sua filha após saber que o rapaz iria para a guerra e, crendo ele que aquele magricela jamais retornaria vivo do campo de batalha, não deu muita importância ao caso e disse que iria ser uma honra para a família se a filha casa-se com um herói da Alemanha.
Ao chegar em casa, Vollman sofre a primeira decepção de uma serie que seria quase infindável, ao receber a notícia de que sua mãe já não estava mais entre eles, havia morrido de frio durante o inverno de 1917/18, Theobald em prantos se ajoelha nos pés de seu pai que com quase 65 anos e boa parte deles de trabalho duro nos campos de flores, não soube dar ao filho a ajuda e o consolo que ele precisava naquele momento. Vollman, sem saber como fazer e nem o que dizer, sai em disparada indo até a casa de Verna, chegando lá é recebido pelo pai de sua amada que assustado lhe diz que ele havia demorado demais e que Verna, agora casada, havia se mudado para Berlim. Sem raciocinar Vollman sente lhe subir o sangue pela garganta e em um momento seus olhos se fecham e ao abrir ele se lembra do campo de batalha, do ódio que sentia durante os combates e do sangue derramado de seus amigos na trincheira e sem pensar, parte em direção a Otto, desferindo-lhe diversos golpes até vê-lo caído ao chão. Um dos filhos de Otto ainda tenta ajudar o pai, porém é inútil e Vollman sai em disparada novamente, desta vez sem direção.
Correndo a esmo pelas ruas de Neumunster, Vollman acaba sendo preso pelo chefe de policia local, um velho amigo de seu pai com quem tomavam pequenos porres de cerveja feita nos fundos da casa dos Vollman`s. Seu nome era Albert Brunsuik e ele apesar da amizade que nutria pelo pai de Theobald, não poderia deixar de cumprir o que o cargo lhe impunha e assim conduziu o jovem à chefatura de policia.
Após as investigações iniciais e como o jovem ainda estava com a farda do exercito alemão, o mesmo foi enviado ao quartel para que permanecesse preso lá e seria julgado por um tribunal militar, o que para Vollman era o pior que poderia acontecer porque assim não só perderia sua liberdade como também perderia seu posto de cabo e suas medalhas.


Surge uma esperança


Ao desembarcar no quartel, Vollman foi levado direto ao comandante do batalhão e qual foi a sua surpresa ao se deparar com o Coronel Dietrich Dords, um homem de estatura mediana e que havia sido o pivô da menção de honra recebida pelo cabo Vollman em campo de batalha. Theobald havia carregado aquele homem e mais dois por um longo trecho em meio a um combate, os três foram feridos por uma granada e o cabo não os deixou para trás, como que executasse o trabalho de uma formiga carregou um a um por pequenos espaços até que todos estivessem em segurança e isso foi um ato de bravura para todos do exercito alemão.
O coronel o reconheceu imediatamente quando o jovem entrou em seu gabinete e com espanto lhe indagou:
_ o que te deu meu rapaz, um herói alemão matando seus compatriotas?
Vollman, em estado de desespero contou toda a sua história de retorno para casa ao coronel, que o escutava atentamente e ao final disse:
_em quatro anos de guerra, onde vi muitos morrerem, eu não perdi um décimo do que perdi em uma semana, coronel. Perdi minha mãe, perdi a promessa de um amor que sonhei durante todos esses anos e agora perco minha honra porque sei que perderei também o exercito para quem entreguei não só meu corpo, mas também meu espírito.
Ao terminar de ouvir as palavras do soldado Vollman, o coronel não conseguia esconder a dor de ter que prender aquele que o havia salvado e disse:
_de imediato não posso te ajudar, Vollman, tu iras para a cela agora e eu te prometo que irei intervir junto à corte para que te consiga o perdão.
Vollman agradeceu, deu a tradicional pisada de botas no piso de pinho de riga da sala do comandante e foi então, acompanhado por dois soldados, conduzido até a cela do quartel.

O julgamento


Herr Zieg Dietrich havia se alistado no exercito alemão por indicação de seu pai, o conde de Dusseldorff, aos 14 anos de idade e agora com 56 anos, ele ocupava o posto de General de Brigada daquele exercito. Soldado de carreira, ele tinha a disciplina acima de tudo, exceto quando a sua honra estava em julgamento de coragem como ele fazia questão de frisar em suas conversas com os amigos em suas longas conversas ao redor de um charuto e uma boa garrafa de vinho tinto.
O general Dietrich havia sido incumbido pelo estado maior de julgar o jovem Vollman.
Para seu advogado, o exercito escolheu um recém condecorado com a Cruz de Ferro, o jovem e nobre capitão Vermart. O capitão era neto e herdeiro do ultimo Rei da Bavária, um dos mais importantes estados do Reich e o jovem Thiersen Von de Vermart II era um líder nato por natureza e um dos mais novos heróis da Alemanha.
Tudo estaria pronto para a absolvição de Vollman se para a promotoria do caso não tivesse sido escolhido o seu pior inimigo dos tempos de batalha, no norte da França.
Ainda no inicio dos conflitos, Vollman havia sido enviado para o front na Normandia. Lá, sob o comando do Capitão Urich Dier Spieg, Spiogui como o chamavam os soldados, menos a sua frente é claro, Vollman viu o inimigo vir pelo flanco esquerdo e correu para comunicar ao capitão, ele não encontrou o oficial, sendo assim, ele mesmo deu o sinal de retirada e desta forma, um pelotão inteiro se salvou de uma emboscada armada pelo exercito francês. Isto fez com que o recruta fosse condecorado com a medalha de “Honra por mérito em batalha”. O capitão ficou furioso com Vollman pela perda do mérito militar. Isso iria fazer com que esse capitão tivesse um ódio mortal de Theobald.
Começou então o julgamento do soldado Vollman. As testemunhas estavam em seus lugares, o advogado apreensivo, olhava para os jurados com um ar de clemência para o acusado, o promotor era todo sorrisos e a confiança de que sairia vitorioso transbordava em Herr Spiogui e as provas por si só já o condenavam, insistia em dizer a todos o promotor.
O julgamento começou pontualmente às 10h30min do dia 20 de dezembro de 1918, na pequena cidade de Neumunster, no quartel da 4ª Cia. de Armeiros.
Ao entrar na sala de julgamento, o juiz, General Dietrich olha profundamente para o rapaz magro, de cabelos negros lisos e olhos castanhos entristecidos em pé a sua frente, o general então se dá conta de que já tinha visto aquele rapaz antes, muito tempo antes e começa a buscar em sua mente de onde ele conhece aquele rapaz e isso começa a perturbá-lo.
Após a leitura das acusações contra ele, dá inicio ao processo de interrogatório das testemunhas pelo promotor, Herr Spieg.
_eu chamo a primeira testemunha, o jovem Mouritz Sixel.
Mouritz Sixel era filho de Otto Sixel, a vitima, e ele havia tentado, sem obter resultado, salvar o pai quando este estava sendo agredido por Vollman.
Mouritz ao entrar na sala, olha fixamente para o réu e o gosto de vingança é demonstrado por ele em um sorriso sarcástico deste ao passar bem em frente ao réu.
_qual o seu nome e sua filiação, Sr.? Disse o promotor.
_eu sou filho de Otto Van Stumpff Sixel e Anne Elizabet Sixel, meu nome é Mouritz Van Sixel, respondeu.
_pode nos dizer exatamente o que aconteceu na tarde do dia 4 de dezembro de 1918? Indagou Herr Spieg.
_sim, eu me lembro. Eu havia ido a prefeitura falar com o Prefeito Hess e voltei por volta das 15:00H e quando cheguei à porta de nossa casa, eu avistei meu pai sendo agredido pelo Vollman e imediatamente corri para tirar meu pai de suas mãos, mas já era tarde demais, este assassino havia matado o meu pai.
Assassino, assassino, assassino... Começa a gritar Mouritz.               Enquanto isso, um velho conhecido de todos entra na sala e entrega um envelope ao advogado de Vollman, era o Sr. Albert Brunsuik, o chefe de policia de Neumunster.
_ordem, ordem... Grita o juiz que acaba de se lembrar de onde conhecia o réu e agora já estava determinado terminar o mais breve possível com aquele julgamento.
O advogado de Vollman se levanta como que pronto para ir a um baile, e diz que tem provas para apontar o verdadeiro assassino e inocentar de uma vez por todas o soldado Vollman.
_ Senhor Juiz, senhores jurados, o que estamos julgando aqui é uma enorme farsa e o que tenho aqui dentro deste envelope que acaba de chegar as minhas mãos, este envelope me foi entregue pelo chefe de policia de Neumunster e aqui há uma carta do médico de Berlim, que analisou o corpo do Sr. Otto. Nesta carta o medico conclui que não pode ter sido o Sr. Vollman quem matou o Sr. Otto. O corpo do falecido apresenta marcas de unhas em seu pescoço e ao conferir estas marcas, o medico conclui que o assassino tem apenas quatro dedos na mão direita e se não bastasse, todos conhecem o jovem Vollman nesta cidade e sabe que desde criança ele tem o habito de roer suas unhas; agora como o Sr. dizia Herr Mouritz, pode nos mostrar a sua mão direita, por favor?
Mouritz enraivecido começa a esbravejar e com medo de que sua farsa fosse descoberta tenta fugir da sala de julgamento, o que é impedido rapidamente pelos guardas de serviço no local.
_Sr. juiz, acredito que este ato do Sr. Mouritz mostra quem é o verdadeiro culpado pelo assassinato do Sr. Otto? Pergunta o advogado.
E assim Vollman é absolvido pelo tribunal militar e reincorporado ao serviço ativo do exercito alemão.
Depois de uns dias, a policia descobriu que o Sr. Mouritz havia se endividado muito com jogo em Berlim e o pai negou-lhe ajuda e assim a única forma que ele encontrou de poder quitar suas dividas, era receber a herança paterna antes do tempo.

A ida para Nuremberg, um novo amor.


A 4ª Cia. de Armeiros foi transferida para a cidade de Nuremberg, no ano de 1921 e o agora cabo Vollman, com 22 anos de idade, desembarca em uma cidade que ele só ouvia falar, mas nunca nem havia passado perto desta que seria um ícone em sua vida por toda a eternidade.
Ainda na estação de trens de Nuremberg, Vollman olha maravilhado para a majestosa estação, observa com atenção o vai e vem de pessoas e os carrinhos carregando as malas pelos seus enormes salões, o apito dos trens que chegavam e partiam de uma das maiores estações ferroviárias da Alemanha.
Caminhando maravilhado com tudo que via e embriagado pela beleza arquitetônica da estação, Vollman se choca com uma jovem que também estava chegando à cidade naquele momento e confuso, ele a olha de um jeito que desde que conheceu Verna Sixel, ele nunca mais tinha olhado nenhuma outra mulher. Seu coração disparou e uma gagueira invadiu a sua voz, fazendo-o ruborizar enquanto admirava a beleza da jovem ali como a uma estátua a sua frente.
A jovem tímida e confusa pede desculpas aquele homem esbelto, com lindos olhos castanhos, fardado com seu traje de passeio verde anis a sua frente e ao mesmo tempo sente aquela tradicional falta de ar que os seres quando se apaixonam sentem, ao ver quem se ama.
Após se apresentar, Vollman lhe pergunta seu nome e aquele belo par de olhos azuis a sua frente finalmente recebe um nome que irá fazer parte dos sonhos de Theobald para sempre, Vollman finalmente havia encontrado a sua metade que vagava solta pelo mundo, conforme havia lhe dito uma aldeã francesa, quando Vollman ainda combatia na guerra de 1914: Tina, ou melhor, Albertina Mallmann.
Tina era uma jovem e bela moça de 17 anos que havia perdido o pai e mãe em um surto de febre que abateu a cidade de Praga onde vivia desde 1910, data em que seu pai foi trabalhar em uma fabrica de cerveja naquela cidade onde iria ter um salário melhor e então por esse motivo não hesitou em mudar-se de sua cidade natal, a cidade de Dantzig. Tina era de origem judaica e isso um dia iria ser um tormento em sua vida.
O cabo e a jovem Tina, naquele dia se perderam em meio a olhares e trocas de promessas. Era o inicio de um amor que iria marcar a vida dos dois para todo o sempre.

Em nome do amor, o casamento de um alemão e uma judia.


Corria o ano de 1923, o cabo Vollman estava sendo promovido ao posto de 3º sargento classe A, a Alemanha estava enfiada em dividas e o soldo dos soldados alemães não era tão bom assim, Vollmann e sua amada tinham diversos problemas financeiros e isto atrasava muito a marcação da data do casamento que eles tanto desejavam.
Após cinco anos aguardando que a situação melhorasse, para que eles pudessem unir-se em matrimonio, eles chegam à conclusão de que não é mais possível esperar e decidem se casar.
Conversam então com um padre católico da igreja de São Vicente, igreja em que ia, todos os domingos, o nosso querido Vollman e sua amada, apesar dela não ser católica. A resposta do padre foi muito bem compreendida pelo casal e eles saíram da sacristia aos prantos como era de se esperar, após terem recebido um não aos seus sonhos de casamento.
Sentados em uma praça do centro de Nuremberg, Tina diz a Vollman que se eles se amam de verdade, não importa a religião em que se casem desde que recebam o consentimento e a benção de Deus. Vollman então lhe pergunta se ela aceitaria casar-se com ele na igreja luterana, o que ela aceitou muito rapidamente e os dois partiram em direção a igreja evangélica de conciliação luterana no bairro de Spcielatz.
Eles entraram na sacristia procurando pelo pastor Uolf Danz, ele havia sido capelão da 4ª cia. e era amigo de Vollman.
Uolf os recebeu com muita cordialidade e após contarem todos os percalços da história dos dois, o pastor aceitou celebrar o casamento com muita alegria.
O casal recebeu a benção da igreja no dia 26 de maio 1928 as 18 h e Sr. e Srª. Vollman partiram para Berlim por uma semana, Tina não conhecia a capital da Alemanha e fica deslumbrada ao chegar e ver o Reichtag.
Ainda em Berlim, Vollman recebe uma notificação de que era para ele se apresentar ao final de sua licença, ao quartel do Reichtag, onde o comandante da guarda era seu velho amigo, o agora Major Dietrich Dords.
Ao fim de sua licença e cumprindo as ordens enviadas a ele, o sargento Vollman se apresenta ao corpo de guardas do Reichtag. Ao encontrar seu velho amigo e benfeitor, Theobald se emociona e pede permissão para dar ao amigo um abraço. Os dois se abraçam e Vollman é comunicado que ele agora será o novo “Estafeta de 1ª Classe do Reich”, ele se espanta porque sabe que esse posto era cobiçado por todos os soldados do exercito alemão e neste posto ele teria a chance de estar lado a lado com o próprio Fuher, com o Sr. Adolf Hitler em pessoa.

A serviço do Reich


Vollman assumiu seu posto no centro político de Berlim no dia 1º de junho de 1928 e já se destacou ao demonstrar conhecer todos os andares do prédio mesmo sem nunca ter entrado nele antes, apenas seus estudos das plantas da edificação foram capazes de guiar o sargento por todas as salas sem precisar de tempo para conhecê-las.
Tina e seu amado viviam em uma pequena pensão no subúrbio de Berlim e isso foi muito comentado dentro do Reich, ter um soldado de tão alto grau de confiança vivendo em tão precária situação não fazia bem ao exercito visto pelos olhos do povo e isso incomodava.
Ao assumir a chancelaria alemã, Adolf Hitler em seu primeiro discurso para os soldados deixou bem claro que para ele, todo soldado tinha o direito a ter uma vida digna de um defensor da ordem e da soberania alemã e Vollman se lembrava do discurso do Fuher ainda na cidade de Nuremberg quando Hitler disse: “Se o exercito alemão não for o melhor do mundo, será porque não há mais exércitos no mundo. Se vocês não tiverem condições, será porque a Alemanha não tem condições”.
 Certo dia, ao retornar para casa após o expediente, Vollman encontrou Tina chorando na calçada em frente à pensão e imediatamente a perguntou o que aconteceu e ela respondeu:
_a dona da pensão estava devendo ao Deutch Bank e o gerente, o Sr. David Kierzenbaun não quis dar a ela o prazo que ela precisava para quitar as suas dividas e por isso todos nos fomos despejados. Respondeu Tina aos prantos.
Vollman sem saber o que fazer fica ao lado dela por alguns minutos e então se levanta indo a direção ao prédio de dona Isolda Gotlieb, a velha amiga de sua mãe que residia em Berlim a mais de quarenta anos e que os havia indicado aquela pensão.
Ao chegar à casa de dona Isolda, Vollman lhe conta o que aconteceu e lhe pergunta se há algum lugar em que ele e sua esposa possam passar a noite.
_meu filho, responde Isolda. Eu não tenho lugar em minha casa mais há um espaço por debaixo da escada do prédio e nele morou durante os anos de guerra o nosso ex-zelador, o Sr. Walfred Djorn.
_posso ver este lugar dona Isolda? Perguntou Vollman
E assim após observar o lugar e ver que ele não era nenhum palacete, voltou ate onde estava a sua amada e sem conseguir olha-la em seus olhos, pois ele chorava por não poder oferecer a ela o necessário para ter uma vida digna, ele diz:
_querida Tina, o que tenho para lhe oferecer é com certeza muito menos do que tivemos até hoje, se é que posso dizer que tivemos alguma coisa, mas pelo menos é seguro e podemos passar esta noite, amanha tentarei melhorar isto tudo. E ao terminar de dizer isso, ainda sem olhar a sua amada nos olhos, Vollman a conduz até a Rua Shundersting ao prédio de dona Isolda.
Ao chegarem, Tina olhou para o lugar que seu marido a havia levado e triste olhou e disse:
_eu amo você e o que menos me importa é o lugar onde estarei em teus braços, mas tenho medo, não por mim, mas por nosso filho que está por nascer e eu não sei como será, tentei evitar esta gravidez devido a nossa situação, mas não consegui, me perdoe meu amor.
Após ouvir estas palavras ditas por Tina, Vollman já em soluços a abraça e finalmente consegue olhar a sua amada nos olhos e diz que enfim Deus havia olhado para ele e que em meio a toda essa desgraça em que estava a sua vida, Deus lhe enviou a melhor noticia de sua vida, ele seria pai.
Confuso e ainda sem saber o que fazer, Vollman foi para o seu posto que agora era no terceiro andar, um apenas, abaixo do Fuher, a quem ele via diversas vezes durante o dia e às vezes à noite quando o expediente seguia por longas horas em reuniões quase que intermináveis.
Hitler e Goering estavam reunidos durante o café da manha e neste dia esperam ansiosos pela chegada do General Zieg Dietrich com quem iriam discutir assuntos militares.
Como um bom militar e amante da caserna, o general chegou um poço mais cedo para ver alguns colegas seus que estavam de serviço em Berlim e a muito ele não os via. Ao adentrar a sala do comando o general se depara com Vollman e se lembra do rapaz. O general tinha tendências homossexuais e havia feito um convite ao ainda recruta Vollman que muito educadamente recusou e guardou durante anos este segredo.
_Vollman, sargento Vollmann da 4ª cia. de Armeiros? Perguntou o general.
_sim Herr General. Respondeu Vollman
_a muito queria lhe ver, como andam as coisas, creio que sua vida em Berlim deve estar boa não?
_não, não estão nada bem, eu me casei general, tenho uma linda mulher, vou ser pai dentro de alguns meses, moro embaixo de uma escada e o que ganho só dá para sustentar a minha esposa porque eu trabalho o dia inteiro e não faço as refeições em casa. Quando o Fuher vai nos dar uma vida melhor General?
Ouvindo isso o general saiu da sala e por um momento Vollman achou que seria preso por desacato ao Fuher, Hitler não perdoava quem dissesse alguma coisa contra ele.
Passada algumas horas, chega uma ordem ao comando para que o sargento Vollman se apresentasse imediatamente ao gabinete do Fuher. Ao ouvir esta ordem Vollman tremeu e seu coração disparou a uma velocidade sufocante, temia por sua vida, o que seria de sua esposa e de seu filho que nem chegou a nascer ainda? Pensou por um minuto em fugir, mas para onde ele iria? Lembrou-se de seu pai e de tudo que ele viu e viveu ate aquele dia e se dirigiu para o gabinete do Fuher.
Em seu gabinete, Adolf Hitler, acompanhado de diversos integrantes do estado maior do exercito alemão além de Goering, Zieg Dietrich, Goebbels e um casal de doberman’s, esses últimos simbolizava que o Fuher estava feliz e isto era um bom sinal.
Ao se apresentar ao Fuher, Vollman mesmo vendo o casal de cães e ele também sabia assim como toda a Alemanha que era um sinal de que Hitler estava contente, ele não perdeu o medo e quando Adolf se aproximou dele, ele tremia e Hitler disse:
_caro Vollman, tu es um exemplo de lealdade à pátria, e eu não seria digno de ser Fuher se não lhe prestasse esta homenagem pessoalmente, por isso após ouvir a sua história contada pelo nosso exímio General Zieg Dietrich, lhe comunico que o governo está a partir de agora empenhado em resolver não só o seu, mas os problemas de vários outros que devem estar em situações como a sua. Hoje pela manha criamos um fundo para a construção de casas para nossos soldados e você será o primeiro agraciado e junto quero lhe comunicar que está sendo elevado ao posto de minha ordenança. Recebera a divisa de 1º sargento e trabalhará como elo entre eu e o General Zieg Dietrich, que de hoje em diante estará trabalhando em um projeto de recuperação do exercito alemão e contamos com você, com a sua lealdade e disciplina.
Vollman foi de um extremo de tristeza e medo a um sentimento de alegria, de felicidade, de contentamento que pela primeira vez em sua carreira esqueceu de dar com as botas no piso e saiu imediatamente após se despedir do Fuher para ir para casa contar a sua linda Tina o que havia acontecido. Uma semana depois, ele e sua esposa estavam mudando para um belo apartamento ao sul de Berlim.
E assim as coisas começaram a melhorar para Vollman e sua amada Tina.

Anos 30, o milagre.


O plano de reestruturação da economia feito pelo Fuher foi um milagre econômico, depois de anos sem crescimento, a indústria voltou a produzir, o comercio teve um crescimento de mais de 15% em apenas um ano e a vida voltou a existir na Alemanha. Os tempos estavam mudando e o povo queria estas mudanças.
A Alemanha se preparava para as olimpíadas de 1936, as ruas de Berlim estavam lindas e belas como nunca estiveram antes, o povo sorria ao passarem pelas ruas e verem as marcas do progresso introduzido pelo nacional-socialismo de Adolf Hitler.
Vollman agora seria pai pela segunda vez, Tina que havia dado a luz a um menino em 1929, mas a criança não resistiu e veio a falecer alguns meses depois. Isto fez com que Tina e Vollman sofressem muito e eles ficaram alguns anos sem terem filhos até que em meio aquela felicidade que contagiava a nação alemã, Tina engravidou e estava contente com isso.
Eles decidiram mudar para uma casa e assim oferecer mais espaço a família que agora estava crescendo e compraram uma casa ao sul de Berlim, em uma vila chamada apenas de Ilê.
O menino nasceu forte e saudável, Vollman seguindo a tradição da família deu ao bebê, o nome de seu avo paterno, Alfred Daudt Vollman. A casa se iluminou com a alegria contagiante deste nascimento.
As coisas corriam as mil maravilhas, as olimpíadas deram prestigio a Alemanha e o mundo se chocava com o crescimento econômico da nação germânica.
Vollman comprou o seu primeiro carro em 1937 e no verão deste mesmo ano, eles viajaram para o norte da Itália, com Theobald orgulhoso em dirigir seu Dalmer-Benz 35.
Theobald Vollman nunca havia saído da Alemanha para passear e isto para ele era o maximo, conhecer novos lugares sem uma arma em suas mãos era para ele prazeroso a ponto de ter dirigido de Turim a Nápoles com um sorriso em seus lábios que Tina chegou a acreditar que o marido estava doente, que ele havia ficado louco.
Após 20 dias de férias pelo país da bota, eles retornam para casa.

O primeiro sinal


Ao cruzar a fronteira de volta, Tina desembarca para ir ao toalete no posto de fronteira e vê um soldado alemão humilhando uma família que tentava sair da Alemanha. Chocada ela chama o marido e pede a ele que interceda junto ao oficial para que os soldados não maltratassem aquela família como estavam fazendo.
Vollman se dirige ao oficial no comando e após se identificar a ele, o oficial relata que aquela família era uma família de judeus que estavam tentando deixar a Alemanha e que de acordo com a lei em vigor eles poderiam sair, mas não poderiam levar a pequena fortuna que estavam levando em suas malas como jóias, ouro e até dinheiro em moeda corrente alemã.
Theobald retorna para o veiculo e diz a sua amada que está tudo bem e que eles irão libertar a família assim que terminarem de conferir as suas documentações. Ela acredita e não fala mais no assunto, Vollman por um minuto se entristece ao lembrar que a mulher que ela ama com toda a força do mundo e que até daria a própria vida por ela, é também uma judia e a Alemanha estava dando inicio ao processo de extermínio da raça judia em seu território.
Todo esse ódio que o povo alemão nutria pelos judeus, se baseava no fato de que após a guerra de 1914, toda a riqueza da Alemanha estava em mãos judias e o povo alemão passava fome, eram postos para fora de suas casas quando não tinha como quitar alguma divida e até mesmo o maior banco alemão pertencia a judeus. Esta situação foi usada contra o povo judeu imediatamente após a ascensão de Adolf Hitler, que com planos de crescimento da economia e desenvolvimento social, deu ao povo alemão aquilo que ele mais queria de verdade, uma vida decente.
Hitler por ter dado ao povo tudo isso, obtinha apoio da opinião publica para todas as suas ambições internas e externas e finalmente chega o principio do fim quando em 1939, ele invade a Polônia.

Um pedido do próprio Fuher


Em março de 1939, Hitler entra em seu gabinete e seu ajudante de ordens, o soldado Vollman lhe repassa os papeis enviados pelo General Zieg Dietrich. Após uma breve olhada nos documentos Hitler vira-se para Vollman e lhe pergunta:
_a quantos anos esta no exercito, Vollman?
_Desde 1914, Herr Fuher. Respondeu Theobald, que apos anos trabalhando com o Fuher, já havia aprendido a como lidar com ele e não o temia mais e chegava mesmo a gostar dele.
_acha que os nossos soldados estão prontos para a grande guerra que esta começando?
_sim, meu Fuher, o exercito nunca esteve tão bem preparado e se me permite uma colocação, eu acho até que anseiam pelo retorno aos combates, pois eu ouvi a alguns dias quando estive em Dusseldorf para levar os documentos do plano de desenvolvimento militar, eu tive a oportunidade de estar entre os soldados de alguns quartéis e eles perguntavam quando vamos tomar de volta o que perdemos em Versalhes, Herr Fuher.
_a Alemanha perdeu muito em Versalhes, muito mais do que você pensa Herr Vollman, não foi só a economia que se abalou. O nosso orgulho, o orgulho de um povo que existe para ser líder e não ser liderado. Obrigado caro Vollmann e Ah, por favor, não quero que estas palavras saiam de dentro desta sala.
_sim Herr Fuher.
E assim Vollman pressentiu que seria impossível não acontecer uma guerra e o seu conhecimento do potencial bélico alemão lhe fazia acreditar que a Alemanha não tinha um inimigo sequer que lhe pudesse impor barreiras e que a vitória era certa. A Alemanha iria desafiar o mundo outra vez.
Naquele dia, ao terminar o expediente Vollman sentiu uma dor no coração e logo sentiu o gosto amargo da perda outra vez em sua garganta. Hitler havia iniciado o processo de purificação na Alemanha a alguns anos, mas o que estava para acontecer agora era perigoso demais para a sua amada Tina.
Sem conseguir pensar em outra coisa, Vollman neste dia, ao chegar em casa, não faz o que a anos fazia, como beijar sua esposa e ir brincar com seu filho de apenas três anos. Tina percebeu que algo estava errado e resolveu dar uma notícia que para ela, seria um motivo de alegria para Vollman. Ela estava esperando outro bebê.
_meu amor. Disse Tina querendo dar inicio a uma conversa com seu marido.
_que foi Albertina.
Tina nunca havia sido chamada assim por Vollman e ela sabia que isso só poderia significar algo muito grave.
_eu tenho algo para lhe dizer, mas acho melhor esperar um pouco, você deve estar com problemas demais e o que eu tenho pode esperar.
_não, Tina me diz, não há nada mais importante para mim do que você meu amor e se estou apreensivo é porque não tenho ainda a solução, mas me diz...
E então Tina olhou-o no fundo de seus olhos e disse que ele seria pai de mais um bebê.
O que era para ser um motivo de alegria caiu como uma bomba nos ouvidos de Vollman que começou a chorar desesperadamente sem saber como dizer a mulher que ele ama que o futuro dela e de seus filhos é perigosos e que agora, com mais um filho, as coisas iriam piorar ainda mais.
Tina sem entender o que se passava na cabeça de seu marido ficou por alguns segundos sem ação e então se lembrou do jantar e foi para a cozinha ainda meio confusa.

1º de setembro de 1939


 A guerra foi declarada quando a Alemanha invadiu a Polônia e em 3 de setembro, o mundo, tendo a frente à Inglaterra e a França, declaram guerra a Alemanha.
Corria o mês de dezembro e a Alemanha, apesar da guerra que estava se iniciando, estava em festa pelo natal e família dos Vollman em festa devido ao nascimento do seu mais novo membro, Doriz Daudt Vollman.
Theobald apesar de estar controlando melhor os seus pensamentos, ainda não havia esquecido o fato de que a Alemanha estava matando os judeus e ele se lembrava com muita dor as origens de sua esposa.
Em 1940, as coisas começam a esquentar, o estado maior da Alemanha esta em festa pelas vitórias alcançadas ainda no inicio e prevêem um futuro promissor dos desejos da nação germânica.
Vollman agora despacha em uma mesa ao lado de seu maior comandante, o Sr. Adolf Hitler.
Ele ouve todas as conversas e muitas delas o entristecem, mas ele, devido ao seu posto e a confiança depositada nele, ele oculta a sua dor de todos.
Certo dia, no verão de 1940, ele se encontra com Goebels e este lhe diz que “a vitória é tão certa e que dentro de pouco tempo a raça judia será exterminada do mundo e então o mundo se ajoelhará aos desejos de uma Alemanha forte e esta Alemanha, ela já existe, ela foi criada das cinzas, como Fênix, pelo nosso Fuher”. No dia seguinte, dia 14 de junho as tropas alemãs entram em Paris, a “cidade luz” e a nação francesa perdiam a guerra. No dia 17, o marechal Petain pedia o armistício a Alemanha, era o inicio da “República de Vichi”.                         
O exercito alemão coletava vitórias em cada batalha e isso dava ao povo uma euforia sem precedentes em sua história.
Vollman sabia o que isso significava e via o Fuher ficar ainda mais forte no coração de um povo que estava vendo a sua nação ser finalmente vingada da humilhante derrota sofrida não no campo de batalha, mas sim na mesa de negociação de Versalhes.
Theobald agora não podia mais esconder seus temores de Tina e então decide contar tudo a ela. Consegue então uma licença para ir a sua cidade natal por três dias para ver seu pai, que muito doente já não levantava mais da cama. Ao chegar a Neumunster, Vollman que desde 1919 não retornava ali, se lembrou de tudo que aconteceu em sua ultima estadia e virou-se para sua esposa e a convidou para após verem seu pai, os dois irem até as margens do Riacho que cortava a pequena cidade.
_pai, como vai o Sr. meu pai. Perguntou Vollman a um velho que mal podia mover os olhos e deitado em uma cama a mais de um ano, se emocionou ao ver o seu filho outra vez.
Cumprido o combinado e após alojarem-se, o casal foi dar uma volta e em um campo florido onde Tina se sentiu como que estivesse no céu, Vollman a agarrou pela cintura e após um longo beijo a sentou em seu colo e começou a lhe falar:
_minha Tina, ainda consigo me lembrar com exatidão de todos os momentos desde o dia em que te encontrei pela primeira vez na estação de Nuremberg e de todas as alegrias que tive ao seu lado, de nossos filhos, de nossa casa, dos maus momentos e acredito que eles serviram para fortalecer o que sinto por você e é por isso que não posso mais lhe esconder, quero que saiba que eu não penso assim por que tudo o que mais quero é poder te amar e viver ao seu lado por todo o sempre porem, não é assim que a Alemanha vê as coisas, a Alemanha esta mergulhada em uma caça as bruxas e escolheram os judeus como alvo principal. O Fuher deu ordem para o extermínio de toda a raça judia e muitos estão sendo enviados a campos de concentração. Tu esta segura enquanto só eu souber de seu passado e agora usando apenas meu sobrenome, nenhum membro da “Gestapo” ou da “SS” irá se atrever a te tocar, mas eu preciso que saiba o perigo que corre e assim evite comentar sobre o seu passado com suas amigas.
Ao ouvir as palavras do marido, Tina experimentou uma sensação de dor e de prazer, ao ver que Vollman, sabia do perigo que os judeus estavam correndo, mas se preocupava com ela e o que poderia lhe acontecer, demonstrando assim que ainda a amava e Tina, não estava alheia aos acontecimentos na Alemanha, ela ouvia o radio e contrariando o pedido do Fuher de que a nação alemã não deveria ouvir estações de radio estrangeiras porque elas contaminam a nação com mentiras e falsas informações para desestabilizar a nossa economia e corromper a nossa sociedade. Tina ouvia a B. B. C de Londres todos os dias.
Os dois se abraçaram e voltaram a caminhar pelos campos de flores como se não houvesse nada ao redor.

Berlim ferve


De volta a Berlim, a família Vollman se depara com uma cidade repleta de propagandas anti-semitas e Tina, para que o marido não sofresse com o que via diz ao marido em tom de brincadeira que a Alemanha devia estar com muito medo dos judeus e por isso eles estavam gastando tanto dinheiro com propaganda. Theobald finge não dar atenção e seguem para o seu pequeno refugio do mundo, a sua linda casa na vila Ilê.
Ao entrar em seu gabinete naquela manha de novembro, Hitler encontra Vollman metido em seus afazeres e comenta em alto e bom som aos seus acompanhantes:
_sabem por que vamos ganhar esta guerra, senhores? Porque nossos soldados são como este aqui, eu os apresento a um exemplo de soldado, um herói da guerra de 1914, que levanta cedo e não tem hora para parar de trabalhar.
Vollman sentiu nojo de Adolf Hitler pela primeira vez e Theobald Vollman não sabia, mas, esse sentimento iria crescer e acompanha-lo pelo resto de sua vida.
Nas ruas de Berlim podiam se sentir os sentimentos de adoração ao Fuher, fervilhando nos corações de um povo que via na figura de Adolf Hitler, um salvador, um homem que tinha vindo ao mundo com o propósito de restaurar a soberania alemã e estava conseguindo levar a cabo o seu projeto.
As lojas vendiam um numero infindável de produtos e o povo, feliz por agora poder comprar o que quisessem, elogiavam a política alemã e sobre a guerra, eles teciam os mais diversos comentários, havia uns que elogiavam e outros que. Temerários de uma nova Versalhes, achavam que a Alemanha iria apenas pegar o que era seu e depois iriam parar com a guerra, mas, ninguém, nenhum cidadão alemão era plenamente contra a guerra.
As cores e símbolos nacionais estavam presentes em todos os lares, lojas ou qualquer estabelecimento público ou particular que tivesse as vistas do povo.
Mas o grande trunfo da Alemanha eram as suas forças armadas. O exercito havia desenvolvido armas de disparos mais rápidos e de calibres maiores, uma blindagem mais forte dava maior força aos tanques e suas divisões “Panzers” sob o comando do “Marechal Rommel”, este mais tarde seria apelidado de “Raposa do deserto” e seus feitos seriam lembrados por todos os militares ao redor do mundo, os ingleses que o digam. Um novo tipo de solda deu aos navios alemães uma leveza que fez com que a sua velocidade quase duplicasse e isso sem falar na maior potencia aérea já vista até então, a “Luftwaffe”. Todo esse poderio dava ao povo uma certeza que a cada dia crescia mais de que a Alemanha seria enfim a grande vitoriosa que o povo tanto esperava desde 1919.
Vollman a cada dia se interava dos acontecimentos políticos e militares, as manobras de Adolf Hitler para manobrar a opinião pública a seu favor por meio de seu ministro da propaganda que muitos chamavam de “o mentiroso que fala a verdade”, um trocadilho alusivo à frase dita por “Goebels” “uma mentira repetida várias vezes vira uma verdade”.
Em meio a tudo isso, Vollman ainda encontrava tempo para sonhar com sua amada as margens de uma bela praia como estiveram no norte da Itália ou caminharem pelos campos de flores de Neumunster outra vez.

O perigo se aproxima


As vitórias das tropas alemãs tinham um preço e era alto. As fabricas de armamentos da Alemanha funcionavam a todo o vapor, empresas como a Krupp, uma das maiores indústria bélica da Europa.
Hitler autoriza, devido à falta de mão de obra alemã, que os judeus que estavam sob a proteção do Reich como dizia o fuher, trabalhassem em fabricas de menor importância para a guerra e assim o povo alemão tivesse mais tempo para dedicar-se às necessidades do momento crucial em que a nação passava.
A implantação da mão de obra judia na fabricação de peças como dobradiças, panelas, fogões, e outros. Foi um sucesso tão grande que surge pela Alemanha e pelos territórios ocupados, um numero cada vez maior de campos de concentração.
Esses campos precisavam de uma administração central e Hitler vê na pessoa do general Zieg Dietrich, já fora de uma idade compatível com o campo de batalha, um excelente e fiel alemão para administrar a maquina de mão de obra barata, ou melhor, de graça para as necessidades internas da Alemanha.
Hitler convoca o General Zieg Dietrich em seu gabinete ao entrar em sua sala, Hitler se levanta e diz ao general:
_Herr Dietrich. Eu estou a meses com um problema maior que a própria guerra e hoje pela manha, eu encontrei a solução. É grande o numero de judeus que estão trabalhando para que a nossa nação cresça e estes enormes contingentes de imundos precisam de disciplina, por isso os alojei-os em um centro de convivência para que possamos controlá-los, mas estes campos estão aumentando em numero e tamanho, a ponto de precisarmos criar uma central administrativa aqui em Berlim. E para o cargo de administrador não há ninguém na Alemanha que possa desenvolver esta tarefa melhor que o Sr. herr general.
O general Zieg Dietrich sabia que isto não era um convite, muito menos uma folga, mas sim, uma forma de tirá-lo do posto de desenvolvimento das forças armadas e coloca-lo em um lugar menos importante. O general estava errado quanto ao pensamento de Hitler, o fuher confiava na capacidade do general e sabia que para ocupar esse cargo ele precisava de um homem sério e patriota.
Zieg aceitou o novo cargo e pediu apenas para que pudesse fazer a estruturação desta administração a seu critério, Hitler olhou o general nos olhos e disse:
_ Herr general. Desde que estes judeus não saiam de dentro dos campos, tens meu total apoio.
Assim, o general Zieg Dietrich dá inicio sua nova missão a serviço do reich, como ele começou a falar para si mesmo e chama Vollman para assumir a secretária geral do projeto.
Tiveram que alicerçar toda a nova secretaria, desde a sala onde iriam trabalhar até as bases menores, tiveram até mesmo que descobrir onde estavam todos os campos de concentração.
Após se instalarem, Vollman diz ao general que era preciso fazer primeiro um levantamento dos campos e quem os está comandando, para depois começarem a trabalhar com mais eficiência. O general Zieg Dietrich pede a Vollman que proceda com seu projeto e o sargento Theobald Vollman começa a fazer uma busca dos campos de concentração existentes em toda a Alemanha e territórios ocupados, depois de longos quatro meses de trabalho, Vollman entrega a lista ao general.
Durante o tempo em que estava fazendo a lista, Vollman viu seu passado voltar a tona. Coronel Urich Dier Spieg, era comandante do campo de Varsóvia e ele lembrava bem de “Spiogui”, sabia que ele era seu pior inimigo e que não poderia jamais chegar muito perto, temia por sua amada Tina. O ex-capitão estava agora ainda mais poderoso, havia subido de posto e em uma pequena investigação, Vollman descobriu que Urich havia se filiado ao partido nazista.
Pela primeira vez Vollman sentiu vontade de pegar a sua família e ir embora da Alemanha, mas ele era um soldado alemão, fiel ao seu país, para onde ele iria? Que nação permitiria que ele e sua família vivessem em paz? Sua cabeça estava às voltas e ele sai para caminhar pelas ruas de Berlim.
Ao dobrar a esquina da Rua Dresdem com Stieplatz, Vollman viu um grupo de jovens da “juventude hitlerista” espancando uma mulher de uns vinte anos. Vollman ficou parado diante da cena como que petrificado, ele olhava a mulher sendo espancada e via nela o rosto de Tina e um sentimento de defesa surgiu em seu coração e ele correu em direção ao grupo e já faltando apenas alguns passos do grupo e ia repreendê-los pelo seu ato de selvageria, um carro da SS parou em frente a ele e de dentro do veículo alguém gritou:
Herr Vollman. Entre, o fuher está a sua procura.
Após entrar no carro da SS, o sentimento que Vollman havia sentido sumiu e um pânico tomou conta de seus pensamentos. O que a SS queria com ele? O fuher nunca mandou busca-lo assim e a SS era temida até mesmo pelos oficiais mais altos da Alemanha.
Seus medos foram em vão, Adolf Hitler queria mesmo falar com ele, foi o que percebeu quando chegou ao quartel general do exercito alemão e foram diretamente a sala do subcomandante geral do exercito, Herr Ginter.
Vollman não sabia, mas o fuher tinha por ele, uma grande admiração, o que era incomum, Hitler era conhecido por sua praticidade e desprendimento ao ser humano como tantos oficiais que viviam ao seu lado diziam naquela época. Hitler homenageava o ato e não quem fez o ato.
Hitler naquele dia estava possesso e quando viu Vollman, ele abriu um sorriso que todos na sala se espantaram com a atitude do fuher.
_Herr Vollman. Finalmente o encontramos. Preciso de seus serviços e só um soldado capaz de fazer o que tu fizeste na Normandia em 1917 e capaz de fazer. Disse Adolf Hitler olhando Vollman com ares de que ele precisava de ajuda.
Vollman em sua condição de militar de carreira sentiu em seu espírito um sentimento de dever para com a sua pátria e disse ao fuher:
_Herr Fuher. Estou pronto para servir a Alemanha e aos interesses dela. Apenas aguardo seu comando Herr Fuher.
Hitler não esperava outra resposta deste soldado, ele conhecia a vida de Vollman melhor do que qualquer oficial naquela sala e uma coisa Hitler tinha, ele sabia da capacidade de seus comandados. Virou-se para o soldado parado a sua frente como se fosse um de seus melhores amigos e disse:
_Há um campo de concentração em Varsóvia, nele estão diversos judeus que trabalham na fabricação de utensílios domésticos e há três destes judeus que preciso tirar de lá porem, Herr Vollman, o que vou lhe falar é estritamente confidencial e não poderá em momento algum haver falhas durante esta operação. Eu preciso que você entre no campo e seqüestre estes três imundos e os leve em segurança e sigilo para a cidade de Dusseldorf. Deve estar pensando porque não tira-los de lá simplesmente e eu compreendo a sua curiosidade. A inteligência descobriu que as forças inimigas do Reich estão pensando em resgatá-los. Eles são cientistas e podem nos ser muito útil em outras áreas, mas nós precisamos que o inimigo acredite que eles fugiram ou que um dos aliados inimigos tomou a frente e conseguiu tira-los de lá, compreendeu? E por isso nem mesmo o comandante do campo saberá desta operação, terás que agir secretamente.
A voz de Adolf Hitler ainda ecoava pelos seus ouvidos quando ele lembrou-se que o comandante do campo era seu inimigo pessoal e um calafrio percorreu todo o seu corpo e a única palavra que conseguiu pronunciar foi:
_Sim meu Fuher.
Vollman interou-se dos planos com mais atenção, instruído por membros do alto comando, mas o nome de Urich Dier Spieg soava repetidas vezes em sua mente. O que lhe aconteceria se ele fosse pego. Lembrou-se de que se fosse apanhado, Hitler não iria dizer que estava a seu comando e ele seria julgado como traidor do Reich, seria punido com a morte e isto na melhor das hipóteses. Havia um “Spiogui” que se o apanhasse não esperasse para que um tribunal o julgasse e ele mesmo talvez agisse como carrasco. Vollman pensou em Tina e em seus filhos.
Após passar e repassar o plano de resgate dos judeus diversas vezes em busca de uma possível falha, Vollman se dá por contente ao descobrir que o campo de Varsóvia era mais vulnerável do que imaginavam os dois lados da guerra e seguiu para casa quando as ruas já estavam às escuras pelo Black-out imposto pela “Royal Air Force” conhecida apenas como RAF que desde o inicio do ano vinha bombardeando as cidades vizinhas e Berlim, para se proteger impôs o black-out.
A missão seria desencadeada no dia de natal do ano de 1943, tudo estava tenso no Reich, Hitler começava a sofrer perdas que, ainda que pequenas, ele não gostava de perder e isso o estava deixando a cada dia mais nervoso. A dois dias da missão, Vollman pede para falar com o fuher. Ao entrar no gabinete de Hitler, Vollman percebe que o líder da nação está pior do que imaginava e sente que não pode lhe dizer que está com medo de executar esta missão. Vollman havia ido ao gabinete do fuher para lhe contar quem era o comandante do campo de Varsóvia e lhe pedir para que outro efetuasse a missão, mas ao vê-lo desistiu e disse:
_Herr fuher. Eu pedi esta audiência apenas para lhe dar pessoalmente a segurança de que teremos êxito e que peço permissão para ir imediatamente para a Polônia para acalmar-me da sede que estou de efetuar esta missa de tão importância para o Reich.
Ao ouvir estas palavras, Hitler levantou-se e disse:
_sabe por que eu pessoalmente o escolhi para esta missão Sargento Vollman? Porque eu sei que se você não puder executá-la com sucesso, não há ninguém na Alemanha que possa.
Ouvindo isso, Vollman se retirou do gabinete e foi para casa aonde iria se despedir de Tina e de seus filhos.

Frente a frente com seu inimigo


Vollman embarca para Varsóvia no trem das 6 h e a imagem de sua querida Tina chorando quando ele disse que teria de fazer uma viagem às pressas e que estaria de volta antes do ano novo, lembra-se também de sua voz e seu tom de doçura quando ela lhe diz que ele seria pai outra vez. Sentado ao lado dele estava um senhor de uns 45 anos que estava indo também para Varsóvia e este senhor inicia uma conversa com Vollman sem saber quem ele era começa a falar sobre os terríveis acontecimentos da guerra. Vollman pela primeira vez ouve o povo alemão falar contra a guerra e acha irônico que aquele mesmo povo a poucos anos atrás estavam nas ruas dando vivas ao homem que os meteu neste conflito e que agora não há mais saída.
A viagem que antes do inicio da guerra era repleta de belas paisagens, agora o que se via eram batalhões cansados e com frio deitados as margens da ferrovia, vilas e pequenas cidades por onde o trem passava mostravam o que ganharam com a guerra. Escombros e casas em chamas perdiam-se entre a população faminta que em busca de restos de comida ou apenas um pedaço de pão se alinhavam à estrada de ferro para que os viajantes jogassem para eles o que comer, em uma esperança vã isso se repetia cada vez que um trem passasse por aqueles lugares.
Na estação de Varsóvia Vollman se encontrou com um velho amigo de Neumunster, Gustav, que agora trabalhava na estação e que era de descendência judaica, mas que até aquele momento ninguém havia descoberto, pois ele logo no inicio da guerra se mudou para Varsóvia e mudou seu nome, como ninguém o conhecia e ele falava a favor de Hitler em público, segundo ele, fazia isto para não causar suspeita. Gustav ao perceber que havia sido reconhecido por Vollman e ele sabia que seu amigo era militar, sem ação ficou imóvel. O que falaria mais alto: a amizade que os dois tinham desde criança, as lembranças das travessuras feitas pelos campos floridos de Neumunster ou o fato dele ser soldado do Reich? Logo ele iria saber.
Vollman se aproximou de Gustav e o abraçou perguntando como ele estava e a família, havia mudado também para Varsóvia? Ainda meio confuso e descrente do que estava acontecendo, afinal a guerra fez várias coisas mudarem e mesmo Gustav sendo o melhor amigo da infância de Vollman, isto não fazia ele deixar de ser um judeu.
_Não Herr Vollman. Eu vim só para Varsóvia e minha família uns foram para a Dinamarca, outros para a Noruega e enfim, nos dividimos para nos manter vivos Vollman, até hoje eu consegui, mas...
_Como “mas” Gustav. Você é meu melhor amigo e não serei eu quem ira cometer este crime contra você ou os seus, meu amigo. Sou militar e você bem sabe que estou no exercito a muito tempo, muito antes de a Alemanha virar anti-semita eu já era soldado. Vamos deixar de falar besteiras e vamos tomar um café para conversarmos. É sempre bom lembrar de nossa infância, sinto saudades do tempo em que corríamos pelas ruas de Neumunster e o Dr. Hess. Lembra-se dele não? Seu filho Rudolf está preso na Inglaterra, e parece que será condenado a morte. Está acontecendo tantas coisas que eu não sei o que será de meu país.
Os dois sentaram-se e conversaram por um longo tempo e depois da despedida, Vollman sentiu-se mal por não poder fazer nada para ajudar seu amigo, um destacamento da Gestapo estava vindo para Varsóvia exclusivamente para cassar judeus infiltrados no dia-a-dia dos cidadãos comuns da cidade.
Hospedou-se em uma pequena pensão próxima ao Campo de Varsóvia e começou a por em prática o plano elaborado a meses pelo staff de Hitler.
Na manha do dia seguinte, Vollman despertou-se cedo e se pôs em prontidão na janela do quarto para observar o entra e sai do campo a proximidade do campo com a cidade era de se espantar que os oficiais houvessem permitido construir uma prisão tão perto do centro e do outro lado estava o Gueto de Varsóvia, duas bombas judias prestes a explodir em um mesmo lugar.
 Às três horas da tarde enfim Vollman saiu do seu quarto e foi até o portão do campo. Parado em frente ao portão, Vollman pergunta a um soldado:
_Hi Hitler. Herr soldado é possível falar com o comandante do campo?
_não. O Coronel Urich Dier Spieg não se encontra aqui, só ira retornar depois do natal.
Vollman estava feliz por “spiogui” não estar ali e sentiu que iria realizar sua missão sem problemas. Iria agir ainda esta noite.
Após o jantar, Vollman se dirigiu para seu quarto e se deitou, iria esperar o toque de recolher para dar inicia a empreita ao qual haviam depositado tanta confiança nele.
Ele adormeceu e durante o tempo em que dormiu teve um sonho que mexeu com ele. Vollman sonhou que uma mulher estava ao seu lado e ele estava cego, a mulher o conduzia por uma estrada e ele podia sentir o perfume exalado por rosas e isso o fazia sentir-se bem. Derrepente o odor suave das rosas se transforma em um cheiro podre que fazia as suas narinas arderem e ele apertou forte a mão da mulher que o conduzia e ela disse a ele:
_Não se apavore e nem sinta medo, eu irei enfrentar o pior depois que você me salvar.
Vollman quando acordou não entendeu o que aquele sonho significava e isto levaria séculos para que ele compreendesse.
Na calada da noite ele conseguiu invadir o campo e foi até os alojamentos onde estavam os cientistas Michael Dudier Stin e Albert Croiss Abnael, acordou-lhes sem que os outros percebessem e então se dirigiu a cama do matemático italiano Andréas de Cesáris, após unir os três alvos de sua missão, Vollman os conduziu para fora do campo e em liberdade os explicou que ele era membro da resistência e que por ordem dos chefes da resistência polonesa iria tirá-los dali.
Em um automóvel que havia sido estrategicamente deixado em uma rua próxima, dentro havia fardas do exercito alemão e todos se vestiram. Vollmann era o chofer deste veiculo e os levou para fora de Varsóvia, até uma plantação próxima onde um avião da Luftwaff cuidadosamente camuflado os aguardava.
A aeronave decolava e os três passageiros então se deram conta da mentira quando viram os oficiais a bordo cumprimentarem e elogiarem o feito de Vollman, eles eram oficiais da gestapo.
Ao aterrissarem em Dusseldorf como estava previamente combinado, Vollman voltou para Berlim e foi diretamente para casa ver a sua tina.
Vollman havia retornado na noite do dia 25 de dezembro e bem a hora da ceia. Tina ao vê-lo correu para seus braços e o beijou.
Após tudo que havia passado não tinha nada que ele queria mais do que estar nos braços de sua mulher outra vez.
No dia seguinte pela manha foi convocado a ir ao gabinete de Hitler. Dessa vez ele sabia que era para colher os louros da vitória da missão e ele se dirigiu ao gabinete do fuher.
_Hi Vollman. Meus parabéns. Disse o próprio Adolf Hitler em pessoa quando Vollman cruzou a porta de entrada de seu gabinete.
_obrigado meu fuher. Fiz apenas o que meu dever como soldado do Reich exige que eu faça. E dizendo isso Vollman recebeu a medalha de distinção e Hitler foi o primeiro a chamá-lo de tenente Vollman. Ele acabava de receber uma promoção por bons serviços ao Reich.
O dia foi de comemoração, os inimigos da Alemanha acreditavam que um dos aliados havia roubado os cientistas bem embaixo do nariz de Hitler e que era apenas uma questão de tempo ate que eles aparecessem e o mundo teria a prova de que a Alemanha é vulnerável. Fato que segundo os planos de Hitler não iria acontecer mais. Acontece que dois meses após o êxito desta operação, o MI-6, serviço secreto inglês, descobriu o paradeiro dos cientistas e antes que a contra espionagem alemã desconfiasse, os três estavam aterrissando em New York e para aterrorizar Adolf Hitler, eles iriam determinar o fim da guerra.
Mas Vollman permaneceu herói e o fuher ainda o tinha em alto grau de confiança.

Roberto começa a chorar


ROBERTO. Esse nome era usado para denominar as três capitais do eixo: Roma, Berlim e quio.
Em 1943, a Itália estava tendo derrotas sucessivas e Mussolini e seu fascismo não era mais aceito pela população italiana, as tropas aliadas conseguiam a cada vitória mais adesões de italianos querendo liberdade e em troca ofereciam informações que levaram o exercito italiano quase que ao completo extermínio e o auge foi atingido quando conseguiram apreender o Duce, como era chamado Mussolini.
Mussolini havia renunciado por ordem do Grande Conselho Fascista e o presidente provisório, o Sr. Pietro Badoglio assinou a rendição italiana em 3 de setembro de 1943.
Hitler estava irado com esses acontecimentos, ele estava com raiva dos inimigos por terem conseguido prender o Duce, mas estava com ódio de Mussolini e de suas consecutivas derrotas. Grécia, Eritréia, que hoje se chama Etiópia e o que é ainda pior, deixou-se ser aprisionado pelo inimigo e isto era inaceitável para um líder, dizia Hitler.
Mas ele tinha que tomar alguma atitude para salvar o aliado preso pelos inimigos.
Em uma reunião do alto comando militar, Hitler lembrou-se de que havia no Reich um soldado que já havia efetuado um resgate tão audacioso e perigoso quanto o que precisava ser feito agora, o tenente Theobald Vollman.
Mandaram chamá-lo imediatamente e em poucos minutos, lá estava Vollman enfiado entre mapas, desenhos, cálculos estruturais e sempre ouvindo um fuher alterado, dizendo que era crucial pra a vitória alemã que ele obtivesse êxito nesse resgate.
Tina e Vollman, que metido nessa nova missão secreta estava um pouco nervoso, comemoram o nascimento de seu terceiro filho: Luiz Antonio Daudt Vollman.
O plano consistia em invadir a prisão onde se encontrava Mussolini e leva-lo a um local seguro para que ele pudesse retomar o comando das tropas da Itália e eles pudessem finalmente vencer esta guerra.
Vollman se dedicou a missão com o afinco de um militar de carreira e que obedecia às ordens de seus superiores.
No inicio de 1944, um pelotão de doze homens invade uma fortaleza no sul da Itália e libertam Mussolini.
Esta vitória do eixo dá novo fôlego aos seus exércitos e a guerra por alguns dias parece mudar seu rumo e o tenente Theobald Daudt Vollman é novamente homenageado pelas mãos do próprio fuher.
Mussolini fundou a Republica de Soló e apesar da insistência de Hitler não consegue manter o poder. No dia 25 de julho, ele renuncia ao cargo de primeiro-ministro, no dia 8 de agosto se rende.
Theobald foi condecorado por bravura no dia 20 de julho, três dias antes de Hitler sair ileso de um atentado que culminou com a morte de mais de cinco mil acusados pela tentativa frustrada de matar o Fuher.
Hitler faz um discurso à nação onde seu ódio pelos judeus faz Vollman tremer e desejar matá-lo.
Em meio ao caminho de volta para casa naquela noite, Vollman lembrou-se da visita que o filho de um primo seu, havia feito a alguns anos quando veio trazer uma prisioneira procurada a muito tempo pela policia alemã por ser fazer parte do partido comunista. Um brasileiro chamado Carlos Vollman, que tinha vindo à Alemanha escoltando a judia-alemã extraditada do Brasil, Olga Benário que havia sido enviada para Auschwitz. Vollman começa a pensar em tirar Tina e as crianças da Alemanha.
A derrota da Alemanha era apenas uma questão de tempo. As tropas cansadas e sem moral, as derrotas sucessivas e as punições de Hitler aos oficiais derrotados pioravam o clima nos quartéis. Isso iria acabar e Vollman temia pensar no que o mundo faria com os alemães que sobrevivessem. Principalmente os militares.

Tina vai embora


Não haveria vitória e desta vez, a derrota seria ainda mais vergonhosa para a Alemanha, pensava Vollman e ele tinha que tirar sua família da Alemanha e envia-los a um local seguro, a um local que não existia na Europa.
Por meio de alguns amigos portugueses, ele entra em contato com seu primo que vivia no Brasil acaba, quase sem querer, descobrindo uma operação feita sob sigilo por alguns oficiais alemães que pensavam iguais a ele e que também estavam enviando a família para um local seguro, eles estavam enviando as suas famílias para a Argentina. Após o contato feito com estes oficiais, Theobald conseguiu encaixar a sua família e agora ele precisava encontrar uma forma de convencer a sua amada Tina.
Vollman tinha certeza de que sua família precisava sair da Alemanha, mas será que ela iria aceitar ir embora sem ele? Ao longo destes anos, o casal vivia trocas de provas de amor diariamente, Tina não pensava em outra coisa que não fosse Vollman e vice-versa, ele pensava e demonstrava seu amor por ela a cada segundo de vida.
Ele decidiu que seria como sempre fez, sem rodeios ele foi direto ao assunto quando chegou em casa naquela noite e sentados na varanda da casa em que viviam na vila de Ilê.
_Mas eu não quero ir, não sem você! Disse Tina ao ouvir seu marido dizendo que ela iria embarcar para o Brasil em um cargueiro que partiria de Lisboa em poucos dias e que ele já havia conseguido que alguns amigos militares de carreira e não nazistas tinham conseguido para ele.
Despediu-se de seus filhos com a certeza de que nunca mais os veria e para acalmá-los, ele dizia que em breve eles estariam juntos outra vez. A Tina ele não conseguiu mentir e descreveu tudo o que se passava no front e que apesar de ele estar sofrendo com essa separação, nada naquele momento era mais importante do que coloca-los em segurança.
Alguns dias depois, tudo já estava pronto para a partida de sua família e Vollman estava triste por saber que iria ficar sem aquele belo sorriso de sua esposa, uma ilha de felicidade em meio ao terror da guerra, mas era preciso. O amor que sentia por sua família era grande demais para deixá-los na Alemanha e enfrentar a ira dos inimigos quando estes chegassem a Berlim.
Na manha do dia 12 de novembro de 1944, Vollman, segurando as lagrimas que insistiam em querer rolar pelo seu rosto pálido, insistiu e Tina aos prantos embarcou em um Volkswagen rumo a cidade de Worms, onde iria encontrar com outras esposas de oficias que estavam sendo tiradas da Alemanha em segredo, nem o próprio Hitler sabia desta operação.
Tina segue os planos feitos por seu marido e foge rumo a América do Sul.

1945


            Berlim já não parecia mais uma cidade e o fuher não saía mais de dentro de seu bunker, todos os membros do alto comando militar estavam ocultos em algum buraco daquela Berlim bombardeada noite e dia pela R.A.F., os russos estavam em território alemão, a França estava livre, Rommel havia morrido, a Luftwaff quase não conseguia mais decolar e quando conseguia, os seus pilotos fugiam ou eram mortos em combate. Mas nosso amigo Vollman era um oficial do exercito alemão, herói da 1ª guerra mundial e desta guerra em curso. Resolveu manter seu posto e continuou seu trabalho, ainda que temesse o poder dos inimigos que até então eram quase inofensivos, mas que agora mostravam um poder duas vezes maior do que os do eixo.
            No dia 28 de abril, na Itália, Mussolini e sua mulher Claretta Petacci, são metralhados em uma vila de nome Belmonte, próximo a Azzano, no norte daquele país.
            Vollman sonhava com sua família todos os dias e certo dia após um pesado bombardeio a cidade de Berlim, Hitler entra na sala em que Vollman trabalhava e este estava chorando, olhando uma foto de sua família e Hitler o olha nos olhos e diz:
            _ Herr Vollman, Herr Vollman. Por que choras assim, agora a tua família está em segurança e tu estás aqui cumprindo seu dever de soldado do Reich. O Brasil não pune mais os judeus e, portanto tu podes ficar tranqüilo que lá eles estarão fora do alcance da gestapo e eu não vou permitir que mais um herói desta nação seja fuzilado.
            _Mas Herr Adolf.
            _Pensa que eu não sabia que tua esposa era judia, Herr Vollman? Eu sempre soube e seu amigo “Spiogui” fez questão de me dizer e eu o enviei ao front russo para esfriar a cabeça e não se meter em meus interesses. Eva Braun a conhecia, foram vizinhas ainda no tempo de meninas na cidade de Dantzig, e ela a reconheceu ao vê-la certo dia passeando pelas ruas de nossa querida Berlim. Eu não quis que fosse preso porque sabia que era útil para o sucesso da Alemanha. Sabia que enquanto nada acontecesse a sua família tu faria todo possível para desempenhar seu papel com todo o zelo e eficácia que eu precisava. Após a operação de libertação de Mussolini, tu estavas com a mão na “Cruz de Ferro”, mas eu não podia dar a um homem casado com uma judia a maior condecoração da Alemanha. E agora que tua família está no Brasil, espero que continue em seu posto e siga as minhas ordens como tens feito.
            _Meu Fuher. Sei da confiança que depositou em mim e agora ao ouvir que o senhor sabia da origem de minha mulher eu serei mais fiel do que fui até hoje. Disse Vollman ainda em estado de torpor após ter ouvido do próprio Hitler que ele sabia que sua mulher era judia.
            Vollman foi uma das ultimas pessoas a estar com o fuher ainda vivo e poucas horas depois dessa conversa entre os dois, soldados aliados entravam na sala de Vollman e o prendiam como prisioneiro de guerra.
            Era o dia 30 de abril de 1945.

De volta a Nuremberg


Todos os prisioneiros de guerra eram julgados de acordo com seus crimes, e os mais graves eram enviados para Nuremberg, prisioneiros dos altos escalões e principalmente os que comandavam os campos de concentração, Vollman era o segundo em comando na administração geral destes campos e por isso foi transferido para a cidade onde tudo começou.
Vollman era um oficial de carreira e todos sabiam disto, um dos poucos que trabalhou ao lado de Adolf Hitler e mesmo assim não se filiou ao partido nazista, ele era apolítico, ele acreditava que armas e política não se misturavam, ainda que acreditasse que os dois tinham o mesmo dever que era defender a nação a todo e qualquer custo.
Os aliados começaram a formar um tribunal para julgar os crimes de guerra cometidos pelos alemães e o mundo aguardava ansioso por uma “caça as bruxas” como na era medieval, os alemães haviam matado muitos ciganos, homossexuais, deficientes físicos e principalmente os alemães haviam matado centenas e centenas de judeus. Era preciso vingá-los, ouviu Vollman de um cabo do exercito americano que desfilava pelos corredores das celas onde estavam presos alguns dos mais altos integrantes do Reich. Vollman descobriu que o líder de toda essa matança não havia sido encontrado pelas tropas inimigas e ele pensou, será que ele fugiu? Hitler não era dado a fugas deste tipo, sempre acreditou que o fuher não iria render-se jamais e muito menos iria fugir e o que haveria acontecido ao Fuher?
Em uma manhã, Vollman acorda com uma gritaria e um corre-corre pelos corredores, ele se levanta para ver o que era e descobre que um homem muito conhecido por todos ali e chamado de “Águia negra” havia se suicidado. Theobald sente um frio percorrer pelo seu corpo e ele se dá conta do acontecido. Águia negra era o guarda costa de Hitler, era ele o responsável pela segurança pessoal do fuher e ele o conhecia muito bem, Vollman sabia que aquele homem não se mataria assim, alguma coisa tinha acontecido para que ele cometesse o suicídio.
O julgamento estava marcado para começar em quatro dias e deram a Vollman papel e caneta para que ele escrevesse a sua confissão a ser entregue ao juiz que iria julgá-lo.
_hei, chucrute. Escreva aqui os crimes que você cometeu e quem sabe assim você consegue o perdão de Deus. Disse aquele cabo americano com o mesmo sorriso sarcástico que Vollman via todos os dias desde que estava em Nuremberg.
Vollman pegou o papel e imediatamente pensou em escrever uma carta para Tina e seus filhos, mas essa idéia foi logo posta de lado por que ele sabia que se escrevesse a carta, o exercito inimigo que agora era seu carcereiro iria abrir a carta e assim saberiam onde encontrar a sua família e isto era perigoso demais.
O julgamento começou enfim no verão de 1946. Vollman era um dos últimos a ser olvido e por isso teve mais tempo para preparar a sua defesa. Quando finalmente foi ser olvido pelo juiz, ele estava mais firme e convicto de que não deveria estar ali, este tribunal era para os que haviam cometido crimes de guerra e ele nunca havia feito tal coisa, nunca havia matado um civil ou mesmo um militar com requinte de crueldade. As vitimas dos disparos feitos por ele eram soldados e a maioria em uma guerra que já havia terminado a décadas e ele não poderia ser julgado por atos cometidos na 1ª guerra mundial.
Ao entrar no tribunal, não fizeram com ele o que era de costume, não leram as acusações contra ele e Vollman sentou-se enfrente ao juiz sem saber por que estava ali.
Ao ser indagado pelo promotor por que ele era soldado do Reich, ele não entendeu a pergunta e disse:
_Por que o Sr. é promotor dos Estados Unidos Herr, como é mesmo seu nome?
O promotor ficou furioso com a pergunta de um homem que estava ali para responder e não para perguntar e lhe disse, agora com um tom de raiva em sua voz:
_O Sr. é Theobald Daudt Vollman, Tenente do exercito alemão e ajudante de ordens de Adolf Hitler?
Ao ouvir estas palavras, Vollman finalmente entendeu por que ele estava ali. Eles precisavam punir Hitler, mas como o fuher não havia sido encontrado até então, eles queriam puni-lo por meio dos que o cercavam. Eles acreditavam mesmo quase um ano após o fim dos confrontos, que Hitler deveria estar escondido e que alguém de sua confiança sabia onde estava o seu líder e pressionado com o risco de ser condenado a morte, eles iriam delatar a localização de Adolf Hitler e a hipótese de que ninguém sabia do seu paradeiro era quase que uma piada nos corredores do tribunal.Vollman então responde:
_Sim. Herr promotor.
_Consta que o Sr. era também quem enviava para os campos de concentração, os produtos necessários para o extermínio de milhões de judeus?
_Em toda a minha vida eu nunca enviei material para matar alguém em campo de concentração. Eu era responsável pelo abastecimento de comida, roupa e demais utensílios para os campos.
_E como o Sr. explica esta nota onde consta que o Sr. autorizava o envio de agentes químicos para Dachau, Varsóvia e o que é pior, segundo as suas anotações, está aqui dizendo que não poderiam usar mais do que 25 gramas para cada um, ou seja, que tinha que economizar até para matar?
_Mas, esta nota é de um produto para matar piolhos, Promotor.
_Piolhos, você agora chama as suas vitimas de piolhos? Sem mais perguntas excelência.
E Vollman é retirado do tribunal e enviado de volta a sua cela. Vollman percebeu que eles não tinham nada contra ele que pudesse levá-lo a morte e que era apenas uma questão de tempo até que ele conseguisse sair dali e ir para o Brasil encontrar com Tina e seus filhos.
Corria o ano de 1947, e tudo seguia cada vez se complicando mais, o tribunal começava a dar claras demonstrações de que não queria julgar, mas sim condenar os seus réus e Vollman percebia isto a cada audiência. O juiz que estava julgando o caso dele adoeceu. O julgamento entrou em recesso por tempo indeterminado.
As atividades foram retomadas em setembro do mesmo ano e Vollman teve uma surpresa ao entra na sala do tribunal naquele dia. Gustav, seu amigo de infância estava ali e ele poderia ajudá-lo, afinal eles cresceram juntos e ele havia ajudado Gustav em Varsóvia.
Vollman olhou Gustav nos olhos e sentiu que o amigo ainda nutria por ele um grande sentimento de amizade quando ao passar por ele diante de todos os presentes, Gustav olhou para Vollman e disse:
_Vollman! O que você está fazendo aqui? Você não era para participar deste crime que estão fazendo contra a Alemanha.
Ao ouvir isto, uma grande confusão se formou na cabeça de Vollman. Gustav era judeu só poderia estar ali para ser testemunha, porque estava algemado e dizia coisas desse tipo.

Gustav e a palavra final


Gustav Gotlieb Bauer era filho de uma judia e um alemão e ele tinha sido criado apenas pela mãe, pois o seu pai morrera quando ele tinha pouco mais de dois anos. Ele tinha um grande amor pelo pai que não conheceu praticamente e devotava um grande amor à Alemanha, quando veio a guerra, mesmo correndo os riscos que qualquer judeu corria naquela época, ele era a favor da Alemanha e de suas táticas para vencer a guerra ou para traduzir melhor quem era Gustav: ele era um judeu nazista.
Ele estava sendo acusado de traidor pelo tribunal porque ele se infiltrava nos grupos de resistência ao Reich e após conseguir a confiança dos chefes, ele os delatava a gestapo, ele agiu a serviço do Reich em várias cidades da Europa e em troca tinha a sua liberdade.
O que Vollman via como uma salvação se transformou na prova que o tribunal tanto precisava para condená-lo.
Quando foi posto frente a frente com Gustav no tribunal, mesmo o seu amigo judeu falando a verdade sobre Vollman, relatando o seu contato com Vollman quando este foi a Varsóvia e teve todas as oportunidades de denunciá-lo, os jurados não acreditaram na inocência de Vollman e o condenou a morte por enforcamento.
Ao ouvir a sentença, Vollman não conseguiu pensar em nada alem de seus filhos e em sua querida Tina. Ele viu todo um passado de gloria, de suas medalhas por mérito sempre baseadas em fidelidade e patriotismo e nada disto serviu para o momento mais difícil de sua vida.
Ainda em sua cela, Vollman estava aguardando a data de realização da sentença, ele começou a pensar em uma forma de se comunicar com a sua família e nesse momento ele foi surpreendido por uma visita ilustre e se emocionou ao ver o juiz que o havia sentenciado a morte entrar em sua cela e lhe perguntar se poderia conversar um pouco.
_Sim. Herr juiz. Entre e sente-se, fique a vontade como vê não possuo muito conforto, mas tenho o necessário para quem irá morrer em breve.
_Eu não vim aqui como seu juiz e não quero ter que passar por isso novamente. Este julgamento acabou com meu censo de justiça e eu pretendo abandonar a carreira quando voltar para casa.
_Porque, o Sr. fez o que seu país queria que o Sr. fizesse e deve sentir-se orgulhoso por ser leal ao seu país.
_Não, não, caro Vollman. Eu vim aqui para fazer justiça e o que fiz foi condenar inocentes e libertar culpados e é isso que eu vim lhe dizer, que o que fiz com você foi determinado pelo conselho de guerra e que apenas fui um instrumento de comunicação entre as partes.
_Herr juiz. Sei de sua honestidade – Vollman não conseguia se segurar – e não há mais o que se possa fazer, eu estou condenado, mas tenho uma coisa que pode fazer por mim.
_Diga-me Sr. Vollman. O que posso fazer por você?
_Eu tenho mulher e três filhos e eles estão escondidos em um país fora do centro dos conflitos e eu não os vejo a muito tempo, gostaria de que uma carta fosse entregue a eles.
_Me de a carta que eu mesmo farei com que ela chegue às mãos de sua família, Sr. Vollman.
Vollman disse ao juiz que por medo do que poderia ser feito com a sua família, ele não havia dito nada a esse respeito, mas que amanha lhe entregaria a carta. O juiz o abraçou e se retirou da cela, Vollman ainda sem entender muito o que havia acontecido ficou feliz por saber que poderia entrar em contato com sua amada e despedir-se dela antes de morrer.
Na sua ultima noite na cela, Vollman ajoelhou-se ao lado de sua cama e como a muito tempo ele não fazia, ele orou a Deus como sua mãe o havia ensinado, dizendo:
_Senhor, que eu seja punido por crimes que não tenho certeza de tê-los cometido, mas que eu possa ter um ultimo pedido, que minha família não sofra as conseqüências de meus atos se é que eles foram errados e não foram bem vistos pelo senhor. Mas que Tina e meus filhos sejam livres e que eles tenham a paz e o amor que merecem e que um dia se eu encontra-los novamente, que eles possam me perdoar por não ter sido o marido e o pai que eles queriam.
A sentença foi cumprida rigorosamente, de acordo com as ordens do conselho de guerra e na manha do dia 28 de novembro de 1948, às 10 horas da manha no campo da morte, tribunal de Nuremberg, balançava em uma corda o corpo daquele herói alemão.




Albertina Mallmann, ou melhor, Albertina Vollman.


De Dantzig para Praga


Era chuvoso aquele frio dia de inverno na linda cidade de Dantzig e os navios soavam seus apitos ao chegarem a aquela cidade, fazendo com que os estivadores ficassem impossíveis de se manterem parados aguardando que a nau atracasse.
Uma jovem com sua filha de apenas seis anos, chega às pressas ao porto e procura um certo navio que estava trazendo a carga mais preciosa de todas as cargas para ela, seu marido. Sophie Mallmann ao ver seu esposo, após um ano a espera de seu retorno o abraça com um vigor e ele corresponde aos sentimentos daquela mulher quando lhe diz para que se preparasse, pois trazia inúmeras notícias e ela iria ficar maravilhada com as novidades.
_Vamos viajara amanha para Praga e isto é apenas o começo de uma vida nova minha querida Sophie. Disse Johan Mallmann e olhando a pequena Albertina, a pegou no colo e disse: - Você será uma princesa enfim, minha querida filha!
Johan e sua família embarcaram pela manha em um trem que os levaria para a cidade que, segundo ele, o futuro seria melhor para todos.
Sophie e Albertina compartilhavam das alegrias de Johan durante toda a viagem para Praga, e ao desembarcarem na estação daquela cidade, os três ficaram deslumbrados com o requinte e a beleza da estação da Estrada de Ferro.
Esperando a família estava um irmão de Johan, Peter, que também trabalhava na cervejaria a alguns anos e que havia conseguido o emprego para o irmão.
Felizes foram conduzidos para uma casa pequena porem muito bonita, construída nos arredores de Praga e bem próxima a cervejaria.
A pequena Albertina ficou maravilhada com uma pequena cabra que estava presa no quintal da casa.
Sophie não se contentava de alegria com tudo o que via e varias vezes perguntava ao marido se tudo aquilo era deles, se aquelas lindas flores que enfeitavam o jardim eram de verdade ou eles estavam vivendo um sonho e em alguns minutos eles iriam acordar com apito de um dos navios chegando ao porto e o marido teria que sair as pressas para ancorá-lo.
Tudo corria as mil maravilhas para a família Mallmann em Praga, Johan tinha um bom salário na cervejaria, Sophie estava a cada dia mais entorpecida pela alegria proporcionada pela sua nova residência e principalmente pelas flores no jardim e Albertina, essa não há como descrever a felicidade que aquela menina estava com o seu novo bichinho de estimação: a cabra pompom, que tinha esse nome em homenagem aos seus pelos branquinhos e cheios.
Tudo era muito bom na nova vida que eles tinham em Praga e a tristeza por Sophie não poder ter mais filhos já não fazia mais parte da vida do casal.
A vida em Praga era muito boa e Albertina havia conseguido ingressar na Escola para Meninas de Praga, uma instituição cobiçada por varias famílias para enviarem suas filhas a fim de terem ali o ensino necessário para serem boas esposas no inicio do século XX.
Albertina se orgulhava de andar pela cidade em seu uniforme cinza e vermelho e de usar sapatos novos pela primeira vez em sua vida, pois até então seus sapatos eram comprados no bazar dos carentes, promovido pela sinagoga de Dantzig.
A alimentação agora era bem melhor e Sophie se orgulhava de poder preparar boas refeições para seu marido e alem do mais, ele agora vinha almoçar em casa e assim suas refeições eram sempre frescas. Sophie todos os dias agradecia a Deus por ter ganhado essa vida maravilhosa que levava agora ela e os seus.

1920


Praga foi pega de surpresa naquela manha de outono, por um surto de febre tifo, onde uma enorme parcela da população faleceu vitimada por essa febre.
Johan e Sophie faziam parte das inúmeras listas de falecidos que eram fixadas as portas de igrejas e templos da cidade. Albertina sentiu a dor da perda dos pais aumentarem a cada dia quando viu que tudo o que era seu, estava sendo tirado, os pais, a casa e até a sua linda “pompom” estava sendo levada pelos proprietários da cervejaria.
Só e desolada, Albertina foi à casa de seu tio em busca de ajuda, mas ao chegar lá, ela descobriu que ele também tinha sido vitima da enfermidade que assolava a cidade de Praga.
Sem parentes e sem dinheiro, Albertina decide viajar de volta para a Alemanha que com a derrota sofrida na guerra estava se reconstruindo e havia vários empregos que ela poderia fazer afinal ela falava russo, checo, inglês, francês, latim e é claro alemão. E assim decidida, ela vai para a estação de trens e descobre que o dinheiro que possui é pouco para dar inicio a sua jornada e ela então senta em um banco da estação e começa a chorar.
Uma família que acabava de chegar a Praga, eles estavam vindo de Paris, a vê em lagrimas naquele banco e se dirigem a ela pensando poderem fazer alguma coisa para ajudá-la.
_Ola mademoiselie! Posso lhe ajudar? Disse o homem a aquela bela jovem em prantos.
_Oui, messie. Eu perdi tudo, minha familia, minha casa e até a pompom eu não tenho mais. O dinheiro que tenho nao dá para pagar a passagem até a alemanha onde eu poderia ter uma chance de conseguir um emprego e me manter. Agora eu nao sei mais o que fazer.
E após contar a sua história ao casal de estranhos, eles a convidaram para trabalhar para eles por um tempo. Eles iriam ficar em Praga por seis meses e eles nao falavam muito bem aquele idioma e precisavam de alguem para auxilia-los e assim Albertina comeca a trabalhar para a familia de Didier Duguay Pirroni, que em 1945, seria um dos chefes da resistência francesa em Marselha.
Didier, havia ido para Praga a trabalho e levou sua esposa, Judith e seus dois filhos, Alan e Charles, este tinha uma deficiência física, ele mancava da perna esquerda.
A vida deu a Albertina um momento de paz e os dias em que este a serviço da família Duguay foram dias calmos.
Enfim, ela conseguiu não só o suficiente para a passagem para Nuremberg como também algum dinheiro a mais para se manter até conseguir emprego e assim ela embarca para a Alemanha.
A felicidade daquela menina ao embarcar para o estado germânico era tanta que a viagem parecia durar uma eternidade e ao chegar em solo alemão, Albertina se maravilhou com o esplendor de Nuremberg.
Ainda dentro da estação ferroviária, um jovem e bonito soldado havia se encantado com ela e naquele dia ela percebeu que havia encontrado a sua metade, o homem que iria fazer parte de sua vida e com quem ela seria feliz.
Os dois se encontravam quase todos os dias e ela estava a cada dia mais apaixonada por aquele soldado alemão. Seus encontros com o jovem Vollman nas tardes, eram o objetivo de um dia inteiro daquela jovem. Enquanto ela trabalhava em um hotel como camareira, ela esperava ansiosa pelo fim do expediente e correr até a Praça das Armas, uma praça muito bem arborizada e próxima ao hotel, para encontrar seu amado.
Um belo dia, ele a pediu em casamento e Tina voltou a sorrir, como desde o dia em que chegou a Praga e viu o seu novo lar que ela não sorria assim e então ele aceitou o pedido do jovem e se casou com Theobald Daudt Vollman.

Um casamento cheio de extremos


Albertina deu a luz a um menino, a quem deram o nome Antonio Carlos, infelizmente eles o perderam poucos meses após o nascimento daquele bebê que nasceu prematuro, havia nascido no sexto mês de gestação e isso fez Tina e seu esposo sofrerem muito.
Eles demoraram muito para aceitarem o ocorrido e Tina começou a acreditar que ela estava sofrendo da mesma maldição de sua mãe e que não teria outros filhos, isso a aterrorizava constantemente.
Quando Tina já havia se contentado com o fato de não poder dar a luz a um filho para seu amado Theobald, ela descobriu que estava grávida, e Tina todos os dias durante a gravidez, dava graças a Deus por essa dádiva que estava para receber.
Ao nascer, um menino forte e saudável, eles o batizaram com o nome de Alfred Daudt Vollman e o coração de Tina se encheu de alegria novamente.
Esse bebê era tudo que Albertina queria e a sua casa se transformou em um dos lugares mais felizes de toda a Alemanha e seu marido ia trabalhar todos os dias pensando apenas no filho e em seu amor por Tina.
Sua felicidade era tanta que Tina se esqueceu de ir a sinagoga agradecer o presente que havia recebido de Deus e ela comentou o seu desejo ao seu marido.
_Meu amor, sabe que nossos credos são diferentes, mas eu gostaria que me desse a sua permissão para ir até a sinagoga agradecer pelo nascimento de nosso pequeno Alfred.
Vollman escutou o que sua esposa disse e pensou em que resposta iria dar a sua amada e nesse momento alguém bate a porta. Tina vai até a porta para ver quem era e um oficial da gestapo e este lhe pede para falar com seu esposo.
_Entre oficial e sente-se. Eu vou chamá-lo. Disse Tina ao homem da gestapo.
_Sim herr? Disse Vollman entrando na sala.
_Stumpp, Herr Stumpp, disse o oficial ao lhe estender a mão em cumprimento. Os oficiais da Gestapo não prestavam continência a outros militares.
_Herr Vollman, estou aqui para pedir que redobre a segurança de sua casa, há um confronto entre os malditos judeus e os comunistas. Este bairro está repleto deles e podem querer lhe fazer algum mal.
_Herr Stumpp. Não há problemas com a nossa segurança, mas lhe agradeço pela atenção e agora se não se incomoda eu preciso ir dormir.
_Sim Herr Vollman. Boa noite.  E retirou-se da casa o temido oficial da gestapo.
Depois deste ocorrido, Tina não falou mais sobre ir a um templo judeu e o caso caiu no esquecimento.
Tina estava entusiasmada com a sua vida em Berlim, tanto que saia as ruas e sentia a vida correr em suas veias, sentia que o amor que sentia pelo seu esposo crescia a cada dia e agora o seu pequeno Alfred a cada dia mais saudável a deixava entusiasmada com o futuro que estava por vir e muitos dos sinais contrários que apareciam a sua frente não eram percebidos por Tina.
As lojas que pertenciam a judeus estavam começando a fechar em Berlim e as poucas que ainda existiam eram em locais aonde a classe média de Berlim não ia nesses lugares e por isso Tina também não ia. As hostilidades contra os judeus estavam apenas começando e Tina mesmo depois da famosa “Noite dos Cristais” não deu atenção ao perigo eminente que estava a cada dia mais perto de todos os descendentes de Abraão.
 Tina era toda para sua família e o bem estar deles e sabia que qualquer coisa, qualquer ato, que os pusessem em perigo, esse perigo deveria ser afastado rapidamente e se a religião dela era um perigo, Tina estava decidida a nunca mais deixar transparecer que ela era de origem judaica e por isso abandonou de uma vez por todas os seus credos e dogmas.
Albertina havia se renegado a ter uma vida própria e se entregou ao bem estar da família. Ela estava feliz com isso, o fato de ter abandonado suas crenças e tradições não importava para ela porque ela tinha um amor que era grande o suficiente para preencher o vazio que havia em sua vida desde que perdera a sua família ainda na cidade de Praga e que tudo agora era bom e não haveria mais pesadelos no mundo de sonhos em que ela vivia agora. Tinha um bom marido, tinha um lindo e saudável filho e esse castelo não iria nunca ruir acreditava Tina.
Até que começou a guerra e as coisas se modificaram, as ruas de Berlim já não eram tão bonitas quanto nos primeiros dias em que eles foram viver ali, Tina se lembrava da sua lua de mel e da ordem que Vollman recebeu de não retornar a Nuremberg e sim de se apresentar ao Reich, quando recebeu uma promoção e da importância do novo cargo de seu esposo que agora trabalhava lado-a-lado com o próprio Fuher.
O pesadelo estava começando outra vez na vida de Tina.

A viagem para o Brasil


Um dia seu esposo chegou em casa, Vollman estava desolado e muito entristecido, Tina pressentia que algo de muito ruim estava acontecendo e que era preciso ser forte naquele momento para que pudessem superar o que estava por vir. Tina não fazia idéia de que naquela noite, Vollman diria a ela que ela e seus filhos têm que deixar a Alemanha.
Após tomar ciência do que estava acontecendo na Alemanha e do perigo que ela e seus filhos estavam correndo em ficar ali, o casal decidiu que o melhor realmente era ela ir embora e Tina apenas não concordava em ir para um país tão distante e desconhecido como o Brasil.
No dia marcado, Tina e seus filhos embarcaram em um automóvel para ir até a cidade de Worms, onde eles encontraram com outras mulheres e crianças que estavam também fugindo da Alemanha. A bordo de um hidroavião, eles voaram até uma cidade no litoral francês, Marselha.
Chovia muito durante a decolagem, o que deixou todos os passageiros muito apreensivos quanto ao que poderia acontecer durante aquele vôo e quando estavam próximo a fronteira com a França por pouco uma bateria antiaérea das tropas aliadas não abateu a aeronave.
Após o tormento que foi este vôo, eles aterrissaram no mar e os passageiros tiveram que nadar até a praia onde foram surpreendidos por um grupo da resistência francesa que estava ali.
Tina reconheceu imediatamente um dos lideres da resistência e disse:
_Messie Didier? Didier Duguay Pirroni?
_Quem é você? Disse Didier
_O Sr. obviamente não se lembra mais de mim? Eu sou Tina, Albertina Vollman ou como o Sr. me conheceu Albertina Mallmann.
_Tina, a pequena Tina de Praga? Soltem-na. Disse imediatamente após a reconhecer e Tina se pós a narrar tudo o que aconteceu ao seu velho patrão que depois de ouvir toda a história contada por aquela a quem eles deviam muito por ela ter, de uma forma simples, mas com muito carinho, ter trago à alegria de seu pequeno Charles de volta.
Didier, demonstrando uma gratidão imensa a Tina, deu liberdade ao grupo e ainda os ajudou a chegar até Portugal, onde eles iriam embarcar em um navio cargueiro para a América do Sul.
Após uma viagem longa e com o medo de serem afundados por navios de todas as nacionalidades, eles chegam em território brasileiro e Tina desembarca na cidade do Rio de Janeiro, no dia 1º de janeiro de 1945, com seus três filhos: Alfred Daudt Vollman, com dez anos, Doriz Daudt Vollman com cinco anos e Luiz Antonio Vollman com quase um ano de idade.
Tina maravilhada com a beleza da baia da Guanabara entrega seus papéis ao agente da imigração no porto do Rio de Janeiro e este, um homem de pouca cultura, mas com muito censo de humor, olha para aquela mulher linda com seus cachos louros e seus lindos olhos azuis tendo ao colo um bebê de pouco mais de seis meses e duas crianças ele resolve mudar um pouquinho as coisas e acrescenta um “n” em seu nome e por isso Albertina Daudt Vollman agora era Vollmann.
Ao encontrar-se com o primo de seu marido, ela não falava português e este a recebe muito bem.
Na casa de Carlos no bairro do Catete, ela entrega a ele os seus documentos para que ele conferisse para ver se esta tudo de acordo com a legislação do país que a recebia e é então que Carlos percebe que houve um erro na imigração, ele lhe diz que acrescentaram um “n” em seu nome e que iria tentar resolver este problema.
Tina só conseguia pensar no marido que havia ficado na Alemanha e no que iria acontecer com ele.

A vida no sul


As coisas no Brasil não estavam nada bem para o atual governo. O fim da guerra era certo, a vitória era comandada por paises democratas e o Brasil, uma ditadura em breve teria que mudar.
O presidente Getulio era chamado de pai dos pobres e Tina lembrou de ter ouvido o povo alemão chamar Hitler de algo parecido durante os anos trinta.
Carlos entrou em contato com alguns parentes que residiam na região sul do Brasil, na cidade de Porto Alegre, no Estado do Rio Grande do Sul. Alguns familiares não gostaram da idéia de receber Tina em suas casas ainda que por pouco tempo.
E assim, em meio a este clima de desconfiança e falta de hospitalidade familiar, Tina e seus filhos chegam a Porto Alegre e então vai para a casa de uma prima de seu marido no bairro Moinhos de Vento.
Tina não foi bem recebida por essa família e não vê a hora de sair daquela casa. Depois de uns dias, chega a Porto Alegre, Carlos. Tina o implora por notícias de seu marido e para que Carlos a tire da casa onde está, pois não agüenta mais, é muito grande o sofrimento que a proprietária daquela residência impõe a ela.
Carlos então, consegue entrar em contato com um parente de Tina, uma irmã de sua mãe e que havia mudado para o Brasil alguns anos antes da guerra.
Ela residia também em Porto Alegre, no bairro de Ipanema e assim, Tina vai residir na casa de sua tia Mirna Mallman Bertold e as coisas não mudaram muito.
 Ao passar pela porta da residência de sua tia, Tina foi surpreendida por uma mulher autoritária, viúva a dois anos, “Tia Mimi” como era chamada por todos, a surpreende dizendo a ela que ela deveria entrar e sair da casa pela porta dos fundos, e que não poderia freqüentar a sala e deveria fazer as suas refeições na cozinha.
Tina, em troca de casa e comida para ela e seus filhos, trabalhava como domestica na casa da irmã de sua mãe. Alfred saía todos os dias pela manha e ia trabalhar como engraxate na Rua dos Farrapos, uma rua famosa em Porto Alegre pela vida noturna agitada e freqüentada por mulheres de má fama.
Doriz e o pequeno Luis ficavam trancados no quarto para não incomodarem o dia-a-dia daquela casa que não acontecia nada durante todo o dia e chegava mesmo a ser monótona a vida ali.

A Carta


Em um dia calmo e monótono como eram todos os dias de Tina na casa de “Tia Mimi”, Carlos cheio de alegria bate impacientemente a porta e tia Mimi a abre já pronta para dar-lhe uma bela repressiva quando ele entra na casa sem dar tempo dela reagir e diz a Tina:
_Arrume as suas coisas e as de seus filhos, você vai sair desta casa hoje mesmo, já aluguei uma residência para você e eu estou aqui com a chave, tome! Enquanto falava, ele estendeu a mão para Tina e lhe mostrava uma chave que pendia de um chaveiro com a bandeira do Brasil.
Tina incrédula tremia ao receber das mãos de Carlos as chaves de uma casa que para ela era o símbolo de uma liberdade que ela havia perdido desde o dia em que tinha vindo para esta desconhecida cidade.
Carlos vendo a emoção e alegria de Tina pede para que ela se sente e lhe diz:
_Um certo Sr. James Crowell esteve no Rio de Janeiro a alguns dias, ele estava a serviço e me perguntou onde poderia encontrar você, disse que tinha uma entrega para lhe fazer que precisava encontrá-la. Eu disse a ele que você estava vivendo aqui e ele ficou desapontado, pois não teria tempo para vir aqui pessoalmente lhe entregar isto. - e Carlos estende uma carta até as mãos de Tina – Carlos também lhe entrega um envelope.
Tina pega a carta e imediatamente reconhece a letra de seu esposo e suas mãos tremulas, começam a abrir o envelope enviado por Vollman. Ela retira a carta escrita por seu amado e começa a lê-la.
_Nuremberg, 27 de novembro de 1945.
Querida e amada Tina,
Eu não sei por onde começar e como lhe dizer tudo que preciso que você saiba.
As notícias não são muito boas e não estarei ao seu lado fisicamente para lhe amparar como sempre tentei estar. Lembro-me de você a cada dia de minha vida, desde o dia em que você embarcou, eu não tiro você de meus pensamentos e peço a Deus que te de uma vida de paz e amor.
Eu ainda não sei muito bem porque eles estão fazendo isso comigo, afinal eu nunca cometi nenhum crime de guerra e eles também sabem, disso porque não conseguiram apresentar uma única prova sequer de que eu seja culpado de algum crime contra os judeus, ciganos ou outra raça qualquer, mas o fato é que eles precisam culpara alguém e eu fui um dos escolhidos para servir a esse mórbido propósito.
Amanhã pela manha eu estarei partindo para uma viagem sem volta e o meu único sofrimento é não estar ai ao seu lado.
Eu consegui que o juiz que me julgou enviasse essa carta ate você porque tinha medo de enviá-la pelos meios convencionais e fazer com que eles a perseguissem.
Eu consegui também que ele lhe enviasse esta medalha para que você a guarde e lembre-se de mim, toda a minha vida foi dedicada a você e ao exercito alemão e aqui não tenho nada que possa lhe lembrar algum momento bom de minha vida e essa medalha apareceu em minhas coisas eu ainda não sei como, mas quando eu olho para ela eu me lembro do dia em a recebi, principalmente quando cheguei em casa e encontrei você, lembra?
Eu não sei se você está bem e isso muito me preocupa, peço a Deus que eu um dia possa estar ao seu lado outra vez, se não nesta, que seja em outra em outra vida, mas o que me importa é estar ao seu lado e poder ver o teu sorriso, sentir o teu beijo e te envolver em meus braços novamente, esse é o meu maior desejo e o único que realmente gostaria de poder fazer outra vez.
Quero que você seja feliz e que os nossos filhos dêem a você todo o carinho que você merece e que eu não poderei te dar. Peço a Deus que assim seja.
Amarei-te por toda a eternidade e sei que um dia irei te encontrar em alguma estrela no céu e então voltaremos a ser felizes outra vez.
Sempre estarei ao seu lado e ao lado de meus filhos...
Adeus, minha querida Tina.
Tina estava soluçando de tanto chorar e Carlos teve de ampará-la, ela não disse uma única palavra ao terminar de ler a carta foi para o pequeno quarto nos fundos da casa onde vivia e trancou-se.
Depois de quase uma hora esperando o retorno de Tina e Carlos, preocupado, decidiu arrombar a porta, ele pensava que ela havia feito o pior.
Com vários golpes naquela porta de madeira de lei, Carlos finalmente conseguiu arromba-la e viu Albertina deitada por sobre a cama em lagrimas. Carlos ao aproximar-se dela, Tina lhe disse:
_Ainda que eu quisesse me matar, eu não deixarei de fazer o que meu querido Vollman faria, eu vou até o fim e criarei nossos filhos e eles serão exemplos para esse mundo cruel que matou o melhor homem que já existiu.
Assim Carlos se tranqüilizou e ajudou Tina a arrumar as crianças e os levou para a casa que Carlos tinha comprado para ela no bairro Partenom, na mesma cidade de Porto Alegre.

Inicio de uma nova vida


Ao entrar em sua nova casa, Tina se lembra do dia em que chegou a Praga e por um momento se permite sentir-se feliz outra vez. A casa não era como aquela próxima à cervejaria em que seu pai havia ido trabalhar, mas um detalhe a tocou profundamente: as flores eram as mesmas e ela as tocava sentindo a sua maciez.
Tina acomodou seus filhos e depois foi para o quarto que ela reservou para ela, era uma casa grande, com três quartos, alem da sala, cozinha e etc... No quintal havia um poço e uma pequena horta, Tina chamou seu filho Alfred e o mostrou a horta dizendo:
_Meu querido. Teu pai não virá viver conosco e eu preciso que você assuma o lugar dele em nossa casa, você será o meu braço direito nesta nossa nova vida e a sua primeira tarefa, será manter esta horta para que possamos ter sempre verduras frescas para as refeições, tudo bem?
_Sim minha mãe. Respondeu o pequeno e correu para seu quarto e agarrou uma lata e a entregou a sua mãe, dizendo:
_Mamãe. Eu todos estes dias ia para as ruas trabalhar como engraxate e o dinheiro que ganhava eu guardei, esta tudo dentro desta lata que foi o meu cofre forte e agora eu entrego à senhora este meu pequeno tesouro para que possamos garantir nosso sustento.
Tina ouvindo as palavras de seu filho não conseguiu conter suas emoções e pela primeira vez em sua vida, ela chorou diante de um de seus filhos. Ela o abraçou e disse para si mesma que iria lutar por seus filhos.
O natal de 1948 se aproximava e Tina queria como forma de homenagear o seu marido, fazer uma ceia de natal como não faziam a muito tempo. Vollman adorava cear com a família.
Tudo preparado para a ceia, Tina convida Carlos a passar o natal com eles e este diz a ela que aceita o convite, mas um amigo seu dos tempos de colégio esta em sua casa e perguntou se ele poderia ir também, Tina não viu problema algum e permitiu que o seu “anjo da guarda brasileiro”, assim Tina se referia a Carlos, trouxesse seu amigo a sua casa naquela data tão importante para o mundo devido ao nascimento de cristo e para ela por ser uma forma de homenagear seu querido e inesquecível Vollman.
Eram seis horas da tarde aproximadamente quando Carlos e seu amigo chegaram a casa de Tina ela, ao ver o amigo de Carlos se lembra de Vollman, o amigo dele tinha os traços de seu único amor, o mesmo rosto fino, os cabelos e os olhos eram idênticos ao de seu querido Theobald.
Tina não conseguia esconder sua admiração pela semelhança entre os dois e Carlos percebe que Tina estava impressionada com o seu velho amigo.

 

Dionísio Albuquerque de Oliveira.


Dionísio era filho de um casal de lavradores, plantadores de tabaco e erva mate, na região de Santa Cruz e Venâncio Ayres, no interior do Rio Grande do Sul. Conheceu Carlos quando este estudou no Colégio do Rosário na capital gaúcha. Dionísio e Carlos fizeram amizade rápida e esta amizade se fortalecia a cada ano, os dois resolveram seguir a carreira de advogado e foram para a mesma faculdade e dividiam sempre os primeiros lugares da Universidade de Porto Alegre, que havia sido construída pelo ex-governador do estado, o Sr. Borges de Medeiros.
Os dois chegaram a trabalhar juntos em alguns casos depois de formados, mas Carlos tinha uma tendência para a política e isso volta e meia os levavam a conflitos profissionais, ainda que a amizade prevalecesse, até que em 1935, Carlos foi trabalhar no Rio de Janeiro, então capital do Brasil e os dois se separaram, só se encontrando outra vez em meados dos anos quarenta.
Durante o tempo em que Carlos esteve no Rio de Janeiro, Dionísio filiou-se ao Partido comunista Brasileiro e ele vez por outra se metia em conflitos com a “Ação Integralista Brasileira”, uma organização nazista, comandada pelo Senhor Plínio Salgado e que durante algum tempo obteve apoio do então presidente Getúlio Vargas, mas este logo mandou fecha-la.
Dionísio era um sonhador e tinha como objetivo de vida apenas o prazer de viver um dia depois do outro e por isso, a sua profissão não estava indo muito bem. Foi para o Uruguai por alguns meses tentar a sorte, como ele dizia, mas a experiência não havia sido muito boa e ele logo retornou ao Brasil.
Ficou durante algum tempo na cidade de Cruz Alta, onde advogou e até que se saiu bem, mas se envolveu em um tumulto de lavradores e os fazendeiros o ameaçaram e ele foi embora outra vez.
Tentou a carreira política ao tentar se eleger, com ajuda do pai, para vereador na cidade de Venâncio Ayres e agora era suplente de vereador, mas as chances de assumir o cargo eram muito remotas.
Chegou em Porto Alegre a alguns dias e estava em uma pensão, Carlos encontrou com ele andando pelo Parque da Redenção e após alguns minutos de conversa, Carlos o convidava para estar em sua casa, sua mulher o havia abandonado e ele estava vivendo só, seria bom ter uma companhia e eles eram bons amigos. Dionísio aceitou de imediato o convite do amigo e assim fora parar na noite de natal na casa de Tina e também tinha visto nela uma linda mulher.
Dionísio não sabia do passado daquela linda mulher, ele se impressionou com os olhos de Tina, ele dizia que estava enfeitiçado por aquele azul celestial que tingiram os lindos olhos de Tina.
Carlos não era contra e nem a favor da possibilidade de Dionísio e Tina virem a ter algo entre eles e por isso não dava muita importância aos comentários do amigo no dia seguinte ao natal.
Havia ainda à noite de ano novo e Dionísio estava ansioso para que fosse convidado a voltar ao Partenom na virada de ano.
O melhor amigo de Carlos estava se apaixonando pela sua protegida e esta historia estava tomando um rumo que iria mexer com a vida de todos, eles ainda não sabiam mais Tina olhava para Dionísio e via seu querido Vollman. As estrelas estavam brilhando intensamente naquele verão e o ano de 1946, estava chegando cheio de promessas.

Mudanças inesperadas


 Dionísio não passou a virada de ano na casa da encantadora Tina, isto o deixou entristecido e Carlos ria muito de seu amigo por ele estar agora deprimido, andando de um lado para o outro da pequena casa do amigo no Bairro do Bonfím.
_Dionísio. Se apaixonou, se enlouqueceu, se enamorou, ele se perdeu. Dizia Carlos rindo do amigo.
 No mês de maio de 1946, a política ferve no cenário nacional, o general Eurico Gaspar Dutra havia ganhado as eleições e assumiu a presidência em 31 de janeiro. O Partido Comunista Brasileiro havia sido denunciado ao Tribunal Superior eleitoral, o jogo de azar estava proibido no Brasil e os cassinos estavam fechados e Dionísio dizia que o ano de 1946 entraria para a história.
Recebeu um convite para trabalhar como advogado assistente do Banco de Fomento Agrícola e ele rapidamente aceitou. Sua vida começou a melhorar e certo dia resolveu alugar uma casa para si e deixar a residência do seu grande amigo Carlos.
_Por quê? Tu não estás contente aqui? Disse Carlos quando o amigo lhe comunicou que estava para se mudar em poucos dias.
Dionísio disse que já era hora de ele começar a ter seu próprio ninho e que não podia mais viver à custa do amigo. Carlos não gostou muito da idéia de Dionísio.
O aniversário de Dionísio estava chegando e Carlos combinou com Tina de fazerem para o amigo um almoço de surpresa no domingo próximo a data, ela aceitou prontamente a idéia de Carlos.
 No domingo marcado, Carlos convida Dionísio para irem a casa de Tina e ele aceita rapidamente, era uma oportunidade de ele ver aquela que despertou seus desejos de formar uma família mais uma vez e ele não podia perder essa oportunidade.
_Dionísio. Que bom vê-lo novamente, entre. Disse Tina quando Dionísio chegou a sua casa, acompanhado de Carlos, o seu anjo da guarda brasileiro.
Após entrarem, e sentarem no velho sofá que havia na pequena sala na casa de Tina, os três deram inicio a uma longa conversa e Tina já mostrava grandes avanços na língua portuguesa que apesar do acento alemão, ela já conseguia conversar sem sofrer coma as palavras do idioma lusitano.
Os três ficaram tanto tempo conversando que quase comem carvão ao invés de um lindo peru assado que Tina preparou para aquela data especial e que ainda estava ao forno.
Tina, com os filhos, seu anjo da guarda e Dionísio a mesa para o almoço, sentiu como nos tempos em que a mesa estava o seu querido Vollman e ela olhava para Dionísio com os olhos brilhando. O mesmo fazia Dionísio.
O romance entre os dois era inevitável, faltando apenas o toque de um cupido ou da providencia divina. E foi então que Carlos, que queria o bem estar de Tina e via que o amigo agora tinha como dar a ela uma vida descente decidiu ajudar esta união e começou a freqüentar mais a casa de Tina sempre em companhia do amigo, era um almoço de domingo ou um convite para levarem as crianças ao Parque da Redenção. Sempre encontravam um motivo para estarem juntos e Carlos procurava sempre uma forma de tirar as crianças de perto para que os dois pudessem estar a sós e conversarem.
Dionísio não era do tipo mulherengo e muito menos galã, ele era até um pouco tímido, mas certo dia andando pelo parque, eles pararam e sentaram-se na grama, dando inicio a uma conversa descontraída e que Tina tanto gostava de conversar com Dionísio, que qualquer assunto que falasse com ele, era interessante e então surgiu a oportunidade que os dois esperavam a algum tempo, seus rostos ficaram tão próximos um do outro que seus lábios se tocaram e por alguns segundos o tempo pareceu ter parado e apenas o toque doce dos lábios de Tina eram sentidos por Dionísio que ficou tremulo após ter beijado a mulher que agora sabia com toda a certeza do mundo que a amava.
Tina era toda alegria quando retornaram para casa e Dionísio os acompanhou. Ao chegar em casa, esta era a primeira vez que Carlos não os acompanhava, ele entrou e Tina o convidou para ficar para o jantar, ele aceitou muito prontamente. As crianças gostavam de Dionísio e apenas Alfred, talvez por ser o mais velho dos filhos de Tina, olhava para ele com certo receio que Tina achava ser coisa de criança e não dava muita atenção. Tina olhava para Dionísio e ele lhe lembrava seu querido Vollman e era somente nisto que ela pensava.
Os dois começaram a namorar e decidiram contar a novidade aos filhos de Tina e ao querido amigo Carlos. Prepararam um belo almoço de domingo onde Dionísio iria pedir a mão de Tina e comunicar aos filhos dela que os dois estavam namorando. O almoço corria como se fosse uma bela festa até que Dionísio se levanta e diz:
_Cara Tina, querido amigo Carlos, meninos. Eu quero lhes dizer que eu redescobri a felicidade quando conheci vocês, desde o primeiro dia em que entrei nesta casa, a minha vida recebeu um novo ânimo e que eu sou mais feliz agora. Tina foi para mim o que de melhor aconteceu em minha vida e agora quero que todos vocês saibam que Tina e eu estamos namorando e que com a permissão de vocês e a benção de Deus, dentro em breve nos iremos nos casar.
Em meio às alegrias do comunicado de Dionísio, Alfred levantou-se correndo e foi até o seu quarto, Tina muito contente com tudo aquilo que estava acontecendo, não percebeu que o seu Alfred havia saído da mesa e ela assim como Luis e Doriz correram ao abraço de Dionísio. Foi então que deram por falta de Alfred, mas já era tarde.

Onde esta meu filho?


Alfred era muito inteligente para a sua idade, tinha apenas onze anos, não tinha ido para a escola como seus irmãos, mas olhando os livros deles, sozinho ele aprendeu a ler e a fazer contas, conhecia um pouco de história e geografia porque a sua mãe vez por outra contava a história de como eles viajaram para um país tão distante, foi o primeiro da família a aprender a falar português. Ele lembrava-se muito do pai, a quem tinha um amor maior do que podiam esperar de um menino que viu o pai apenas durante seus seis primeiros anos de vida.
Ele era como seu pai, amava a mãe, e não suportava a idéia de alguém tomando o lugar de Theobald.
Ao ver a mãe com Dionísio, Alfred começou a pensar que sua mãe estava pondo outro no lugar de seu pai e começou ater ciúmes de Dionísio. Continuava a trabalhar como engraxate e juntava todo o dinheiro que ganhava em uma lata que guardava muito bem escondida em seu quarto. Ao ouvir o que Dionísio disse durante o almoço, ele correu para o seu quarto para por em prática o plano que ele vinha elaborando desde o dia em suspeitou do romance de sua mãe com aquele homem.
Com o dinheiro que guardou em sua lata, Alfred foi para o centro de Porto Alegre e lá, na estação ferroviária comprou um bilhete de trem para Curitiba, ele estava decidido a nunca mais voltar porque não queria acreditar que sua mãe estava traindo o amor de seu pai.
Quando perceberam que Alfred havia sumido, imediatamente todos se puseram a sua procura, mas já era tarde demais, Alfred já estava longe do alcance de suas vistas e Tina se pôs aos prantos no sofá da sala.
Dionísio vendo que o acontecido fora provocado pelo comunicado que ele fez, ajoelhou-se diante de Tina e pediu desculpas a ela e ela respondeu:
_Não é só você o culpado por Alfred sumir, eu também estava tão feliz que não previ que o que ele poderia fazer ao receber essa notícia, eu também tenho culpa. E dizendo isso Tina o abraçou.
As buscas por Alfred seguiram pela tarde e até o inicio da noite. O menino tinha desaparecido e quando Tina entrou no quarto dele e viu que ele havia levado alguns pertences como casaco e um cobertor, ela sentiu um aperto no coração tão forte que quase desmaiou.
Enquanto isso, Alfred fez amizade com uma família que estava também indo para Curitiba e que estavam tendo problemas, pois o dinheiro que tinham era pouco para as quatro passagens para a capital paranaense, Alfred logo chamou o chefe da família, um senhor moreno e muito magro, disse que poderia ajudá-los em troca de um pequeno favor:
_Que favor posso eu lhe fazer, menino? Disse o homem olhando para Alfred sem entender o que se passava.
_Preciso ir para Curitiba encontrar com meu pai e tenho medo de os guardas da estação não me deixar embarcar sozinho. Meu nome é Alfred e se o senhor permitir que eu embarque junto com sua família, eu lhe dou o que falta para comprar as passagens.
O homem ouvindo Alfred não hesitou em aceitar o acordo e assim, o pequeno Alfred em poço tempo estaria a bordo do trem que o levaria rumo a Curitiba, rumo ao seu destino.
Já havia se passado mais de um mês e Tina não tinha nenhuma notícia de seu querido Alfred, a policia já tinha entrado no caso, mas como o menino havia fugido, eles não deram muita atenção e a denuncia de desaparecimento se perdeu dentro da chefatura.
Tina chorava todos os dias pela falta de mais um dos seus, lembrava-se de Alfred, do dia em que ele nasce e de tudo que aquele nascimento significou para ela e seu amado Vollman. Lembrou-se da primeira palavra que ele disse, do primeiro dentinho e de todas as caretas que fazia, das brincadeiras com Theobald quando ele chegava do trabalho e das noites em que ela ficava acordada cuidando dele.
Lembrou-se também do primeiro dia na casa em que vivia agora quando chamou Alfred e disse que ele agora era o homem da casa, lembrava-se do pedido que havia feito a ele e do empenho dele em executar todas as tarefas que a mãe havia pedido. Ela sentia a falta dele assim como sentia a de Vollman.
O tempo passava e a dor de Tina pelo sumiço do filho, o casamento dela com Dionísio havia sido interrompido por esse acontecimento e então Carlos um dia após os tradicionais almoços de domingo, pergunta:
_E vocês, desistiram do casamento, não vão mais se casar?
Tina e Dionísio se olharam e este diz:
_É, querida Tina. Já não está na hora de nos unirmos em definitivo e vivermos um para o outro?
Tina sentindo-se pressionada, e por não achar outra resposta que possa prolongar aquela espera por mais tempo diz:
 _Caro Carlos. Eu somente irei me casar outra vez se você aceitar ser o meu padrinho de casamento, desde que cheguei ao Brasil, você tem sido tudo para mim e não há ninguém a quem eu deva mais do que você. Você aceita ser meu padrinho?
A resposta de Carlos era positiva obviamente e deram entrada nos papeis para o casamento de Tina e Dionísio, o que aconteceu apenas no civil devido à diferença de religião dos dois, ou melhor, dizendo, da falta de religião de Dionísio, ele não acreditava em Deus.
Não tiveram lua de mel porque Dionísio estava em meio a um processo de fusão do Banco em que trabalhava com um outro sediado em São Paulo.
Fizeram uma grande festa de casamento e Dionísio foi morar com Tina no Bairro Partenom, mas a vida do casal naquele bairro não durou muito. Poucos meses depois do casamento, o Banco de Fomento Agrícola foi comprado pelo Banco Econômico e Dionísio estava sendo transferido para São Paulo, Tina e seus filhos teriam de se mudar para aquela cidade junto com ele.
Após todos os preparativos para a viagem, Tina chamou Carlos e lhe entregou a chave da casa dizendo:
_Querido Carlos. Obrigado por ter me emprestado esta casa durante todo esse tempo, você me deu o desejo de viver de volta e eu lhe serei eternamente grata por isso.
Carlos emocionado com o que ela dizia, virou-se para Tina e disse:
_Minha querida Tina. Esta casa não é minha, ela é sua. Acho que devido à emoção que você estava quando lhe entreguei a chave, quando você ainda vivia na casa de sua tia Mimi, você não prestou atenção no que eu disse. Você se lembra que eu lhe entreguei uma carta, um pacote e as chaves? Bem, a carta era de seu esposo Vollman, que Deus o tenha, as chaves eram obviamente desta casa e no pacote, você não o abriu? Onde está aquele pacote, Tina?
Tina agora, se lembrara do pacote que havia guardado muito bem trancado em um pequeno baú e foi ate o quarto busca-lo, Carlos e Dionísio foram atrás. Ao pegar o baú, que ainda estava encima do armário e então resolveu abri-lo.
_Tina você guardou isso durante todo esse tempo, eu pensei que... Dizia Carlos quando foi interrompido por Tina.
_Eu achei que eram coisas do Vollman e durante muitas noites eu dormi agarrada a este pacote sem nunca ter tido coragem para abri-lo, apesar de admitir que tivesse muita curiosidade de saber o que estava aqui dentro.
Dionísio rindo do que a sua esposa acabava de dizer, virou-se para Carlos e disse:
_É meu caro amigo. Esta é uma mulher especial e cheia de surpresas, e que surpresa.
Dentro do pacote estava a escritura da casa em nome de Tina e cinco mil dólares que o juiz que condenou Theobald pediu a Carlos que a entregasse. Tina estava rica.

São Paulo


Tina chegou na capital paulista sentindo aquela dor no peito outra vez, ela poderia jurar ter visto na estação de Curitiba, o seu querido filho Alfred, o que a fez quase descer e ir perguntar aquele jovem que carregava melas na estação se não era ele o seu filho perdido, ato que foi repudiado por seu marido quando olhou o para o rapaz e não viu nenhuma semelhança com Alfred como dizia Tina.
A alegria proporcionada pela encantadora residência alugada para a família pelo banco em São Paulo amenizou um pouco a dor de Tina que, entre o trabalho de acomodar a todos e de uma novidade em sua vida de dona de casa: Tina agora tinha uma empregada e um jardineiro para auxiliá-la nos trabalhos domésticos.
O pequeno Luis e a linda Doriz estavam maravilhados com a imensa casa que vivia agora e os jardins era tão grande que podiam passar o dia inteiro brincando neles sem serem notados. Tina adquiriu um carinho rapidamente por Elisa, a empregada que tinha sido contratada para servi-los na nova casa e o jardineiro era um polonês radicado no Brasil a poucos anos e Tina podia praticar seu polonês com ele, o que a deixava maravilhada por poder relembrar bons momentos do seu passado.
A vida corria em perfeita harmonia e Tina começou a acreditar que a paz lhe sorria outra vez, as vezes a noite, ela olhava para o céu, escolhia curiosamente sempre a mesma estrela e dizia:
_Querida estrela. Sei que você é o meu amado Vollman que agora cuida de mim ai de cima, exceto pela dor de ter perdido você e nosso pequeno Alfred, eu agora estou bem, obrigada por estar me ajudando, um dia quando eu for estar ao seu lado novamente, espero que você esteja com esse brilho lindo que está agora. Boa noite.
Quando Vargas assumiu a presidência novamente, Dionísio entrou em casa e disse que o Brasil estava entrando em um furacão novamente, Tina que não entendia bem a política do Brasil, achou que era uma brincadeira dos brasileiros e não deu conta de que o que Dionísio estava dizendo era que alguns homens acreditavam que o país iria entrar em uma ditadura outra vez.
Enquanto isso, em Curitiba, um alemão que havia engraxado sapatos, carregou malas na estação ferroviária e trabalhou como garçom em um restaurante, comprava uma loja de sapatos em sociedade com um judeu que havia desembarcado a poucos dias na Cidade dos Pinheiros. Era Alfred Daudt Vollmann que aos dezoito anos e com algum dinheiro guardado fez um acordo com o judeu Ernest Bauer. O judeu não podia ter negócios no Brasil porque ainda não era naturalizado e por isso chamou Alfred, a quem conheceu trabalhando junto com ele no restaurante, para abrirem um negócio. Alfred aceitou rapidamente e os dois inauguraram a “Sapataria Bom Pé”. Uma loja que iria crescer rapidamente.  
Dionísio ia a todo vapor, seus superiores o elogiavam após varias vitórias consecutivas e sempre que um dos dirigentes do banco se metia em encrencas pessoais, era a ele que recorriam por que sabiam de sua descrição e assim, ele foi galgando os mais altos postos no banco.
Tina era toda felicidade quando disse ao marido, durante o jantar, que ele seria pai e que ela estava muito contente com isso. Dionísio deu um grito de alegria, agarrou a esposa e os dois ficaram por horas trocando caricias, Dionísio encostava os ouvido na barriga de sua esposa na esperança vã de tentar ouvir o bebê que estava ali e assim os dias conturbados de 1954, se passavam por debaixo dos olhos de Tina e sua família. Tina estava com cinqüenta anos e a idade era algo preocupante.
Em agosto do mesmo ano, Tina deu a luz a um casal de gêmeas aquém deram os nomes de Luisa e Anna. A casa de Tina se encheu de alegria e todos comentavam o fato de ela em idade tão avançada ter sido mãe e ainda por cima de gêmeas.
No mesmo mês, o presidente da republica se suicidava na capital federal e todo o país se chocou com a morte de Getulio Dorneles Vargas.
No dia 1º de setembro de 1954, Dionísio esteve até tarde em uma reunião da diretoria do banco.

Um presságio


Tina acordou se sentindo mal naquela manha de setembro e pediu ao marido para que ficasse com ela, ela não estava bem e queria a sua companhia. Dionísio tinha marcado para aquele dia uma quantidade infindável de reuniões, o banco estava para fechar devido a problemas políticos e ele precisava agir rapidamente ou muitos estariam perdendo os seus trabalhos e os clientes seu dinheiro. Pela primeira vez negou um pedido de Tina deste tipo, ele sabia que o seu pedido era sério pela forma com que ela pediu. Tina não agia assim por brincadeira, porém o problema em que o banco estava metido era grande demais e todos confiavam nele para salvar o banco.
Ao descer para tomar seu café da manha, Tina torceu o tornozelo na escada e foi socorrida por Elisa que chamou o jardineiro para auxiliá-la a levar a patroa para seus aposentos. Pethcowick, o polonês, entra na sala e carrega Tina até o quarto dela e após acomodá-la em sua cama, se vira para a patroa e diz:
_Patroa. Em minha cidade natal eu um dia conheci uma senhora muito boa e que foi embora para Praga, eu quando vi a senhora, me lembrei dela e do que ela sempre dizia: As coisas nunca duram o tempo que queremos e nunca queremos o tempo que elas duram. Eu ainda consigo ouvir o som de Dona Sophie dizendo isso.
_Sophie. Você disse Sophie, Pethcowick? Perguntou Tina ao jardineiro.
_Sim Senhora. Sophie Mallmann. Ela e seu marido foram para Praga e eu nunca mais os vi, nos freqüentávamos a mesma sinagoga e algum tempo depois veio à guerra, os campos de concentração, eu acho que o louco alemão deve ter matado eles, mas eu peço a Deus que eles tenha saído da Europa e que estejam por ai em algum lugar deste mundo.
Tina estava aos prantos enquanto Pethcowick narrava essa história e Elisa pediu para que ele se retirasse.
Elisa tentou acalmar a sua patroa sem compreender o por que de tanto choro.
Tina pediu para ficar só e Elisa a atendeu rapidamente. Quando Elisa passou pela porta do quarto e a fechou, Tina sentiu alguém ao seu lado como que a acariciar a sua cabeça como Vollman fazia nas noites em que ficava até tarde em suas reuniões em Berlim, ao mesmo tempo ela ouvia uma voz a lhe dizer: Não tenha medo, eu estou do seu lado.- Tina estava assustada, mas acabou adormecendo.
Despertou-se próximo à hora do almoço e não dando atenção ao tornozelo torcido pela manha, ela segue até a porta e chega até as escadas, mas fica com medo e pede ajuda a Elisa para descer.
Sentada no sofá da sala de estar, ela pede a Elisa para que chame o jardineiro.
Pethcowick entra na sala e olha para a sua patroa e diz.
_Mandou me chamar, patroa?
_Sim, Pethcowick. Eu gostaria que me detalhasse mais a respeito da história que me contou lá em meu quarto hoje pela manhã.
_Senhora, me desculpe por ter atormentado a senhora com essa história, eu não irei perturbá-la outra vez com isso.
_Não, eu quero que me conte tudo, Pethcowick. Em todos os detalhes, por favor.
E ouvindo a patroa falar como se estivesse dando uma ordem, Pethcowick se senta e começa a contar toda a historia outra vez e desta vez Tina segura as lagrimas ao ouvir o jardineiro contar sobre seus pais sem saber quem era ela.
Ao terminar de contar a história ricamente ilustrada com detalhes como datas, nomes e o que mais tocou Tina ao ouvir a história, o nome de sua mãe, Sophie Mallmann.
Por um momento, Tina voltou a Dantzig. Lembrou-se da suas ruas, de suas casas, do sino da igreja católica próxima a sua casa e do porto onde sempre sua mãe ia levar comida para o seu pai que muitas vezes, não podia parar de trabalhar para ir em casa almoçar e então, em meio a estas lembranças, ela recordou que um dia ela viu a sua mãe chorando e que ela pronunciou a mesma frase dita por Pethcowick ainda em seu quarto e então ela disse:
_A vida não é como o rio que as águas vão e não voltam mais. A vida e como o mar onde a maré ora é cheia, ora ela é baixa, tem dias em que os pesqueiros vêm quase afundando de tanto peixe, tem dias que eles voltam como zarparam.
Pethcowick deu um salto do assento, olhando fixamente para a sua patroa, ele perguntou:
_Como à senhora sabe desta historia, eu não disse a frase toda?
Tina levantou-se, pegou a mão do polonês e lhe disse:
_Caro Pethcowick. Sophie Mallmann era casada com Johan Mallmann, eles eram os meus pais e eles em 1920, morreram durante a peste que se abateu sobre Praga. Eu casei-me com um alemão a que eu nunca, em toda a minha vida deixei de amar e seguiu relatando a história ao polonês.
Após algum tempo, Tina estava mais tranqüila apesar de ainda sentir o mal estar que sentia desde aquela manhã. Deu inicio aos preparativos para o jantar e tentou relaxar um pouco afinal, ela estava tendo uma vida boa e era amada por Dionísio, o que poderia acontecer de ruim?

Pela segunda vez

 
Dionísio estava muito atrasado naquele dia, reuniões sucessivas consumiam todo tempo daquele advogado, incumbido em achar meios legais para que o banco não tivesse que fechar as suas portas por motivos meramente políticos entre a diretoria daquela instituição financeira e o governo federal.
Já passava das dez horas da noite e ele ainda não havia chegado para jantar, Tina estava mais preocupada a cada segundo.
Um carro chega a casa e o polonês corre até o portão para atender ao veiculo, que insistentemente tocava a buzina a entrada daquela casa e devido ao avançado das horas, isto não era nada normal.
Pethcowich volta caminhando vagarosamente para a casa e chama a empregada Elisa.
Ao chegar ele conta a Elisa a notícia que recebeu daquele veiculo que havia estado ali a poucos minutos e Elisa se Poe a chorar, pensando em como dizer a sua patroa que o patrão havia sido metralhado ao sair do Banco Econômico no centro de São Paulo.
Tina estava no alto da escada, esperando que alguém lhe comunicasse quem é que estava buzinando diante da porta de sua casa àquela hora?
Elisa, aos prantos, apareceu diante de sua patroa e a olhou com seus olhos cheios d’água, dizendo:
_Houve um acidente diante a sede do banco em que seu marido trabalha senhora. Ele, ele foi...
_Conte logo Elisa. Conte-me o que aconteceu ao meu marido!
 _Ele, ele... – Elisa engoliu a seco e terminou a frase - foi assassinado.
Tina sentiu aquelas palavras ecoarem pela casa desmaiou.

Sonhos & Pesadelos


No dia seguinte pela manhã, um oficial da policia foi até a casa de Albertina para pedir comunica-la do acontecido e pedir para que um membro da família reconhecesse o corpo de Dionísio. O oficial se espantou ao saber que a família não só já sabia como estavam se preparando para irem delegacia e assim ele e Albertina foram até o necrotério.
 Após o reconhecimento, o corpo foi liberado para que a família efetuasse o enterro. O banco, mesmo com a morte de seu principal advogado, conseguiu livrar-se dos problemas que enfrentavam, e a diretoria ofereceu todo o amparo necessário para que ela e sua família não tivessem nenhum problema durante estes dias tumultuados que estavam passando.
Dionísio foi sepultado na manhã do dia seguinte.
Tina decidiu reunir seus filhos e expor a eles a situação e decidirem juntos o que e como fazer. A idéia era um pouco estranha para os padrões daqueles dias e para piorar a situação, as crianças eram muito jovens e Tina sentia falta de Alfred nesta hora.
Sentados na sala, todos os integrantes da família:
Albertina Daudt Vollmann de Oliveira, com seus cinqüenta anos; Doriz daudt Vollmann com quase quinze anos; Luis Daudt Vollmann com apenas onze anos além de Elisa e o polonês Pethcoiwck.
Tina olhou para seus filhos e contou o que havia acontecido com Dionísio e disse que eles estavam ali reunidos para decidirem o que iriam fazer, sem Dionísio, eles não poderiam mais viver a vida de luxo que eles estavam levando até aquele dia, eles não poderiam viver naquela bela residência, teriam que demitir o jardineiro e não poderiam manter Elisa como empregada.
Elisa e o polonês se olharam e estavam pensando em como poderiam ajudar aquela família que deu a eles tanto carinho e que um incidente trágico estava enviando todos a um mar de tristeza e dor.
Tina seguiu falando sobre o que estava por acontecer e ela disse ainda que a única solução que ela tinha para eles seria voltarem para Porto Alegre e lá, na velha casa do Partenom.
Os filhos olharam para Tina e como forma de apoio a sua mãe, correram até ela e a abraçaram e então disseram que ela poderia contar com a ajuda deles para o que fosse necessário.
Em meio a esta reunião, toca o telefone da sala e Elisa atende, era um dos diretores do banco e pede para falar com a senhora Albertina.
_Sim. Responde Tina, já ao telefone.
_Aqui quem fala é João de Medeiros e Albuquerque, senhora Albertina. Eu sou diretor do Banco Econômico e gostaria de em nome do banco lhe oferecer uma ajuda para que a senhora e os seus não tenham dificuldades nesta vida, seu esposo foi fundamental para nosso banco e temos uma enorme divida de gratidão para com ele e nesse caso, com a senhora.
Tina ouvindo o diretor não conteve suas lagrimas e aceitou a ajuda do banco.
Ao desligar o telefone, Tina deu a notícia aos seus filhos e todos perceberam que Tina ainda triste mostrava agora um pouco mais de paz em meio à revolução que estavam todos ali.
No dia seguinte, Tina foi ao banco como haviam combinado pelo telefone e ao ser recebida por um senhor muito bem trajado, alto e magro que a recebeu muito bem, ela ficou sabendo que aquele senhor era o proprietário do banco, o senhor com quem ela havia falado ao telefone, o Sr. João de Medeiros e Albuquerque.
Na sala junto ao Sr. Medeiros, estavam homens como o Conde Matarazzo e Seabra Fagundes, este último, era o atual ministro da justiça.
Tina sentiu-se mal em meio aos presentes ali e sua face ruborizou quando o Conde Matarazzo levantou-se e veio cumprimentá-la. Ela sabia que eles deviam respeito ao seu marido, mas isso não se justificava para tanto e ela era alemã, ainda preservava um pouco do orgulho germânico para ela, ela estava ali recebendo uma esmola, mas que ela aceitava para o bem de seus filhos porque ela sabia que com seus cinqüenta anos não poderia dar a eles nada além de um prato de feijão e um quarto sem conforto para dormir.
Ofereceram a Tina um local para sentar-se e o Sr. Medeiros tomando a palavra, diz a Tina:
_Cara senhora, seu marido muito nos ajudou e devemos muito a ele; depois do ocorrido, soubemos por meio de alguns funcionários que ele, durante o período em que esteve a serviço do Banco, em uma cidade chamada Petrópolis, na região serrana do Estado do Rio de Janeiro. Ele voltou falando que era a cidade dos seus sonhos e que se um dia o banco o enviasse para lá, que ele iria adorar. Pois bem, o banco adquiriu algumas propriedades nesta cidade, mas já não temos mais interesse em expandir nossos negócios até aquela cidade e por isso estamos transferindo para a senhora a escritura de três residências e dois terrenos, estes lhe servirão para levantar algum dinheiro com a sua venda e as casas, nos acreditamos que se a senhora alugar, a senhora terá uma boa renda, o que acha?
Tina não sabia o que dizer era mais do que ela esperava e com lagrimas em seus olhos, olhou para o Sr. Medeiros e disse:
_Senhores. Eu não esperava tanto e para ser franca, eu não sei se mereço, porém eu os agradeço. Muito obrigada por tudo.
E assim Tina recebe uma pequena fortuna outra vez. Quando chega em casa, ela diz a todos o que havia acontecido em sua visita ao banco e seus filhos ficaram contentes com as boas novas da mãe, ficaram felizes e decidiram que iriam mudar para esta nova cidade: Petrópolis.


De volta a Alemanha


Tina preparou todos para a viagem e Elisa e o polonês se ofereceram para virem junto com ela e ajuda-la no que fosse preciso, ela não teria que paga-los por isso, eles iriam trabalhar e assim que tivessem estabilizados, Tina apenas emprestaria uma casa para eles morarem até conseguirem um emprego. Tina que sabia o quanto é difícil estar em uma cidade sem que conheça ninguém e por isso aceitou a proposta e assim embarcaram todos, rumo a Capital do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro.
Eles chegaram pela manhã na capital federal e ainda na estação, Tina se lembrou daquele 1º de Janeiro, quando ela desembarcava no porto e teve uma grande vontade de regressar a Alemanha.
Ela pediu para que Pethcowick corresse a comprar as passagens para a tal cidade do interior onde Dionísio queria viver e assim embarcaram na composição rumo a Petrópolis.
Quando a composição ia se aproximando da serra chamada de “Serra da Estrela”, Tina achou estranha a relação deste nome com a sua estrela. A bela paisagem que os cercavam, fez com que eles ficassem maravilhados com a vista e em especial Tina, que sentia como quem estivesse realmente voltado para a Alemanha.
Ficaram maravilhados com a beleza daquela cidade que estava os recebendo e Tina percebia uma semelhança com as cidades alemãs, as casas, as ruas e ate o povo falava com sotaque alemão. Tina sentia que tudo parecia um sonho e que em breve ela iria acordar, não era possível tanta semelhança.
Tomaram um carro de aluguel para levarem as suas coisas para o endereço que Tina havia escolhido na pequena lista que ela havia recebido ainda em São Paulo, das mãos do Sr. Medeiros.
Rua Pedro Ivo nº 55, no Bairro Morin, este nome vibrava dentro de sua cabeça e quando o carro seguiu rumo ao endereço, Tina olhando as casas e tudo o mais, ficava cada vez mais encantada com aquilo tudo.
Depois de uns minutos, chegaram ao endereço e todos adoraram a residência nova, era simples, mas bonita, uma casa de duas águas, pintada de branco com as janelas e portas em azul, ao entrar viram o assoalho em pinho de riga e uma casa com os cômodos muitos bem divididos, Tina novamente estava feliz.
A vida começava de novo para Tina e os seus.

Petrópolis, uma cidade imperial.


Em pouco tempo, desta vez, muito mais rápida do que em outras cidades onde esteve, Tina já estava se sentindo como se estivesse ali a muito tempo, sabia os nomes das ruas e dos bairros, era comum ela encontrar com alguém na rua e começar a conversar e em um minuto já havia algo em comum entre elas, hora era um sobrenome que fazia Tina se lembrar de alguém na Europa, hora era uma rua que em tal cidade havia uma igual e assim por adiante.
Aquela pequena cidade construída entre vales tinha sido fundada por D. Pedro II, ultimo imperador do Brasil e as suas ruas e avenidas receberam o seu trajeto das mãos de um alemão chamado Julio Frederico Koeler, Tina ainda não sabia disto, mas os traços da cultura alemã a faziam bem.
Albertina um dia saiu com os filhos e o polonês, para verem os demais terrenos que Tina recebera do banco. Um em especial, Tina não gostou, era em um bairro distante do centro e muito feio segundo ela e eles decidiram que seria o primeiro a ser vendido. Esse terreno era no bairro de cascatinha e em um morro que não agradou em nada a aquela família.
Doriz conheceu um rapaz, de origem alemã, Pedro Hingel e começaram a flertar, Tina só descobriria esse namoro alguns meses depois.
Tina estava eufórica quando conseguiu matricular seus queridos filhos no colégio Kopke, doriz se formaria neste colégio já Luis não teria a mesma sorte.
Os anos se mostraram prósperos para Tina e sua família. Elisa conseguiu um emprego em um hotel da cidade, o Grande Hotel, no centro da cidade e Pethcowick, agora trabalhava em um orquidário de nome “Binnot”.
Albertina vendeu alguns terrenos e o dinheiro arrecadado, ela decidiu que iria depositar em uma casa bancaria, seu Dionísio a fez confiar nestas casas.
Em junho de 1959, Tina leva todo o dinheiro que tinha para abrir uma conta em um banco no centro de Petrópolis, o Banco Fluminense.
Ao entrar no banco, ela foi recebida por um homem de aproximadamente uns cinqüenta anos e que a recebeu muito bem, conduziu Tina até a sua mesa e então abriu para ela uma conta bancária, a primeira conta de Tina e ela ficou feliz ao assinar seu nome nos papeis referentes à conta e então acontece um caso que faz Tina se emocionar. A entregar seus documentos para o Sr. que a estava atendendo, este percebeu que o seu nome era de origens judia e a perguntou:
_A senhora é judia?
_Sim, eu sou judia. – Tina pela primeira vez em sua vida, assumia em público as suas origens.
_Mas como o senhor soube? Perguntou Tina.
_É que pelo seu sobrenome, Vollmann com dois “n” no final, é judeu não?
E assim Tina percebeu que Deus, por meio de um erro de um oficial alfandegário, quando chegou ao Brasil, havia transformado seu querido Theobald também em um judeu.
Tina sorriu e foi para casa muito emocionada com o que só agora ela foi perceber que ela estava vivendo com um nome judeu durante todo esse tempo, mas ela estava tão acostumada a esconder a sua origem que ao chegar no Brasil, continuo ocultando este detalhe de sua vida.
Havia um jornal em alemão, que ainda circulava em Petrópolis e Tina era uma de suas assinantes, ela adorava ler nas manhãs de domingo o “Bauerzeitung” e uma edição no mês de novembro mostrava a Tina um outro lado de Petrópolis, a manchete do jornal dizia:
_ O Presidente da República não irá passar o verão em Petrópolis este ano!
No dia 25 de agosto de 1961, o então presidente Jânio da Silva Quadro renuncia a presidência do Brasil e as coisas esquentam em Brasília, o vice, João Goulart estava fora do país e por isso, assume a presidência do Brasil, o Sr. Ranieri Mazzilli.
Tina então após ler a notícia, descobriu que era aqui que os presidentes do Brasil passavam os seus verões, ela então lembrou de que um dia, a muitos anos, seu querido Theobald disse algo sobre essa cidade em casa certa vez quando estavam conversando sobre as olimpíadas e ela puxou mais a memória e então lembrou-se de um senhor de nome: Eduardo Hingel, este senhor havia ido a Alemanha acompanhando a comitiva do Brasil as olimpíadas para servir de interprete da comitiva e ele apesar de não ser alemão, dominava o idioma muito bem. Tina decidiu procura-lo.
Tina então decidiu entrar em contato com o editor do jornal Bauerzeitung, Humberto Sixel, e este a recebeu na redação, Tina ficou impressionada com o alemão daquele rapaz de pouco mais de trinta anos. Ela lhe contou toda a sua história e o rapaz se comoveu, o rapaz disse a Albertina que iria ajudá-la e lhe disse também que desde os anos quarenta, com a perda da guerra pela Alemanha, muitas pessoas deixaram de falar alemão abertamente e ate dentro de suas casas, exceto os mais antigos mantinham a tradição que vinha desde os tempos do Brasil Império.
Humberto realmente se dedica a ajudar a Albertina a encontrar o Sr. Ricardo Hingel, o sobrenome era muito conhecido, mas ele não conhecia nenhum Ricardo. Ele deu inicio as buscas com anúncios no jornal.
Tina levou a vida como estava acostumada e um dia foi visitar Elisa, que a recebeu muito bem e as duas fizeram como de costume, sentaram a sala e se debulharam em contos e mais contos, em uma atitude que muitos chamavam de “fofocas”.
Doriz, um dia pela manhã, virou-se para a sua mãe e lhe perguntou se ela podia ter um namorado, Tina que não era tão rígida assim, deu permissão para que ela tivesse um flerte com um rapaz. Tina disse que queria conhecer o rapaz, que ele viesse falar com ela. Doriz disse que falaria com ele e assim o fez.
Era o mês de dezembro e Tina começava os preparativos para o natal e derrepente tem uma agradável surpresa. Humberto, que agora era um freqüentador da casa de Albertina, chegou com um senhor ao seu lado e disse:
_Senhora Albertina. Quero que conheça o senhor Eduardo Hingel. Tina olha para aquele senhor e o passado gira como cenas de um filme em sua cabeça. Ela começa a fazer perguntas para aquele senhor que as responde e lhe dá detalhes, ele havia estado em sua pequena casa no vilarejo de Ile. Tina e o senhor Eduardo ficaram por horas conversando sobre aquela época.
Em meio a todas as alegrias, Tina percebe outro erro cometido por aquele oficial da imigração.

Verdes dias


Em um dos primeiros dias de dezembro de 1961, Luis Daudt Vollmann entra em sua casa no Morin e sua mãe deixa cair um vaso de flores que estava segurando ao ver o seu menino, o seu amado e querido Luis, vestido em um uniforme de soldado do exercito brasileiro. Tina, ao se dar conta de que o filho estava fardado, começou a chorar e disse ao seu querido Luis:
_Meu filho. Que você está fazendo neste uniforme meu filho? Tire esta farda, por favor.
_Minha mãe. Eu me alistei no exercito, quero ser como meu pai, um soldado!
_Não. Pelo amor de Deus não, eu não agüentarei perder outro ser que amo tanto...
E Tina começou a chorar, Luis não aceitou o pedido da mãe e foi para seu quarto.
Albertina ficou doente e todos acharam que a culpa era de Luis, por ter entrado para o exercito. Tina revirou seus documentos e descobriu que o oficial da alfândega havia feito um novo registro para Luis como se ele tivesse nascido em mar territorial brasileiro e assim, ele era brasileiro e com um ano a menos, seu físico era de por inveja já que na verdade ele teria dezenove e não dezoito anos como constava em seus documentos.
Inaugurou uma nova mercearia naquela época e Tina foi ate ela para ver as novidades, em uma seção de enlatados, ela vê o seu sobrenome em uma lata de figos em caldas e ela passa mal, cai no chão e os funcionários do estabelecimento chamam uma ambulância que a leva para o hospital da cidade, o Hospital Santa Teresa.
Luis ao saber que sua mãe estava internada, pede licença no quartel e corre para o hospital a fim de ver a sua mãe, ao entrar no dormitório em que Albertina estava, ela abre os olhos, olha para Doriz e seu namorado, Elisa também estava ali e enfim, olhando para Luis diz:
_Eu o encontrei, eu encontrei Alfred. E dizendo isso, uma lagrima correu pelo seu rosto.
_Como mamãe? Como foi que a senhora... Dizia Doriz quando foi cortada por Luis.
_Onde ele está mamãe? Diga que eu vou buscá-lo agora mesmo.Diga?
E Albertina ainda com lagrimas no rosto, relatou como descobriu o paradeiro de seu filho mais velho.
Luis voltou imediatamente para o quartel e pediu para falar com seu comandante, seguindo a hierarquia militar, teve que convencer a vários superiores a ele ate conseguir chegar ao comandante e então ele relata toda a trajetória de sua família para tentar conseguir que fosse permitida a ele uma licença para ele viajar até o Rio Grande do Sul.
O comandante comoveu-se com a história de Albertina e permitiu que Luis se ausentasse do quartel por dois meses. Ainda à tarde, Luis viajou para o Rio de Janeiro e de lá partiria para Porto Alegre.
Albertina melhorou e foi para casa, Anna não saia de perto dela, o dia todo estava aninhada nos braços de sua mãe. Doriz aproveitou o momento de recuperação de sua mãe para adiantar as coisas, ela queria se casar com Pedro o mais rapidamente.
Aquele natal seria inesquecível para a sua mãe, pensava Luis. Ele queria chegar rápido ao Rio Grande e trazer seu irmão o mais rápido possível para casa. Ela já havia tido decepções por demais, era hora de ter alguma coisa de bom na vida outra vez.
Doriz e sua irmã Luisa foram à mercearia para agradecer as pessoas que ajudaram a sua mãe e pediram para ver onde ela havia caído, eles mostraram as duas o local e elas também se surpreenderam ao verem as latas de figos “Vollmann”. Elas compraram algumas latas e as levaram para casa, ao chegarem levaram uma para a sua mãe, acreditando que isto iria fazer a mãe se sentir melhor, uma vez que aquela lata demonstrava claramente que Alfred estava bem e que havia subido na vida e que agora era só uma questão de tempo até ele vir a Petrópolis e, aliás, isto já estava sendo providenciado afinal, Luis estava viajando neste momento para ir buscá-lo.
Albertina estava para chegar ao auge da emoção e seus filhos estavam contribuindo para isso.
Luis chegou a Porto Alegre e com a ajuda do comandante do 1º Batalhão de Caçadores, batalhão em que era lotado, ele conseguiu transporte para a cidade de Pelotas em um vôo da Forca Aérea Nacional e ele então no dia 14 de dezembro, depois de dezessete anos longe de seu irmão, Luis Daudt Vollmann aterrissa em Pelotas.
_Senhor. Há um soldado do exercito querendo falar com o Sr., ele diz que é seu irmão. Disse a secretária a um homem grosso e ríspido sentado atrás de uma mesa em sua sala de onde administrava a sua empresa, uma fabrica de enlatados que crescia a cada ano.
-Quem? Pergunta Alfred Daudt Vollmann.
O militar Luis, ele tinha herdado de seu pai o ímpeto pela vitória e não esperou o retorno da secretária, abrindo a porta que o separava de tudo que era mais precioso para ele e sua família, a união de todos outra vez. Ao entrar na sala, Luis viu um homem que por um minuto parecia ser seu pai, apesar de ele não lembrar do pai ainda com vida, sua mãe tinha uma verdadeira coleção de fotografias de Theobald Vollman e era seu pai, como diziam no século XIX, esculpido em carrára.
Alfred levantou-se de sua cadeira e foi ao encontro do irmão, os dois se abraçaram e choraram assim por alguns minutos. Luis, tremendo disse ao irmão que a sua mãe o esperava e não sabia se ela teria muito tempo, ele precisava ir vê-la imediatamente.

Natal de 1961


Albertina despertou naqueles 24 de dezembro com as emoções a flor da pele. Tudo estava bom e ruim, ela não conseguia relaxar e tudo estava confuso. Ela não queria admitir, mas ela não acreditava mais que iria ver seu querido Alfred neste natal. Não seria desta vez que ela veria sua família reunida neste dia tão importante para ela, afinal, seu amado Theobald adorava o natal e ela comemorava o natal em sua homenagem. Ela queria tanto que era para ela, era o motivo de uma vida, ter seu filho junto a ela outra vez.
Luis estava vindo, mas, em seu telegrama, enviado de Porto Alegre, ele não disse se Alfred estava vindo com ele e suas irmãs e sua mãe ficaram variando entre a hipótese de Alfred não querer vir com ele, ele poderia não tê-lo encontrado, estar viajando ou quem sabe não era ele e sim um homônimo. Eram muitas as possibilidades contra apenas uma, a de ele estar vindo junto com Luis e este ter se esquecido de dizer em meio à emoção de ter encontrado o irmão.
A hora do almoço chegou, mas Tina não quis fazer a refeição, colocou a culpa em um delicioso peru que havia preparado para a ceia, ela dizia que queria se guardar para a ceia e as filhas, apesar de não acreditarem, aceitaram as desculpas da mãe e também não almoçaram. Tudo devido ao frio que tinha na barriga com a emoção a flor da pele a espera do irmão, do filho tão amado de Tina.
Eram seis horas da tarde, o ultimo trem já havia chegado à cidade e eles não chegaram, não teriam como chegar à hora para a ceia, Tina por dentro já chorava, evitava que as lagrimas corressem para que as filhas não sofressem. Eram sete horas quando a dona da casa sentou-se à mesa e disse as filhas para manterem a tradição e darem inicio a ceia. Elas estavam ainda tristes pela falta não de um, mas agora de dois dos seus e a tristeza aumentou quando Luisa, obedecendo às ordens da mãe, faz uma oração e pede a Deus que traga os seus irmãos para o natal, que ela não queria comer aquele peru sem seu querido irmão Luis ao seu lado. O que seria engraçado ouvir, vindo de uma menina de apenas sete anos, foi na verdade trágico e todos se puseram a chorar. Elisa que estava à mesa com a família também se emocionou e começou a chorar, apenas Pethcowick ouviu um barulho estranho, parecia o motor de um automóvel vindo da frente daquela humilde casa no bairro Morin e ele foi até a porta para ver o que era.
Quando entraram na sala e vira aquela cena, todas ao redor da mesa chorando, Luis correu para a sua mãe e disse:
_Olhe mãe, olhe. É seu filho mãe, seu filho Alfred!
Tina ao olhar para a porta da sala e ver ali o motivo de todas as suas orações, não resistiu e desmaiou. Foi socorrida por Alfred que não a deixou cair e segurando-a em seus braços, levou a mãe até o sofá da sala e após alguns minutos ela recuperou os sentidos e olhando para Alfred, de quem não tirava o olho, apenas dizia retidas vezes:
_Meu filho amado, eu nunca deixei de te amar meu filho, meu filho.
Assim o natal de 1961 passou com a ceia posta a mesa e a família sentada no sofá da sala em companhia do melhor presente que eles poderiam receber, o irmão, o filho. Alfred Daudt Vollmann.
A oração de Luisa havia sido atendida por Deus, Tina sentia isso.

Luiz Antonio Daudt Vollman


O que estaria por vir?


Em meio a segunda guerra mundial, nasceu o menino de pouco mais de quatro quilos, ele recebeu o nome do avô de sua mãe, Albertina Vollman. Não pode aproveitar do prazer que era ser filho do querido Theobald como seu irmão Alfred e sua irmã, Doriz. Ainda bebê, ele saiu da Alemanha antes que o seu país natal caísse em mãos do inimigo, o maior medo de seu pai.
Sua vida seria cheia de pedras no caminho.
Ao desembarcar na cidade do Rio de Janeiro em 1945, ainda no colo de sua mãe, sua história de vida sofre uma profunda interferência do oficial da imigração, este oficial havia sido comunicado que um bebê havia nascido a bordo do navio e este oficial, sem saber falar alemão, ao ver aquela criança no colo de Tina, dá a ele uma certidão de nascimento como se ele tivesse nascido em águas brasileiras. O oficial e nem ninguém ali, poderia suspeitar que a mulher que deu a luz a um bebê a bordo do navio, teve seu filho jogado ao mar pelo próprio marido, ele tinha medo de não poderem entrar com recém nascidos no país.
Assim Luis tornou-se o primeiro brasileiro da família Vollman. Quando viviam em São Paulo ele ainda era muito novo para aproveitar do conforto em que a família vivia na capital paulista e ao chegar em Petrópolis, sua mãe o colocou para estudar no colégio Kopke, este colégio fechou no primeiro ano de Luis na instituição, ele foi para o colégio Petrópolis e lá fez o 1º e 2º colegial até parar de estudar e entrar para o exercito brasileiro.
Ao entrar em casa, fardado com o uniforme do 1º Batalhão de Caçadores, sua mãe quase teve um ataque do coração e insistiu diversas vezes com o filho, chegando mesmo a ficar doente de tristeza por ver o filho seguindo os caminhos do pai.
Quando soube que sua mãe havia sido internada, Luis foi imediatamente ao oficial do dia e contou-lhe o que estava acontecendo e ele foi liberado para ir ao hospital para vê-la. Ao entrar naquele quarto de hospital, ele sentiu uma dor tão forte em seu peito, perecia que seu coração iria explodir e então perguntou a mãe o que havia acontecido. Quando sua mãe terminou de relatar o ocorrido, como ela havia descoberto o paradeiro do irmão que ele tanto amava e que a muito sentia a falta dele, no mesmo momento prometeu a sua mãe e a ele mesmo que iria atrás de Alfred e que o traria outra vez para perto dela.
De volta ao quartel, Luis teve que pedir permissão para falar com o comandante do batalhão e para isso, ele comoveu todo o batalhão com a história de sua família e o resultado foi que o comandante não só deu a licença que ele precisava como o ajudou em sua viagem ao Rio Grande do Sul em busca do filho mais velho de Tina.
Quando encontrou Alfred, este imediatamente o reconheceu e os dois choraram juntos por alguns instantes até Luis olhar nos olhos do seu irmão e começar a contar tudo o que estava acontecendo com sua mãe e suas irmãs.
Alfred aceitou ir a Petrópolis com seu irmão, mas antes ele tinha que honrar alguns compromissos e por isso, eles só poderiam viajar na tarde do dia seguinte.
Naquele dia, Luis foi hospedado na casa de Alfred e conheceu a sua família, Luis era tio de duas lindas meninas, Andréia e Sonia, ele não havia seguido a tradição da família de dar os nomes dos avós aos filhos e Luis percebeu isto ao ouvir o nome das meninas. Maria Teresa, esposa de Alfred o recebeu com um pouco de receio, ela na verdade não gostou muito da idéia de Alfred passar o natal longe dela e das crianças.
Na tarde do dia seguinte, como haviam combinado, Alfred e Luis viajaram no trem noturno para o Rio de Janeiro, mas, eles chegaram tarde na estação da Central do Brasil, no rio de Janeiro e perderam o ultimo trem para Petrópolis, agora só no dia seguinte. Como era véspera de natal e Luis havia prometido a sua mãe que traria Alfred para a ceia ele ficou parado por alguns instantes e então teve uma idéia que para ele, era genial.
A sede do comando militar do leste estava sendo instalado no antigo prédio do ministério do exercito, o Palácio Duque de Caxias, bem ao lado da Central do Brasil, Luis foi ate a entrada do palácio, se identificou, disse que estava em uma missão especial sob o comando do 1º BC (Batalhão de Caçadores), o BC era quem fazia a guarda presidencial e vez por outra estavam seus soldados metidos em missões das mais absurdas possíveis e o guarda atendendo ao pedido de Luis, telefona para o comando e um oficial vem falar com ele. Ao chegar, Luis diz para o tenente que estava a sua frente que precisava urgente de transporte até Petrópolis, o Sr. que estava com ele era esperado pelo comandante do batalhão e que ouve um atraso no trem e agora eles não tinham como subir a serra. O tenente estava em serviço naquela noite e não estava muito satisfeito com isso e tudo o que ele não queria era problemas com algum superior metido a besta e que iria querer atrapalhar a sua carreira por causa de um jipe, e assim, ele providenciou um veiculo para levar os dois até Petrópolis. Luis disse ao motorista que subisse pela serra velha, por que assim, eles iriam chegar mais rápido a Petrópolis, quando chegaram ao bairro Alto da Serra, dispensaram o soldado com o jipe alegando que iriam à casa do comandante e que era próximo dali, o soldado os deixou na porta da casa de Luis sem saber e quando chegaram a porta da casa, o polonês estava abrindo-a, ele havia ouvido um barulho estranho de motor e fora verificar. Assim os dois entraram e encontraram toda a família chorando ao redor da mesa, quando Tina levanta-se para ir abraçar o seu filho mais velho e a emoção era tão forte que ela perde os sentidos por alguns segundos sendo segura por Alfred que a ampara e a leva para o sofá da sala. Ao voltar a si e constatar que não era um sonho, que seu querido filho estava ali; Albertina envolta pela felicidade de estar vendo o Alfred outra vez como a muito desejava, ela esquece de agradecer a Luis que sem que ninguém perceba, vai para seu quarto e deitado em sua cama, ele acaba dormindo sem que ninguém de por sua falta.

Meu irmão, Alfred.


Alfred Daudt Vollmann, era o filho mais velho de Albertina e ele, amava muito seu pai e lembrava-se do carinho com que Theobald, quando chegava do trabalho, ia até ele lhe dar um beijo e às vezes, até mesmo, brincar um pouco.
Quando Dionísio começou a freqüentar a sua casa, ele não gostou muito e começou a imaginar o que estava para acontecer. Ele começou a planeja o que ele faria se a sua mãe decidisse casar-se outra vez, ele a amava muito também e se fosse uma decisão dela, ele não iria ser contra, mas também não seria a favor e por isso, ele começou a guardar um pouco do dinheiro que ganhava em sua latinha outra vez.
Quando naquele fatídico domingo ouviu Dionísio falando que iria casar-se com Tina ele não pensou duas vezes, saiu sem olhar para os lados e executou com sucesso o plano que ele havia elaborado. Foi para Curitiba, onde começou trabalhando de engraxate e alguns meses depois, ele conseguiu uma vaga para carregador de malas da estação ferroviária e com um salário melhor, carregando malas ele ganhava uma caixinha mais gorda, ele dizia, ele seguiu guardando um pouco do seu dinheiro, usando apenas o necessário para viver e às vezes um ou outro sorvete aos domingos quando ele ia passear, mas era difícil dele fazer isto. Já aos dezessete anos conseguiu uma vaga de garçom e trabalhando em um restaurante da estação, ele conheceu um judeu por nome Abravanel, os dois pensavam em abrir um negocio e Alfred gostava desta idéia. No ano seguinte eles abriam uma sapataria, a “Sapataria Bom Pé”, seguindo o mesmo padrão de sempre, fazendo a economia que ele estava acostumado, eles logo abriram uma filial, e depois mais uma ate que chegaram a uma rede de sapatarias que iam de São Paulo a Porto Alegre. Certo dia na capital dos pampas, Alfred soube que uma indústria de enlatados na cidade de Pelotas estava em dificuldades financeiras e estava sendo vendida por uma ninharia. Ele ficou louco com a idéia de tornar-se um industrial e em Curitiba, discutiu o assunto com seu sócio, Abravanel fez uma proposta a Alfred, ele compraria a parte do alemão na rede de sapatarias e assim Alfred teria o dinheiro necessário para comprar a fabrica, proposta que foi aceita com muita alegria por Alfred.
Assim, depois de comprar a fabrica, fazer as mudanças necessárias para que ela viesse a dar lucro, os figos Vollmann foram para em uma imensa quantidade de mercados, armazéns, padarias e outros estabelecimentos comerciais, inclusive em Petrópolis, onde Albertina encontrou uma de suas latas e quase morreu do coração ao ler o nome do filho na embalagem.

Suéz, 1962.


_O conflito na região do canal de Suéz, tinha iniciado a alguns anos atrás e o mundo sabia que esse conflito iria durar muito tempo. Das longas reuniões, em que vários chefes de Estado e os representes dos países vitoriosos da 2ª guerra mundial, saíram algumas soluções e outros conflitos que iriam seguir abalando a paz no mundo; a criação do Estado de Israel é um exemplo claro dos problemas sem solução, criados no pós-guerra. Eles deram uma pátria aos judeus e os descendentes de Abraão comemoraram, mas quem ficou triste foram os palestinos que foram agora viver em “guetos” feitos por Israel que, aliás, eles aprenderam muito bem como construir um campo de concentração. Os territórios ocupados da Cisjordânia e cidades como Belém, sentiriam as mesmas dores que os judeus sentiram na Europa durante a guerra. Estas questões junto com os diferentes credos e o fanatismo religioso transformaram o oriente médio em um barril de pólvora e o ocidente tinha seus interesses na região. Havia ali o produto que o progresso do mundo e principalmente das nações ricas precisavam tanto: Petróleo. E o Brasil, recém industrializado também queria seu quinhão no bolo árabe, mas no século XX não se conquistava mais terras como se fazia antes, agora era tarefa da diplomacia pelos acordos diplomáticos ou pela soberania bélica quando faltava astúcia e discernimento aos enviados as mesas de negociação. Pensava Luis.
Ele estava corto e então foram enviados vários contingentes do exercito brasileiro ao canal, o 1º Batalhão de Caçadores estava na lista. Luis iria para a guerra!
Tina quando seu filho se despediu dizendo que iria para o Egito com as tropas brasileiras, teve um colapso e foi internada novamente no Hospital Santa Teresa. Desta vez, Luis não pode ir vê-la, apesar de o seu pequeno Luis agora ocupar o posto de cabo, ele não podia perder a hora, o comandante que o ajudou quando ele foi buscar seu irmão havia sido transferido para ou quartel e o atua não gostava daquele alemãozinho como lhe chamavam alguns oficiais.
No trem para o Rio de Janeiro, Luis recebeu a notícia de que o conflito estava pior a cada dia e que eles se preparassem para o combate, ao ouvir este comunicado Luis olhou para o céu e pediu a Deus que se ele não voltasse, que ele tivesse misericórdia de sua mãe e não a deixasse sofrer. O trem seguia pela serra rumo ao porto do Rio de Janeiro, Luis seguia com suas orações.
Dormiram uma noite no porto, a espera do navio que os levaria para o conflito e que estava atrasado, o navio zarpou do porto de Santos e teve problemas ainda na cidade paulista, Luis creia que isto era um mau presságio assim como os outros soldados.
Enfim aconteceu o embarque e Luis foi direto para o setor do navio determinado pelo oficial. O navio era um cargueiro e não havia acomodações para todo aquele contingente de homens, armas, veículos e o pequeno “Didi”, um mico leão, que um dos soldados estava levando como mascote da tropa e que era muito dócil e amado por todos, ele trazia por sobre a cabeça uma marca, algo parecido a uma estrela e que impressionava a todos pela forma daquela marca.
Não aconteceu muita coisa durante a travessia do Brasil até a áfrica e Luis estava mais confiante, o pressagio que ele acreditava sentir com o atraso do navio aos poucos havia sido esquecido e na ultima noite a bordo ouve até uma festa no convés com direito a dança e música produzida pelos atabaques, pandeiros, marácas e até um cavaquinho, que foram surgindo não se sabe de onde. Eles estariam mesmo indo para a guerra? Perguntou um oficial ao ouvir os soldados cantando e dançando.
Desembarcaram e ficaram alojados na cidade do Cairo, capital do Egito. Um contingente de soldados russo e indiano juntou-se a eles e iriam para a zona onde ocorria o litígio no dia seguinte.
Luis ficou deslumbrado com a rigidez e disciplina do exercito russo e rapidamente fez amizade com um dos soldados de Lênin, como eram chamados. Este soldado falava um pouco de alemão e a comunicação entre os dois era fácil e a cada dia aumentava mais. Josef Iancovic era sargento do exercito russo e mostrava ao seu novo amigo os armamentos russos de ultima geração, tudo deixava Luis maravilhado.
Já no território em conflito, Luis e mais três soldados faziam a ronda diária e a cada segundo eles temiam que um dos lados avançasse e que eles, que estavam ali apenas para manter a paz e não para combater, como disse o oficial ao ler a ordem do dia pela manhã. As tropas haviam sido enviadas sobre a bandeira das Nações Unidas e os “Capacetes Azuis” não deveriam efetuar disparos exceto para dar sinal ou se as suas vidas estivessem em risco eminente. O que é risco eminente? Perguntava-se o cabo Luis. Será que devo esperar que um projétil me atinja para então disparar? Esses oficiais estão loucos! Dizia a si mesmo.
Após dois longos e monótonos meses, as tropas brasileiras no Egito receberam a notícia que iriam retornar para suas casas e Luis não cabia em si quando soube que voltaria para casa são e salvo. Ainda eufórico, foi até o alojamento dos russos e procurou seu amigo Josef para lhe comunicar que iria voltar para o Brasil.
_Parto amanha para casa caro Ivanovic. Levarei boas recordações do Egito e você é uma delas camarada!
Josef também se despediu do amigo brasileiro e deu a ele um livro que foi guardado com muito carinho por Luis em sua mochila quando chegou ao seu alojamento e arrumou as coisas para a partida.
Tudo aconteceu como sempre, nenhum problema relatado, exceto algumas mulheres no porto com seus pais e irmãos a procura de certo soldado ou oficial, que a havia feito promessas de isso ou aquilo, a viagem não teve problemas relevantes.
A cidade do Rio de Janeiro estava em festa para receber seus heróis e alguns oficiais ainda no porto receberam medalhas de honra por serviços prestados à nação e Luis olhava para aquilo e sentia raiva por não terem dado um só tiro, por não terem ido uma vez sequer a área do conflito, por aqueles oficiais não terem visto o brilho nos olhos daquele povo sedento de combate uma única vez sequer e agora eles recebiam medalhas, isso era o cumulo para ele.
Sem tirar aquele sentimento de seu coração, quando chegou ao quartel e foi então dispensado para ir para casa, ele passou antes pelo comando e assinou seu pedido de baixa do exercito, o que foi no mesmo dia, aceito pelo comandante do 1º BC.
Livre do exercito e da farda que vestia, Luis chegou em casa e viu sua mãe em pé a beira da mesa da sala, quando Tina olhou para o filho, correu para dar a ele o abraço que ele tanto esperava receber ao chegar em casa após toda aquela aventura em que ele havia se metido. Contou para a mãe que saíra do exercito e ela, muito feliz pela atitude do filho resolveu fazer um jantar de boas vindas ao seu querido Luis.
Contou com detalhes a todos da família como tinha sido a viagem a Suéz, contou sobre as maravilhas do Egito e sua bela Cairo. A família também tinha noticias para ele. Alfred voltara para seus negócios em Pelotas e viria visitar a mãe no próximo natal e traria a família dele também, Doriz estava para casar-se com o jovem Pedro, Luisa e Anna haviam ingressado no Colégio Nossa Senhora do Amparo e Tina estava feliz, muito feliz por ter de volta quase todo o seu tesouro reunido outra vez.

Eu vou casar


Luis conheceu Marta Duarte ainda antes de ir para Suéz, e quando voltou a pediu em namoro, ela aceitou. Os dois começaram a se relacionar e em breve estariam tão apaixonados que nada mais poderia evitar que s e casassem.
Doriz e Pedro se casaram na igreja de Santo Antonio no bairro operário do Alto da Serra e Luis os levou em um “Sinca Jangada” emprestado de um amigo seu, até o Rio de Janeiro, eles adoraram a viagem pela serra do mar, descendo por uma estrada aberta ainda em 1928, e que os levou até o aeroporto de Santos Dumont, onde voariam com destino ao Rio Grande do Sul para passarem a lua de mel. Doriz recebeu as passagens do irmão Alfred, que havia insistido para que ela e seu marido fossem conhecer o sul do Brasil. Eles quando chegaram lá, decidiram ficar e trabalhar por lá mesmo.
Após deixar sua irmã e seu cunhado no aeroporto. Luis decide dar uma volta pelo Rio de Janeiro, e assim vai para um lugar conhecido como cinelândia, lá ele, ao sentar em um bar e pedir um café, ouve a conversa de dois jornalistas que conversavam sobre a política nacional e as decisões que “Jango” deveria tomar a respeito da economia e coisas assim, enquanto prestava atenção na conversa dos dois, ele ouviu o nome de Karl Marx, um alemão. Luis no mesmo segundo lembrou-se que já tinha ouvido falar daquele nome em algum lugar e como não esquecia as coisas com facilidade resolveu tentar lembrar onde foi que ele tinha ouvido falar de um dos pais do comunismo moderno.
Na estrada de volta a Petrópolis, Luis resolveu dar uma pequena parada, em um dos muitos locais preparados para isso, que havia as margens daquela estrada, um lugar com uma pequena cascata e que ele achou belíssimo foi o escolhido. Ficou ali por um bom tempo olhando grupo de pessoas que vinha subindo a serra com suas mochilas as costas e ele enfim lembrou-se de onde ele tinha visto aquele nome.
Ao chegar em casa e cumprimentar a sua mãe, ele foi direto para o quarto buscar as coisas que ele tinha trago consigo do Egito e desde então nunca havia mais mexido nelas. Ao abrir uma pequena caixa que estava encima do guarda roupa, ele deu de frente com o livro escrito em alemão: O Capital, de Karl Marx. Feliz por recordar de onde conhecia aquele nome, se pôs a ler o livro e já nas primeiras paginas, aquele livro o contagiou. Dois dias sem sair de casa e praticamente trancado em seu quarto. Quando abriu a porta e chegou a sala, olhou para todos e saiu.
Andando na rua que liga o Morin ao centro de Petrópolis, Luis pensava em uma forma de filiar-se ao partido comunista e ele sabia quem poderia ajudá-lo, seu amigo Luis Carlos, ele sempre esteve metido em política, saberia onde encontrar um partido comunista para que ele se filiá-se.
Foi andando até o bairro do Caxambu, onde seu amigo residia.
Ao bater a porta, Luis Carlos o atendeu com um sorriso nos lábios e o fez entrar. Na casa do amigo estavam reunidos vários outros e Luis ficou um pouco tímido de perguntar ao amigo o que queria e quando este o indagou sobre o que o trazia até sua casa, ele disse:
_Nada de importante, vim aqui apenas para lhe fazer uma visita.
Seu amigo, olhando para ele com uma feição de alegria lhe disse:
_Pois meu amigo. Eu estou muito feliz que tenha vindo aqui hoje. Estes meus outros amigos e eu estamos reunidos aqui para fundar um novo partido em Petrópolis e quero eu mesmo lhe fazer o convite para que participe, já está na hora de mudarmos essa política suja que ai está e sei que você é um homem certo para lutar conosco, heim? O que acha?
_Mas que partido é esse/ você sabe que eu não entendo muito de política, caro Luis Carlos.
_Nosso partido será a base municipal do Partido Comunista Brasileiro meu caro Luis, e você fará parte conosco não é?
_Mas é claro que sim, eu acabei de ler um livro que ganhei de um amigo russo quando estive no Egito e era para lhe perguntar onde eu acharia os comunistas em Petrópolis que vim aqui, mas fiquei sem saber o que fazer diante de tanta gente.
E assim Luis, não só entrou para o partido comunista como foi um de seus re-fundadores em Petrópolis.
Seu casamento com Marta era adiado toda vez que eles falavam no assunto e Tina resolveu dar uma ajuda ao seu filho e ela gostava de sua futura nora: Marta Duarte.

A filha do Sr. Eugenio


A futura esposa de Luis, era filha de um dos homens mais respeitado da pequena cidade das hortênsias, o Sr. Eugenio Duarte. Homem sério e relativamente rico. O senhor Eugenio era um dos construtores mais conhecidos e respeitados de Petrópolis. Inclusive dos engenheiros que sustentavam em todas as obras da cidade que ele era conhecedor de todos os segredos que uma construção civil poderia ter e que se ele dissesse que não iria ficar bom, o melhor era não fazer ou eles iriam acabar tendo prejuízo com a perda do material e no final teriam que dar razão a ele. O senhor Eugenio também gostava muito de Luis e esse casamento era para ele um grande prazer como ele contou certa vez a Tina.
Albertina certo dia chamou Luis para irem a seu quarto para conversarem, Luis sabia que algo sério estava acontecendo, pois, Tina não convidava os filhos a irem ao seu quarto sem ser para levar uma bronca ou para dar uma má notícia. Preocupado com o que poderia ser, Luis acompanhou a sua mãe até o quarto e quando ele entrou, ela fechou a porta e disse:
_querido Luis. Sei que você é um homem e que tem tentado encontrar seu horizonte, mas quero saber uma coisa: o que sente por Marta?
_O que? Como minha mãe, o que eu sinto por Marta. Eu a amo!
_Não é o que me parece, meu filho. Este casamento está travado em algum lugar e eu não entendo o que há?
_Olha mãe. Eu vou dar um jeito para poder me casar, não se preocupe.
Tina olhou para Luis e disse-lhe que estava tudo acertado com o Sr. Eugenio, que a partir de amanhã ele estaria trabalhando com o Sr. Eugenio. Luis, ao ouvir as palavras ditas por sua mãe sentiu um frio na espinha, não por ter de trabalhar com o seu futuro sogro, mas sim pelo que ele iria ter de fazer: trabalhar em obra.
No dia seguinte, às seis horas da manhã, Tina acordou seu filho e lhe entregou uma sacola, dentro havia uma laranja e uma marmita. Seu almoço.
Luis, ainda com grogue de sono, levanta-se e após se vestir, segue rumo a porta ainda pedindo a Deus que sua mãe desista desta idéia maluca de enviá-lo aos pátios e canteiros de obra do senhor Eugenio. Suas preces não foram ouvidas e ele quando abriu a porta diante dele, viu uma pick-up estacionada na rua, dentro seu futuro e agora orgulhosos sogro.  Eugenio sempre quis um genro que trabalhasse com ele e seguisse a tradição de sua família, seu pai tinha sido um grande mestre de obras e sua esposa Maria da Graças, não lhe deu um filho, Marta não poderia encarar os canteiros e então, a sua única chance seria o seu genro aderir ao seu oficio e assim realizar o seu sonho.
Luis saudou seu Eugenio e entro no automóvel, ele estava terrivelmente nervoso. Quando chegaram ao serviço, uma casa que o senhor Eugenio acabava de iniciar as obras, seu sogro lhe disse:
_Caro Luis. Para que você aprenda e seja um bom mestre de obras como quero que seja, você tem que aprender desde o inicio. Tome. –e dando a Luis uma pá, lhe mostrou uma marca no chão e lhe disse para cavar.
Ao final do dia, Luis estava completamente cansado e ao entrar em casa, foi diretamente para seu quarto e dormiu sem nem mesmo tirar as suas roupas. Tina percebeu o cansaço do filho e o deixou descansar um pouco, mais tarde o acordaria e lhe serviria o jantar. E assim se seguiram os dias seguintes onde não houve nada de novo exceto o cansaço de Luis que, já se acostumando, estava diminuindo.
O casamento se realizaria enfim.

Luis vai casar


_O que, é verdade? Disse Alfred quando sua irmã Anna lhe falou ao telefone.
Anna disse que seria no dia 12 de marco e se ele viria para a cerimônia. Alfred disse que sim e então se despediram.
Luis estava nervoso com a proximidade do casamento, não conseguia pensar em outra coisa e Tina percebia isto nele, ela sabia que precisava fazer alguma coisa para que seu filho ficasse mais tranqüilo. Chamou Luis outra vez ao seu quarto e lá foi ele tremendo, ao dormitório de sua mãe:
_Que foi agora mamãe?
_Nada meu filho, eu só quero lhe dizer que eu irei te apoiar seja lá qual for à decisão que você tomar, mas quero que você saiba que mandei arrumar a casa do alto da serra para que você e Marta comecem a sua vida.
_Oh! Obrigado mãe, eu amo a senhora.
E o casamento aconteceu na data e hora marcadas, a pequena igreja no alto da serra nunca havia recebido tantas pessoas como naquele dia, Marta ao entrar na acompanhada por seu pai estava mais linda do que qualquer outra noiva, e o noivo nunca tinha visto ela tão linda como aquele dia. O casal enfim estava unido pelo sagrado matrimonio como diriam os que sabiam do quanto foi difícil esta união. Mas o destino de Luis o esperava e não havia como aliterá-lo. Luis passou a lua de mel em uma cidade do litoral norte do estado do Rio e quando retornou para Petrópolis, recebeu a noticia de que no dia seguinte haveria uma reunião do partido, Luis iria a esta reunião.
Foi como de costume trabalhar com seu sogro, Luis agora era encarregado e se cansava menos. Depois do trabalho não foi para casa como era de costume, antes ele iria a reunião do partido, iria se encontrar com os demais em um bar da cidade. O grupo se encontrou e Luis percebeu certo nervosismo entre os integrantes, tanto que Luis, sem saber o que estava acontecendo perguntou:
_Camaradas, o que está acontecendo?
_Cale-se e nos acompanhe Luis, não podemos conversar na rua. Disse um dos integrantes.
Luis foi acompanhando o grupo ate uma casa na Rua Floriano Peixoto.
Dentro de uma pequena casa com dois ou três cômodos, já se encontrava vários integrantes do partido e todos olharam para Luis, quando ele entrou naquela residência.
_E então, camarada Luis! Como foi o seu casamento?
_Foi melhor do que esperava companheiro Deoclécio e a festa só faltou você e suas argumentações a respeito do plano trienal meu amigo.
Havia ali alguns membros que Luis nunca tinha visto pessoalmente, mas que ele já tinha ouvido falar e ele ficou feliz em conhecer outros. Deram inicio a reunião e Luis ficou surpreso com a pauta, haveria um levante comunista e eles estavam ali para receberem as instruções para o que estava por vir, entre outras coisas, ele receberam armas e Luis, o grande esperado para a reunião tinha sido incumbido de dar o treinamento aos demais companheiros que não tinham conhecimento de armas e táticas de combate.
Luis teria que acompanhar o grupo por uns dias a um sítio em Magé, onde ele iria dar o tal treinamento e ele ficou apreensivo, como ele iria justificar a sua ausência por tanto tempo para a sua esposa. Ele teria que pensar em algo.
Naquela noite, Marta estava ansiosa pela chegada do marido, quando ele abriu a porta, ela correu para seus braços em busca de seu beijo e Luis ainda sem saber o que lhe dizer deixou-se levar pelo embalo de sua esposa e os dois se entregaram à paixão de um casal recém casado.
Na manhã do dia seguinte, Luis não foi trabalhar e decidiu passar o dia com sua esposa a fim de encontrar uma forma de justificar sua ausência por tanto tempo, ele teria que passar três meses fora de casa.
Durante o dia, Luis fez tudo para agradar a sua querida Marta e ao cair da tarde, ele ainda na esperança de encontrar uma maneira de dizer a ela que iria se ausentar ouviu alguém batendo a sua porta.
Ao atender, Marta se surpreendeu ao ver um jipe do exercito e uma viatura da policia.
_Pois não? O que desejam? Disse Marta aos soldados.
_è aqui que reside o Sr. Luis Daudt Vollmann?
_Sim, é aqui.
_Pode chamá-lo, por favor.
Ao entrar em casa para chamar seu marido, Marta se surpreendeu quando os soldados invadiram a casa com armas na mão e foram, sem pedir licença, revistando todos os quartos da casa. Marta ficou nervosa por não saber o que estava acontecendo. Os soldados após constatarem que o seu alvo não estava na casa, que ele havia fugido e se dirigiram à casa da Srª. Albertina. Levaram Marta junto apenas por precaução, lhe havia dito o comandante da operação.
Luis, ao ouvir a voz e forma com que perguntaram por ele, sabia que não era coisa boa e imediatamente saiu por uma janela que dava para os fundos onde havia um terreno baldio, coberto por uma pequena mata. Ele pode avistar os soldados parados enfrente a casa de sua mãe e então decidiu ficar no mato por algum tempo, a espera de que eles desistissem de esperar e fossem embora.
Luis lembrou-se do endereço que os seus camaradas do partido haviam decorado para essas “ocasiões”. Ao chegar a um pequeno casebre na serra velha, antiga estrada que dava acesso ao Rio de Janeiro, passando pelo município de Magé, Luis encontrou mais quatro amigos que já estavam escondidos ali e eles comemoraram a chegada de mais um dos seus porque assim sabiam que o exercito não tinha conseguido prender mais um daquele grupo. Aquele dia seria inesquecível para todo o país, era o dia 31 de marco de 1964.
As perseguições se seguiram e os filiados ao partido comunista, ilegal desde a era Vargas, eram presos a cada dia, o governo de Jango havia sido deposto pelas forcas armadas e agora o presidente da República era o General Castelo Branco, um homem sério e convicto da ameaça comunista, porém, ele não era tão terrível como os que estariam por vir depois dele.
Luis tinha que ir ver sua casa e Marta, ele precisava de notícias e o casebre já não suportava mais tantos companheiros, já haviam mais de trinta perseguidos escondidos naquela casa e, Luis então decidiu que ele iria sair e ver como andava as coisas em Petrópolis. Assim, eram quase dez horas da noite quando Luis bateu a porta da casa de sua mãe, Tina preocupada com quem seria a esta hora, levantou-se e foi abrir a porta:
_Meu filho! Exclamou Tina ao abrir a porta.
Luis entrou e pediu a sua mãe que apagasse a luz, seu pedido foi atendido e os dois sentaram-se na sala e começaram a conversar. Após explicar tudo que estava acontecendo a sua mãe, Luis pediu para dormir um pouco e Tina achou melhor que ele dormisse em seu quarto, assim ele estaria em segurança e aos olhos dela, nada lhe aconteceria, pensava ela.
Pela manhã, Luis levantou-se e viu que Tina já não estava mais no seu quarto. A porta se abriu e Tina entrou com uma bandeja com café da manhã para seu filho, alguém bateu a porta da sala e Tina disse a Luis para que não saísse do quarto.
_Sim, o que deseja? Disse Tina ao estranho que estava a sua porta.
_Senhora, meu nome é Dídimo, sou de São Paulo e venho em busca de seu filho, eu não posso mais perder tempo, estão a minha procura como devem estar também atrás de seu filho, tenho pressa em encontrá-lo, por favor, me diga onde ele está?
_Entre senhor Dídimo, eu não sei onde possa estar aquele menino, porém, não acredito que se o senhor veio de tão longe, irá recusar um café fresco que acabei de passar, vai?
Dídimo, aceitando o convite de Tina, entrou na casa e sentou-se ao sofá. Tina foi até a cozinha e veio com uma chaleira e duas xícaras em uma pequena bandeja. Serviram-se e os dois iniciaram outra vez aquela conversa:
_Mas o que meu filho fez de tão grave para até o exercito vir em minha casa, revirar tudo em busca de um menino como Luis, Sr. Dídimo?
_Senhora, eu só posso falar por mim, eu não posso lhe revelar segredos que só dizem respeito ao seu filho e ele um dia deverá lhe explicar tudo, o que posso falar para a senhora é que nos lutamos contra esse governo autoritário e queremos fazer do Brasil, um grande país.
Ao terminar a frase, dídimo olhou para a porta que dava acesso ao corredor e ficou branco, Luis estava em pé olhando para o amigo que ele tanto precisava encontrar.
_Caro amigo, que honra recebê-lo, mas o que o fez atravessar todo esse trecho para vir me ver?
_Luis, Luis. Eu precisava tanto encontra-lo. Eu trago notícias da nacional e você foi eleito para comandar o grupo que irá levantar fundos para o plano que elaboramos.
A comitiva central do partido havia resolvido efetuar alguns assaltos a bancos internacionais no Brasil para levantar fundos para armar seus combatentes e seus intelectuais terem como efetuar, na clandestinidade, o jornal do revolucionário. Luis, por ter sido um soldado, ele era um dos mais perfeitos para isto.
Tina os deixou a sós e eles então começaram a conversar a respeito dos planos da nacional.
À noite, Luis o levou até a pequena casa no mato onde havia se escondido por algum tempo e os companheiros comemoraram a decisão da nacional. Naquela noite, Luis escolheu os companheiros que iriam acompanhá-lo no plano.

Banco Fluminense


Uma das mais belas construções de Petrópolis, era sem duvida a agencia do Banco Fluminense e era ela quem detinha as contas de grandes empresários e de alguns abastados que viviam aqui. Suas portas de carvalho haviam sido entalhadas na Europa assim como as estatuas de mármore que adornavam a entrada da agencia. O gerente era o senhor Dionísio, um senhor com quem Tina às vezes ficava por horas conversando e ele, já com seus cinqüenta e poucos anos, era um homem sério e competente. A agencia era uma das mais lucrativas do estado.
Às onze horas, um homem entrou na agencia e pediu para falar com o gerente, e ao entrar na sala do mesmo, este sacou de um revolver 32 e deu ao gerente a ordem de que ficasse calado e viesse até ele. O homem segurou o gerente e os dois foram para o salão principal, lá Luis e mais três camaradas entraram encapuzados e comunicaram o assalto. Um segurança tentou obstruir o rumo dos desejos do grupo e Luis o deu uma coronhada com a espingarda de caça que segurava. O grupo após reunir todo o dinheiro que estava na agencia, inclusive o que estava no cofre, que foi retirado com a ajuda do gerente e um revolver em sua nuca. Os cinco camaradas saíram do banco e entraram em dois automóveis aero-williys 2600, recém lançados no Brasil e roubados um dia antes em uma agencia no Rio de Janeiro. Com esses automóveis não puderam ser detidos pela policia local que foi acionada minutos depois de terem saído do banco. Fugiram e foram para a cidade de Três Rios.
Ao chegarem ao destino, dividiram-se e cada um seguiu para uma cidade, Luis voltou para Petrópolis.
A viagem de volta a Petrópolis foi para ele um martírio devido à demora do trem devido a uma barreira que havia caído nos trilhos.

Meu filho não


Quando desembarcava na estação de trem de Petrópolis, aquela seria uma das ultimas viagens feitas pelo trem de passageiros entre Petrópolis e outra cidade qualquer, Luis é surpreendido ainda no desembarque:
_Sr. Luis Daudt Vollmann?
_Sim e o senhor?
_O senhor saberá em breve, me acompanhe.
_Porque eu deveria?
O homem mostrou a Luis uma arma e mais alguns companheiros que estavam ali, eles eram homens do exercito, trabalhando secretamente na captura de subversivos como eram chamados os comunistas naquela época.
Luis foi levado para a delegacia de policia e Luis tinha um amigo lá, ficou mais tranqüilo ao saber do seu destino. Quando chegou a delegacia, ele logo foi visto por seu amigo, que era um policial respeitado e que tinha por Luis uma amizade feita com base nas mesas de “biriba e buraco” de um cassino clandestino no bairro caxambu e que era muito freqüentado por varias pessoas da cidade, até seu sogro, o senhor Eugenio freqüentava o local.
_O que esse ai fez? Disse o policial a aqueles homens.
_Você o conhece, inspetor Hilário?
_Sim, eu vejo vez por outra no clube, é um cachaça que de vez em quando perde uns reis por lá.
_Pois ele é mais perigoso do que pensa, inspetor. – disse aquele homem rindo por dentro ao subestimar o policial por ele não saber que Luis era comunista. E o homem levou Luis para uma pequena sala para ser interrogado.
Hilário sabia da seriedade e do que poderia acontecer ao seu amigo, o gerente do banco se o reconhecesse então seria ainda pior. O policial então foi a um bar da esquina tomar um café e ao ver um desses meninos que engraxam sapatos o chamou:
_Menino, vá até este endereço e diga a senhora Albertina para vir imediatamente à delegacia, diga a ela que Luis foi preso.
O menino partiu e fez como o inspetor havia dito, Hilário sabia que com a presença da mãe, eles não poderiam fazer o que estavam fazendo com os subversivos, e Tina quando recebeu a notícia, largou tudo que estava fazendo e foi imediatamente para a delegacia. Quando estava chegando a porta da chefatura, Tina encontrou-se com o gerente do Banco Fluminense e este quando a viu aos prantos pensou:
_Vale a pena prender um rapaz que acredita estar, em nome de um ideal, fazendo algo errado, mas que para ele é certo? O gerente entrou na delegacia e foi posto frente a frente com Luis, olhando para os olhos daquele rapaz, todo suado e com sangue escorrendo de sua fronte, o gerente repudiou o que viu e disse com todas as palavras que aquele rapaz não estava no assalto.
_Mas como não é ele? Olhe bem, tem certeza de que ele não participou do assalto a sua agencia senhor Dionísio?
_Sim, eu tenho certeza sim. E dizendo isso, o gerente saiu da sala e deu com Tina ainda chorando e impaciente no corredor da delegacia, a espera de notícias de seu Luis.
_Senhora Albertina. A senhora terá seu filho em breve, não há como prende-lo por muito tempo, Tina. E o gerente a abraçou no intuito de consolá-la. Tina aceitou o consolo de Dionísio.
Luis então surgiu em meio a alguns outros homens que estavam sendo também liberados, quando Tina avista seu filho, corre em sua direção e o abraça dizendo em alto som:
_Meu filho não, meu filho não é ladrão.
Em meio a tudo isso, o casamento com Marta foi terminado, o senhor Eugenio mesmo foi à casa de Tina para rompe este casamento e dizer que apesar de Luis ter sido um excelente auxiliar em suas obras, ele não o queria mais como genro e que iriam estudar uma forma de terminar aquele casamento o mais rápido possível.
Luis estava livre e sem Marta.

Uma estrela


Luis decide manter suas atividades políticas estacionadas por um tempo e então se entrega ao trabalho, mantendo apenas o jogo no cassino no caxambu, aonde ele ia porque dizia que precisava encontrar e agradecer ao inspetor por chamar a sua mãe.
Ao embarcar em ônibus para ir ao bairro do Quitandinha, Luis encontra uma mulher que mexeria com ele, a linda Judith Pereira da Silva. Luis tinha que conhece-la e assim aconteceu, os dois desembarcaram no mesmo ponto.
_É, me desculpe senhorita, mas não pude deixar de notá-la. Disse Luis a aquela bela mulher.
_Obrigado Senhor??? , mas eu não sou tudo isso e quem é o senhor para me galantear assim?
_Eu sou Luis Daudt Vollman, sou mestre de obras e lhe construirei um castelo. E dizendo isso, os dois deram inicio a uma longa conversa que culminou com a troca de endereços e inclusive marcaram outro encontro, agora eles iriam ao cinema.
Naquele dia Luis chegou em casa, embriagado de felicidade, finalmente tinha encontrado uma mulher como ele sempre quis.
No domingo, como ele e Judith haviam combinado, se encontraram na Praça D. Pedro II, Judith estava ansiosa e Luis eufórico com aquela linda mulher. Foram ao cinema D. Pedro e depois, Luis a levou ao Restaurante Paulista para jantarem, conversaram e esses encontros tornaram-se semanais, depois diários até que Luis decidiu ir morar com Judith de uma vez por todas, Tina não gostou muito da idéia, Judith já tinha sido casada antes e possuía três filhos de seu casamento, Luis teria uma família e não apenas uma esposa, isto assustava Tina. O casal foi residir em um local chamado Bairro Chácara Flora, Tina não conseguia aceitar esta idéia e muito menos pronunciar este nome: Chácara Flora.
Não demorou muito e veio o primeiro filho do casal, deram a ele o nome de Luis Carlos Vollmann, este foi para Tina uma grande surpresa e levou Tina a lembrar de seu primeiro bebê, pois o menino também tinha o nome do pai e morreu com seis meses, Tina sentiu mais que todos os outros da família, no dia em que o bebê nasceu, ela viu uma estrela sumir no céu e chorou sem saber porque, seis meses depois ela entenderia aquele sinal.
Tina mergulhou em seu passado e trouxe a tona uma antiga lembrança que em noites conturbadas ela se lembrava, sua mãe dizia que sobre a sua família pairava uma maldição que a séculos insistia em resistir a tradição de nomear o primogênito com o nome do pai e Tina se pôs a chorar. Judith e Luis não imaginavam isso e seguiram suas vidas e tal foi à surpresa quando Judith anunciou que estava grávida outra vez. Tina ficou feliz desta vez e chamou Luis ao seu quarto.
_Meu filho, como tua mãe eu te peco para que não coloque seu nome nesta criança que está para nascer, eu te peço meu filho.
_Que houve mãe, por que a senhora está chorando, eu faço isso que me pede, mas me diz mamãe, o que há?
E Tina explicou tudo ao seu filho, que sem compreender muito os motivos de sua mãe, acatou e pedido dela e quando a criança nasceu ele recebeu o nome de Josué da Silva Vollmann, era o ano de 1968 e Luis, sua esposa e seus filhos foram morar na Ilha do Governador, na cidade do Rio de Janeiro. Luis fora contratado para trabalhar na construção da ponte que iria ligar a cidade do Rio a Niterói.
A vida foi entre separações, jogo, agora era corrida de cavalos e o partido.
Em 1971, Luis ao sair do trabalho, vai para a reunião do partido, no bairro de Olaria, em meio à reunião, todos estavam muito afoitos e não perceberam quando a policia chegou, Luis e seus camaradas foram presos, Luis desta vez não teve como receber ajuda de sua mãe, que agora ajudava a Judith, que sem ter como pagar o aluguel da casa na Ilha do Governador, veio de volta para Petrópolis.
Após cinco meses no presídio conhecido como Ilha Grande devido ao nome da ilha em que se encontrava o presídio; Luis voltou para casa e ao entrar na casa de sua mãe, conheceu o pequeno bebê que Judith tinha dado a luz quando ele ainda estava preso, o menino não havia sido registrado e Luis foi para o cartório a fim de dar seu nome ao bebê.
Os filhos mais velhos de Judith já haviam até chegado às vias de fato para decidirem qual seria o nome do bebê e Luis para resolver o problema deu os dois nomes ao menino que já com três meses, era o xodó de Albertina. Ele foi chamado de Celso da Silva Vollmann e Tina ainda olhava para o céu e estrela estava ainda lá, depois de quase quatro meses. Era um sinal que Tina não conseguia entender.
O menino cresceu, são e forte e Tina ficava maravilhada com a energia do menino, suas presepadas e o costume idêntico ao que ela tinha quando criança, de se esconder por entre a saia de sua mãe, o menino fazia o mesmo, mas nas saias dela.
Um dia, alguém entra na casa de Albertina e diz:
_Guten tack! Tina estava com uma bandeja de louça nas mãos e quando ouviu aquela voz, ela não tinha visto quem era ela deixou cair e os pedaços de louça no chão não impediram Tina de correr a sala para ver seu amado Theobald, só ele tinha aquela voz e aquele sotaque. Tamanha foi a sua surpresa quando chegou a sala e viu em pé no meio daquele recinto, apenas seu neto, seu pequeno Celso como ela lhe chamava e Tina olhando em direção a ele, viu pela porta aberta o céu e a estrela com um brilho que ela nunca tinha visto antes e ela desmaiou.
_Vovó, acorde vovó. Gritava Celso sem saber o que fazer até que sua avó acordou e olhou para ele como quem estivesse vendo outra pessoa.
_Fiquei com medo vovó, o que houve?
_Nada meu filho. Ajude-me a levantar e Celso ajudou a sua avó e os dois sentaram-se no sofá da sala. Tina sentia que precisava contar ao neto, toda a história de sua família, suas origens, seu passado e o seu querido Theobald. Enquanto contava ao neto a história de sua vida, ela sentiu nas perguntas do neto que ele se interessava e deduzia coisas que seus tios nunca haviam deduzido. Quando lhe falava do amor que tinha por seu Theobald, os olhos de seu neto lacrimejavam e Tina sentiu que o nome de seu avô fazia Celso chorar, isso comoveu muito a Albertina.
Durante vários dias seguidos, Celso foi à casa de Albertina para que ela continuasse a lhe contar a história da família e isto acabou aproximando ainda mais os dois até que um dia algo iria mudar tudo na vida da família Vollmann.

Chega!


A primavera em Petrópolis fazia a cidade ficar ainda mais bela. Celso não foi para a escola e foi ver sua avó Albertina. Chegando na casa dela, ela já o esperava, sentia em seu coração disse ao neto e os dois entraram e Tina preparou um lanche para eles e sentaram-se a conversar. Tina expôs os últimos momentos da vida de seu Theobald, detalhes que ela vinha a muito relutando em contar para seu neto até que neste dia ela não resistiu, disse-lhe tudo o que tinha acontecido e foi até o seu quarto, quando voltou, trouxe uma pequena caixa de madeira e de dentro tirou uma carta e uma medalha, era o ultimo detalhe da vida de Theobald. Tina preparou o almoço, os dois felizes almoçaram juntos e como de costume, após a refeição foram deitar-se no quarto de Albertina, Celso abraçou sua avó e este lhe cedeu o braço, um ato que para ele era apenas carinho com sua avó, para Tina era assim que ela dormia com seu querido Theobald.
Por volta das três horas da tarde como de costume, Celso acordou e foi até a cozinha, pegou um pedaço de bolo com café e depois foi para a sala, viu que sua avó não acordava e foi até o seu quarto, ela continuava deitada como ele a havia deixado e aproximou-se dela dizendo:
_Vovó, acorde vovó, já está na hora, chega de dormir vovó! Ela não acordou e Celso começou a sentir que o pior havia acontecido, sua avó falecera quando dormia e Celso saiu pela rua chorando quando alguém lhe parou e ele disse o que havia acontecido. Logo todos da família estavam ali na casa de Tina e Celso, agarrado a as mãos da sua avó, ainda em lagrimas. Saiu do quarto e foi até a cozinha onde encontrou seu pai e seus tios discutindo com quem iria ficar os bens de Albertina. Celso ficou furioso com o que viu e saiu correndo da casa onde ele teve os melhores e únicos, bons momentos de sua vida, ele saiu andando pela rua lembrando de cada segundo e de cada palavra de sua avó, de tudo que ela tinha ensinado e de quanta falta ela fazia agora e seus filhos ali, dentro da casa dela e com o corpo ainda lá, eles discutindo sobre as casas de sua avó. Revoltado Celso fugiu de casa, ele estava agora com doze anos de idade e ele dizia para si mesmo: Chega!

Celso da Silva Vollmann

 

É negro!


Judith foi sozinha para o hospital para dar a luz ao seu sétimo filho, ela sentia falta de seu marido apesar de não aceitar mais ele, ela o amava. Ao chegar a recepção do hospital, ela desmaiou e não viu nada mais.
As 17h15min daquela quarta-feira, um 10 de junho frio e úmido, nascia um bebê que em nada parecia com seus pais. Luis tinha os olhos e o cabelo castanhos assim como Judith, o recém nascido tinha ainda os olhos fechados, mas a sua pele era negra e todos se olharam até que já à noite, um médico veio falar com os familiares e explicar que o bebê tinha um pequeno problema e deveria passar por um tratamento e por isso não poderia ir para casa tão cedo. A mãe seria liberada para ir para casa no dia seguinte após a visita médica.
Tina sabia que aquele menino estava predestinado a algo que só mais tarde ela saberia o que e então foi para casa, ela queria entender o que estava por acontecer e queria voltar para sua casa para refletir sobre tudo que acontecia naquele momento.
Na manhã do dia seguinte, Tina e uma de suas filhas estavam no hospital esperando que Judith saísse para levá-la para casa e Tina começou a sentir-se mal, disse a sua filha Anna que não poderia esperar, iria para casa. Judith saiu do hospital sozinha como havia ido para o mesmo. Em seus braços não estava o seu filho, mas ela sabia que dentro de poucos dias ela sairia outra vez por aquela porta com seu bebê em seu colo como deveria ser.
Passados quatorze dias e já com a saúde restaurada milagrosamente como disseram os médicos, Judith cumpria a promessa que havia feito quando teve de deixá-lo ali. Com seu filho no colo, ela foi para sua casa e no meio do caminho, ela decidiu que faria tudo para manter a família de seu marido longe daquela criança.
Tina soube que o seu neto já estava fora de perigo quando foi ao hospital e descobriu que ele havia sido levado pela mãe, Tina então foi até a casa de Judith, e ao chegar, o menino que estava chorando insistentemente, sem nenhuma explicação parou derrepente e se pôs a sorrir. Tina ficou feliz em saber que o seu netinho, se sentia bem com a presença dela.
Conversaram e Judith discutiu com Albertina, isso iria afastar as duas por um longo tempo. Caberia ao destino unir tina e seu netinho outra vez.
Celso ainda não havia sido registrado e isso incomodava a Judith e já se passavam mais de quarenta dias até que alguém bateu a porta, os golpes eram fortes e apesar do barulho de uma maquina de costura, Judith costurava para fora para se manter, ela se levantou e foi ver quem era.
_Sim, quem é?
_D. Judith, sou vizinha de Dona Albertina e vim aqui por que o Luis voltou e acho que um pai deve cuidar de seus filhos.
_Sim, e verdade e aquele cafajeste ira pagar pelo que me fez, a se vai.
A pessoa que havia ido ali para dar a notícia se foi e Judith voltou para a maquina de costura e ao pegar o tecido, furou o dedo em um alfinete que estava preso ao tecido, o pano era branco e manchou com o sangue de Judith.
Furiosa, ela deixou de fazer o que estava fazendo, com muita raiva, ela descontava em seus outros filhos o que lhe faziam, estes choravam e às vezes ficavam com raiva, mas já estavam acostumados.
De manhã bem cedo, Judith com o seu filho no colo, foi até a casa de Albertina, que ainda vivia no Morin, e bateu a porta, quando essa se abriu, ela começou a chamar o pai de seu filho de vários nomes e não percebeu que a criança em seu colo absorvia toda aquela raiva. Luis pediu para que ela entrasse e ela continuou a ofender-lhe com palavras até que Tina entrou na sala e disse:
_Cale-se, quem você acredita ser para entrar aqui e dizer tudo isso que eu não penso em repetir? E ainda com meu neto no colo, o que é isso?
_Judith, perdeu a forca que havia dentro dela e calou-se, Tina então disse a Luis que ele deveria ir ao cartório e registrar aquele menino, que agora no colo da avó estava sorrindo, e virou-se para Judith dizendo a ela que ficasse ali até ele voltar com a certidão do menino.
Luis saiu e foi ao cartório para fazer o que a sua mãe havia dito e que Judith, não contente com aquilo, lhe disse que o nome deveria ser Humberto da Silva. Em meio ao caminho Luis encontrou com um dos filhos de Judith e esse lhe disse que havia tido uma briga entre os seus dois irmãos mais velhos devido à escolha do nome do caçula da família, um queria que fosse Celso e o outro queria Roberto. Luis rindo enquanto ouvia aquela história, decidiu que o nome de seu filho seria Celso.
Quando retornou para casa com a certidão na mão, Judith já estava mais tranqüila, Tina havia conversado com ela e agora estava mais calma, e assim Tina teve tempo para com o menino no colo, fazer uma oração que se fazia aos recém nascidos em sua vila na cidade de Dantzig.
Judith aceitou o nome dado pelo pai e voltou para casa, eles acertaram que Luis e a avó poderia ver o pequeno Celso no próximo domingo.

Um copo de suco


Luis e Judith estavam ora juntos e ora separados. Nem mesmo os parentes mais próximos sabiam quando os dois estavam vivendo sob o mesmo teto ou haviam brigado outra vez e em 1975, eles decidiram se separar de uma vez, durante a discussão que culminou com esta separação definitiva, os dois trocaram acusações. Luis dizia que ela judiava demais das crianças e Judith dizia que ele era um jogador e que não sabia fazer outra coisa na vida que não fosse jogar baralho. Luis voltou para a casa de sua mãe e se comprometeu a dar uma contribuição mensal para que Judith tivesse como sustentar os dois filhos que tinha com ele.
Judith, passado alguns anos casou-se outra vez, desta vez com um descendente de árabe e Luis, que se casou também com uma moça escura, ora dava a ajuda financeira e outras vezes não. Judith não esquentava muito por que o seu atual esposo a ajudava e ela preferia não se aborrecer.
Um dia o atual esposo de Judith foi embora, segundo ele, pelos mesmos motivos de seu antecessor, Judith agora precisava da ajuda de Luis outra vez e foi falar com ele. Luis não se negou, ele agora trabalhava em uma empresa do município como mestre de obras e decidiu reatar o pagamento da pensão.
Celso, que de um modo ou de outro acabava recebendo as alegrias ou as raivas de sua mãe, certo dia soltou uma frase que seria para sempre lembrada por sua mãe, Judith ao chegar em casa depois de ter recebido e ter feito compras, preparou um copo de refresco, serviu um copo para ela e outro para Celso, este pegou o seu copo e pôs um dos pés na cadeira, olhando para o copo, virou-se para sua mãe e disse:
_É, eu estou bebendo a pensão de meu pai!
Ao ouvir isso, Judith puxou raivosamente a cadeira e Celso, sem equilíbrio caiu no chão, Judith pegou um pedaço de mangueira que ficava guardado na cozinha para essas ocasiões, Celso sabia o que receberia por ter dito aquela frase.
Celso, no dia seguinte, ainda com as marcas da agressão não só no corpo, mas também na alma, fugiu para a casa do pai, este quando viu e ouviu o relato de seu filho, decidiu que ele iria morar com o pai e foram até a casa da mãe para buscarem as roupas dele.
_Vim aqui apenas buscar as roupas de meu filho e se você não quiser piorar as coisas, me entregue-as já. Disse Luis para Judith, que estava estendendo roupa no varal quando eles chegaram. Celso entrou na casa para pegar as suas coisas e quando foi ao banheiro pegar os sapatos que ficavam guardados lá e nesse instante, Judith entra também no banheiro e lhe diz:
_Meu filho, eu te amo e não vou mais fazer isto, fique aqui comigo e não vá com seu pai, eu te darei o que quiser. Celso, vendo as lagrimas que rolavam pela face de sua mãe, aceitou e ao sair, disse ao pai que não iria mais com ele, Luis ficou sem saber o que fazer e disse adeus. Luis sai chorando e sentindo-se abandonado pelo filho.
Tudo ficou bem por uns dias e Celso estava começando a acreditar que seria enfim, feliz.
Celso tinha uma incontinência urinaria que o fazia urinar na cama, era comum e quase todos os dias isso acontecia, os irmãos mais velhos sabiam o que sua mãe poderia fazer se descobrisse e então por isso, eles ocultavam isto dela. Eles ficavam até mais tarde na cama e corriam risco com isso, mas era necessário não deixar que o irmão caçula sofresse tanto nas mãos de sua mãe. Um dia todos foram embora e Celso ficou só com a mãe, ela descobriu e Celso passou a sofrer ainda mais quando com seis anos ele passou a ir para escola com as costas marcadas pelo famoso pedaço de mangueira que nas mãos de Judith era uma arma voraz e sedenta de sangue.
Um dia Celso encontrou seu pai novamente, era época de campanha eleitoral e o menino agora já estava com oito anos, eles conversavam e a amizade entre os dois cresceu outra vez. Celso estava tão bem com o pai que decidiu, ele iria morar com o pai.
Celso e um amigo que residia perto de sua casa decidiram fugir, Celso e Adriano tinham uma coisa especial em comum: os dois sofriam nas mãos de suas mães, e assim eles foram para o Rio de Janeiro, ficaram no bairro do Flamengo, dormiram em baixo de um viaduto e sentiram fome, conseguiram carona para Teresópolis e acabaram voltando para Petrópolis. Ao chegarem na cidade, Luis viu os dois na rua do centro e recebeu o filho de braços abertos e disse:
-Filho, vem morar comigo?
Celso aceitou e foi para a casa do pai e assim começou a freqüentar a casa de sua avó, a querida Albertina. Tina ficava muito feliz quando o seu neto ia a sua casa, ela começou a lhe contar a história da família e Celso ficava horas escutando o que sua avó contava, para ele era muito interessante, mais do que as coisas que sua mãe contava a respeito do seu pai, sua mãe só lhe contava coisas horríveis sobre Luiz, não havia nada de aventuras ou coisas assim, Celso era apaixonado por esses momentos com sua avó.
O gosto pelas histórias contadas por Tina fazia com que Celso aguardasse ansioso pelo próximo momento ao lado de sua avó outra vez.

Chega! Basta!

 
Celso foi à casa de sua avó Tina e ele se espantou de ver o menino, que agora com doze anos, ele deveria estar na escola esta hora, mas ela achou melhor não dizer nada e também ela gostava da companhia do neto. Ela preparou café e lhe serviu biscoitos do tipo champagne, eram os que Celso mais gostava, e os dois sentaram-se na sala para conversar. Tina já tinha contado quase tudo da sua vida e sobre Theobald, faltava apenas um detalhe e Tina evitava falar sobre isso com seu neto nas havia chegado o momento de revelar ao neto como seu avô morreu, e aquela era a hora.
Tina começou seu relato de como tinha sido a morte de Theobald, contou sobre os julgamentos em Nuremberg e lhe disse:
_Querido Celso, vou lhe dar uma coisa, espere aqui. Tina levantou e foi até seu quarto pegou uma caixa encima do guarda-roupa e voltou, com um sorriso nos lábios e uma lagrima nos olhos, Tina abriu a caixa e deu ao seu neto, uma medalha, dizendo a ele:
_Meu neto, você é o único que se interessou por nossa história, a história de nossa família, nossas raízes e por isso eu acho melhor isto ficar com você, eu estou chegando ao fim de minha vida e acredito que você é a melhor pessoa para guardar isto.
Celso pegou a medalha e olhando para ela como se aquilo fosse um tesouro, ele disse a sua avó:
_Vó, o que é isso, era do vô Theobald?
_Sim Celso, era de Theobald e esta comigo desde 1949, agora irá ficar com você até Deus dizer o que você deve fazer com ela, quero que a guarde como se estivesse guardando a mim, promete?
_Claro que sim vovó.
Os dois se abraçaram e Tina foi preparar o almoço, Celso ajudou-a. Após o almoço, como de costume, os dois foram se deitar e Celso sempre deitava na cama de sua avó, ele era o único neto de Albertina que fazia isso, todos diziam que ele era abusado por fazer isto, mas Albertina adorava a companhia de seu neto e não ligava, ao contrario, ela adorava.
Os dois adormeceram como sempre e caíram em um sono profundo.
Eram três horas da tarde, Celso acordou ainda meio embriagado e logo procurou a sua medalha, ele havia escondido ela embaixo do travesseiro, pegou a medalha e foi até a cozinha, pegou um pedaço de bolo que estava por sobre o fogão, serviu-se de um copo de café, foi para a sala e sentou-se a ver televisão. O tempo passou e Celso começou a se preocupar com sua avó, ela nunca tinha dormido tanto. Ao entrar no quarto, ele sentiu um calafrio percorrer seu corpo, aproximou-se de Tina e a moveu chamando por ela, Tina não respondia Celso, apesar do rosto tranqüilo e mostrando uma paz enorme que sua avó estava naquele momento, teve a certeza do pior quando deu um pequeno tapa em sua avó e ela não acordou como sempre fazia. Celso imerso em lagrimas, saiu correndo pelas ruas do Bairro Morin, um dos vizinhos de Tina percebeu que algo estava errado e foi até o menino correndo pelas ruas:
_Que houve menino, há algo com a sua avó?
_Minha avó morreu!
Ao dizer isso, a rua em peso foi à casa de Tina, em poucos minutos estavam todos os filhos de Albertina reunidos na casa dela e uns choravam e outros discutiam, havia um grupo na sala, outro na cozinha e outro no quarto. Celso estava no quarto, com as mãos agarradas a sua avó, ninguém conseguia tirar o menino dali, e ele chorava cada vez mais, todos estavam preocupados.
Celso, apesar das lagrimas, ele ouvia o que estavam dizendo dentro da casa de sua avó, ele estava se revoltando com tudo aquilo, ele dizia para sua avó, em voz baixa, mas do fundo de sua alma, que ele não entendia como eles haviam perdido o seu maior tesouro e agora estavam brigando para ver quem ficava com o quê. Quem era o culpado e quem estava errado. Em uma pequena olhadela ao redor, Celso percebeu que os únicos que estavam chocados e choravam aquela perda eram os vizinhos e amigos de Tina, seus filhos, netos e outros parentes apenas discutiam quem iria ficar com o que.
As vozes em sua cabeça, não paravam de repetir as frases ditas por seus tios e por seu pai: esta casa é minha, não é minha. Celso deu um grito que surpreendeu a todos os presentes, ele disse:
_Chega! Vocês não amavam a minha avó, vocês são tudo um bando de “filhos da puta”.
E assim ele saiu daquela casa, correndo e sem destino, Celso estava confuso e resolveu ir embora.

Um sonho


Havia em Petrópolis vários casarões abandonados, o que antes fora uma das mais belas cidades do país, com suas ruas recheadas de belas esculturas residenciais construídas por barões, condes, marqueses e outros agora eram apenas ruínas que, apesar de provocar tristezas em alguns, eram vistas como lixo pela grande maioria dos moradores e do poder público que inclusive demolia alguns deles. Celso se entristecia ao ver estas ruínas e em meio à perda de sua avó, e decidiu ir residir em uma destas ruínas localizada em um lugar próximo a Praça da Liberdade.
Conseguiu emprego em um bar, ele estava feliz e fazia planos para seu futuro. Celso queria juntar dinheiro e viajar, ele queria ver o mundo e refletir sobre tudo que sua avó lhe havia contado, ele se fazia uma pergunta: porque sua avó havia escolhido ele para relatar a história da família e mais, porque pediu a ele para honrar o nome do avô que ele nunca conheceu e que havia sido morto por ser considerado um nazista.
Em 1988, Celso estava com 16 anos. Ele então decide que este seria o ano de inicio de sua jornada, ele queria dar inicio a seu plano de ir para o Uruguai, onde iria ficar por um ou dois anos e depois partiria para a República Argentina, mas seus planos tiveram que esperar um pouco, no mês de março, um mês famoso pelas chuvas que inundam a cidade. A casa de sua mãe foi atingida por um deslizamento de terra assim como varias outras residências em Petrópolis. Era comum isso acontecer com casas de pessoas pobres que sem condições, construíam as casas sem uma estrutura adequada ao terreno que geralmente era uma encosta, mas aquele ano, as chuvas causaram grandes estragos até em residência de pessoas ricas, foi uma catástrofe com mais de 136 mortos e Celso decidiu adiar sua viagem e ajudar a restaurar a cidade. Ele entrou como voluntário para a Cruz Vermelha Brasileira.
No ano seguinte, ainda havia espalhadas por todos os cantos de Petrópolis, marcas do que aconteceu no fim do verão passado, Celso continuou na cidade e não foi viajar, ele tinha conseguido um novo emprego e agora fazia pesquisas sobre história em busca de algo que ele mesmo não sabia o que, mas ele mantinha a vontade de sair pelo mundo.
Em 1989, no final do ano Celso viajou, foi para a cidade de Porto Alegre, no Rio grande do Sul, ao chegar na capital gaúcha, Celso ficou impressionado com o que via apesar de ter a certeza de que já conhecia a cidade, sentia isso ao tomar um ônibus e saber exatamente onde tinha que descer, ele se surpreendia com isso. Uma novidade o prenderia a Porto Alegre e lhe traria revelações.
Andando pelas ruas da cidade, Celso viu um cartaz que lhe chamou a atenção, o cartaz dizia: apresente-se! Tendo ao fundo o mapa do Brasil e um soldado. Celso foi à junta militar e alistou-se, em janeiro de 1990, ele estava entrando para o exercito no 8º Batalhão de Logística conhecido como Batalhão Partenom. Celso não havia terminado a quinta serie do ensino primário, porém, ele sabia de geografia como ninguém e sua segunda matéria era a história. Seus conhecimentos de geografia e por ser um autodidata, ele rapidamente caiu nas graças de um dos tenentes do batalhão, o tenente Humberto. O tenente logo seria transferido para a 2ª D.I. , a famosa segunda divisão de informação, considerada a melhor divisão de informação do Brasil. Humberto quando chegou a D.I. em junho, lembrou-se das qualidades do recruta Celso e fez com que ele fosse transferido para lá. Celso cresceu dentro da D.I. por seus próprios méritos, Humberto foi promovido a capitão e a divisão iria sair em missão, a primeira missão de Celso depois de um ano e meio no exercito.
O Brasil estava metido em um conflito diplomático com a Venezuela, devido a terras na região norte, fronteira com aquele país. Uma determinação do Estado Maior das Forças Armadas chegou a D.I. dizendo que ela enviasse para a região um contingente de cartografistas para efetuarem as devidas marcações e preservarem o território brasileiro. Assim, seguindo esta ordem, Celso e mais 136 soldados e oficiais sob o comando do Cap. Humberto aterrissavam em Barra do Garças em março de 1992, eles estavam ali para treinar por vinte dias e então iriam para uma vila que não aparece nos mapas políticos, chamada: Vila P8.
Ainda em Barra do Garças, Celso aprendeu diversas coisas que não estavam ligadas ao exercício militar e ele estava maravilhado com tudo aquilo e uma grande alegria tomou conta dele quando as ordens foram alteradas e eles não iriam mais para P8, ficariam ali por mais dois meses.
Após o período determinado, eles embarcaram em aviões que muitos consideravam os piores de nossa aviação, uma aeronave chamada P-16, uma aeronave que foi projetada para aterrissar em porta aviões e as suas azas se fechavam, esse detalhe fazia os passageiros em seu primeiro vôo tremerem, as azas durante o vôo pareciam que iam quebrar e Celso, olhando para elas dizia:
_Olha lá, elas batem mais que azas de um colibri! Os soldados ficam estarrecidos e Celso ria com os amigos. Era uma forma daquele aspirante ao posto de cabo passar o tempo.
Ao chegarem a Porto Alegre, eram 04h15min da manhã e eles estavam mortos. Foram direto para o alojamento da divisão e enfim encontrar o merecido descanso em uma cama, os alojamentos de campanha eram horríveis em meio à selva. Crentes de que iriam poder dormir o dia todo, eles pegaram no sono até que a alvorada tocou e era para todos, inclusive o contingente recém chegado. Celso ficou furioso quando vieram lhe acordar e os soldados, que já conheciam o humor de Celso pela manhã voltaram e disseram ao capitão o que aconteceu quando foram acordar Celso. O capitão e mais dois soldados vieram chamá-lo outra vez. Ao entrar no alojamento, o capitão foi diretamente a cama de seu amigo, mas que ali era apenas um soldado do exercito e disse, colocando as mãos em Celso:
_Celso, acorde!
_Vá para a puta que lhe pariu e me deixe dormir, porra!
_Soldado 129, Celso Vollmann, levante-se. É uma ordem!
Celso gelou quando ouviu a voz do capitão, em varias conversas quando Celso ia à casa do capitão, este lhe dizia para que nunca pisasse na bola porque ele não poderia fazer muito para lhe ajudar, Celso lembrou-se disto na mesma ora em que o capitão lhe puxava a coberta e lhe dava voz de prisão. O soldado foi levado para a cela da divisão e lá ficou por quinze dias.

Retomando a direção.


_Você tem duas opções, uma é pedir baixa e sair do exercito. Disse o capitão olhando para seu amigo, parado imóvel a sua frente.
_Qual a outra capitão? Perguntou Celso.
_A outra é você ser expulso da corporação Celso e como seu amigo eu irei lhe fazer um ultimo pedido: não me obrigue a tomar esta atitude contra você, já foi difícil conseguir que você pudesse dar baixa, não jogue isto fora. Ao ouvir isto, Celso sentiu que não poderia mudar a situação, ele havia dito o que disse na frente de dois soldados e o capitão não tinha outra coisa a fazer, ele na verdade estava agindo como um grande amigo de Celso e ele aceitou sair por opção. Com sua mochila nas costas, ele pegou a estrada em direção ao Uruguai, finalmente ele ira para a banda oriental, como alguns chamavam aquele pequeno país.
Quando chegou a fronteira do Brasil com o Uruguai, na cidade de Santana do Livramento, ele ficou intrigado com o que via, um povo falando dois idiomas e dois países sem uma fronteira foi à explicação que ele se deu para o que via. Santana era interessante por que imaginariamente, todos viam a linha divisória entre a cidade brasileira com a cidade de Rivera do lado uruguaio, Celso após dois dias em Santana ele enfim cruzou a fronteira pela primeira vez e este momento seria inesquecível, ele sentiu um frio a percorrer seu corpo e sentiu que algo estava para acontecer, ele foi para a estrada para conseguir carona para Montevidéu, a capital daquele país.
Era noite quando ele desembarcava de um caminha no mercado Manzanares, em uma avenida movimentada chamada Avenida Itália. Ele começou a procurar um local para dormir e se deu conta de que teria que dormir na rua, ele não falava espanhol e não conhecia a cidade.
Dormiu em uma praça e na manhã seguinte saiu em busca de um lugar onde poderia comprar algo para comer, encontrou uma padaria e comprou pão e um suco que ele achou a fruta desenhada na caixa muito bonita porem depois comprovou que “pomelo” era a pior fruta que já tinha experimentado na vida e que nunca iria tomar aquilo outra vez.
Era dia 15 de agosto e bem pertinho dele estava o maior estádio de futebol do Uruguai, o Centenário, onde naquele dia haveria uma partida de futebol entre o Uruguai e o Brasil, Celso sentiria o terror de ser brasileiro em um país estranho quando o Brasil ganha uma partida de futebol. Ele evitou ser reconhecido como brasileiro e isso mais tarde iria fazê-lo entender mais uma peça do quebra cabeça que era a história de sua família.
Celso voltou para o Brasil no dia seguinte.
De volta a Porto alegre, Celso conheceu alguns parentes seus e desejou ficar ali por algum tempo a fim de saber mais da trajetória dos Vollman’s da Alemanha para a América do Sul.
Um de seus parentes trabalhava no governo do estado e tinha uma pequena propriedade na cidade de Gravataí, Celso foi residir lá. Um sítio abandonado e que Celso aceitou o desafio de ficar sozinho ali e cuidar do local. Era um belo terreno, ficava a margem do rio que dava nome à cidade e que nos finais de semana vinham varias pessoas se banharem em suas águas para amenizarem o calor do verão gaúcho.
Celso fez algumas melhorias no sitio e todos gostaram do que viram, exceto uma ou duas pessoas que não se sentiam bem com a presença de Celso em meio à família e com tanta liberdade. Em um ponto todos eram unânimes: o que um carioca estava fazendo ali e com tanto vinculo com as tradições que ele não sabia e nem conhecia.
Depois de quase três anos em Gravataí, Celso achou que era hora de retornar a Petrópolis, sua cidade natal. Ele embarcou para o Rio de Janeiro na primeira semana de março e chegou rápido ao seu destino, foi ver os amigos e retomou seu trabalho, ele por um tempo esqueceu-se de seu objetivo e ficou mais tempo do que deveria em Petrópolis.
Celso retomaria sua busca poucos meses depois, desta vez ele estaria indo para outro lado, ele foi para o nordeste brasileiro, passou por varias cidades e pegou diversas caronas até chegar a cidade de Natal, capital do Rio Grande do Norte. Lá ele teve contato outra vez com alguns amigos do exercito, ele acampou em um terreno que pertencia ao Batalhão de Engenharia de Natal, ele conheceu alguns durante o tempo em que ficou em Barra do Garça. Como aquela área era militar e o batalhão a utilizava para treinamento, era perigoso ficar ali e uma ronda do batalhão logo encontrou o acampamento de Celso.
_Alto lá! Gritou um soldado quando Celso estava preparando café.
_Hei, eu já te vi em algum lugar, qual seu nome? Disse o sargento que acompanhava aqueles soldados para Celso. Imediatamente Celso lembrou-se do sargento Ornélas, um grande homem, que ele conheceu no exercito e ele lhe respondeu:
_Meu nome é Vollmann, Soldado 129, “ex” melhor dizendo, da 2ª D.I. Sargento Ornélas. E o sargento lembrou-se também daquele rapaz, os dois deram inicio a uma longa conversa e o sargento não gostou muito da forma como Celso saiu do exercito, mas aceitou as explicações do amigo, disse-lhe sobre o perigo de ficar ali, apesar de saber que Celso conhecia muito bem o que ele estava falando. O sargento indicou uma outra área onde ele poderia ficar e Celso foi para lá. Ele ganhou de seu amigo uma barraca e alguns utensílios que o sargento achou que ele iria precisar. Ornélas não sabia por que, mas senti que precisava ajudar o rapaz.
Quatro dias depois desta conversa, Celso estava entrando, na traseira de uma caminhonete, na Cidade de Buenos Ayres, República da Argentina. Novas revelações o aguardavam.
Celso agradeceu a carona e se dirigiu para o centro da cidade, ele estava maravilhado com tudo aquilo, a cidade era linda mesmo e ele queria ver tudo. Chegou a um bar e pediu um café, o dono do bar era um alemão e Celso foi falar com ele, o alemão ficou impressionado com o rapaz e dedicou um bom tempo a aquela conversa.
            Aquele alemão havia nascido em Dusseldorf e era de uma família pobre, migrara com toda a sua família para a Argentina em meados de 1944, e agora residiam no Bairro de Evita, um bairro pobre de Buenos Ayres. Impressionado com aquele brasileiro, ele o convidou para comer um churrasco argentino em sua casa no domingo, Celso aceitou o convite.


Mais um elo da história


Aquele domingo estava ensolarado e Celso saiu de dentro de sua barraca que havia montado nos fundos de um restaurante onde conseguiu emprego e agradeceu a Deus por aquele dia maravilhoso. Ele se arrumou para ir à casa de Johan. Era longe de onde ele estava e ele precisava sair cedo. Pegou o ônibus e depois outro para chegar ao endereço que o alemão havia dado a ele. Quando chegou, bateu palmas e um senhor, já bem idoso lhe atendeu, perguntou-lhe quem era e Celso respondeu:
_Sou Celso Vollmann, sou do Brasil e Johan me convidou para vir aqui hoje. Disse Celso. O senhor ficou olhando para ele e não se movia, atrás dele surgiu Johan e cumprimentou Celso e o fez entrar em sua casa.
_Não ligue para meu avô, ele é assim e às vezes não diz coisa com coisa, ele costuma dizer que ouve vozes que dizem para ele ir ao Brasil procurar por Theobald – neste momento Celso trava e deixa cair o copo de cerveja que estava em suas mãos e pergunta:
_Procurar quem?
_Um tal de Theobald, é um oficial do exercito alemão, Theobald Vollmann. Nesse instante, uma senhora de aproximadamente 65 anos, entra na sala e uma lagrima corre de seu rosto, ela diz:
_Então é verdade, meu Deus. Meu pai sempre disse que um dia iria encontrar seu amigo e era verdade, eu não conhecia muito bem, lembro-me vagamente de Theobald, mas meu pai Gustav, ele todos os dias fala nele. Sente-se meu filho, tenho algo a lhe contar.
A mulher sentou junto a ele e começou a contar-lhe uma história que ele já conhecia, mas com mais detalhes, com detalhes que Tina não poderia saber por que ela saiu antes do fim, Celso chorava quando lembrava em meio a aquela história de sua querida avó, e quando a mulher estava quase terminando a história o homem idoso que atendera a porta entrou na sala e foi até ele:
_Theobald, eu sei que é você e eu quero te pedir perdão, eu não quis fazer aquilo, eu não sabia que o meu testemunho seria fatal para você, me perdoe! Celso não entendia muito bem o que estava acontecendo, mas sentiu que precisava dizer algo:
_Senhor, não fique assim, eu não sei o que o senhor me fez, mas se é tão importante para o senhor, eu lhe perdôo. Gustav abraçou o rapaz e agora sorrindo disse para os seus familiares que estava um pouco cansado, que iria para o quarto dormir um pouco, todos lhe disseram que sim, que fosse descansar.
O churrasco estava muito bom e Celso a muito não se divertia tanto, a família toda estava feliz por sua presença e Celso já estava inclusive olhando para uma sobrinha de Johan com olhos mais brilhantes, seu nome era Sandy e ela era uma linda jovem com seus cabelos encaracolados e seus lindos olhos castanhos parecendo um par de pedras preciosas que iluminavam a vida de Celso. Ele estava conversando com ela quando alguém gritou dentro da casa:
_Vovô, acorde!. E todos correram para o quarto do avô, ao chegar, Celso viu o senhor que o havia pedido desculpas minutos antes, deitado sobre a cama com um semblante de paz e a seu lado uma de suas bisnetas chorava, segurando em suas mãos, a mão de seu avô.
Olhando para aquela cena no quarto de Gustav, Celso foi embora sem despedir-se de quase ninguém, o único que recebeu seu adeus foi o falecido encima da cama, Celso aproximou-se daquele corpo, pôs a mão sobre sua fronte fechando-lhe os olhos e em voz baixa, ele disse:
_Descanse em paz, meu amigo Gustav, descanse em paz.
Celso subiu no primeiro ônibus que viu e sem saber para onde ele iria, sentou-se e se pôs a lembrar de tudo que havia acontecido. Toda a história de Alfred, Albertina, Alemanha e tudo o mais que Celso havia escutado e colhido durante estes anos, agora passava na mente dele como se fosse um filme, mas ainda havia trechos que ele não compreendia muito bem, ainda faltavam alguns pedaços daquela história que ele precisava descobrir.
No bairro de Villa Puyerredon, na cidade de Buenos Ayres, Celso iria encontrar mais um elo daquela história. O final daquela linha de ônibus que Celso havia embarcado era em frente ao supermercado Walmart, próximo a Avenida Nazca naquele bairro, descendo do coletivo, Celso deu de frente com uma livraria um livro exposto na vitrine o chamou a atenção, o livro falava sobre o holocausto na Alemanha e em seu titulo perguntava se o holocausto era de judeus ou alemães? Celso precisava ler aquele livro. Entrou na livraria e perguntou quanto custava o livro e ao ser informado do preço, ele viu que não poderia comprá-lo, triste ele saiu da livraria. Aquele livro se tornaria uma obsessão na vida de Celso.

Quem matou quem?


Celso se fez uma pergunta ainda quando ouvia as histórias contadas por sua avó: quem matou quem na segunda guerra mundial. Ele ainda era muito novo naquela época para entender tudo aquilo, mas agora já passava dos vinte anos, não podia ter dúvidas a esse respeito. Decidiu voltar ao Brasil, onde poderia fazer as suas pesquisas sem despertar a atenção e com mais certeza devido ao idioma, que apesar de ele agora estar falando fluentemente o espanhol, ele preferia ler os livros em português, ele nunca gostou de ler e em espanhol seria pior ainda pensava ele.
Quando chegou a Petrópolis depois de tanto tempo fora, ele deu inicio as suas pesquisas na biblioteca municipal e para seu completo desgosto, ele descobriu que aquele livro havia sido editado durante o período em que o Brasil atravessou um longo tempo sob a ditadura militar e ele foi proibido aqui no Brasil. Inconformado com isso, ele se pôs a ler outros livros até que ele descobriu que em Porto Alegre, nos anos oitenta uma editora lançou aquele livro após a redemocratização do Brasil, a diferença é que ele saiu com outro nome e Celso enfim conseguiu ler o livro que tanto chamou a sua atenção. Depois de ler e reler aquelas páginas, Celso não entendia o porquê que aquele livro o atraiu tanto e ele chegou à conclusão de que não poderia ser o que estava escrito por que aquilo ele já havia ouvido a sua avó falar e já tinha lido em outros livros também. Ele se pôs a pensar e olhou e leu os créditos das fotografias, em um rápido estalo ele descobriu aquele fascínio por aquele condensado de contos da segunda guerra. Olhando fixamente para uma das fotografias, ele pegou uma lente de aumento para ver melhor e então teve a certeza que ele queria, em um foto de soldados presos em Nuremberg, ele viu a medalha que sua avó o havia dado pendurada no peito de um soldado e nos créditos estava escrito: um oficial alemão preso pelas tropas aliadas em Berlim.
Estava decidido, ele iria entrar em contato com aquele fotografo, ele iria descobrir o nome daquele soldado. Ligou para a editora e ela lhe informou o nome do proprietário das fotos. Ele viajou outra vez para Porto Alegre, o fotografo residia no Bairro Moinhos de Vento na capital gaúcha.
Quando Celso chegou diante do prédio onde residia o fotografo, Celso tremia devido ao que ele estava por descobrir, em um misto de querer e não querer saber a verdade, ele interfonou ao apartamento do fotografo e este pediu que ele subisse. O fotografo estava na esperança de vender algumas fotos para aquele rapaz e o tratou muito bem. Celso foi direto ao assunto e pediu para ver aquelas fotos do livro, com as fotos em sua mão e emocionado da possibilidade, ele perguntou ao fotografo:
_Você sabe o nome destes prisioneiros?
_Ah, sim. Está anotado no verso. Disse o fotografo. Celso virou a fotografia e começou a chorar.
Celso, agora sentado, chorava cada vez mais e o fotografo preocupado com ele, pediu a empregada para que trouxesse um copo com água para ele, Celso tremia e soluçava devido à emoção que sentia naquele momento, é que ao virar e ver o que estava escrito no verso daquela fotografia, ele não conseguiu manter a calma que desde a entrada do prédio ele estava mantendo, no verso estava escrito: Foto nº. 29 - Nuremberg, Alemanha – 1948 – soldados presos pelos aliados em Berlim no ano de 1945. Da esq. para dir.Tenente Eihischt, Capitão Médico Dintarff e o ajudante de ordens de Adolf Hitler, o Tenente Theobald Daudt Vollman.
Aquilo que estava escrito no verso colocou matéria no “virtualismo” das histórias contadas por sua avó e agora Celso tinha certeza da veracidade dos fatos que ele ouvia e acreditava. Era como se ele precisasse um ponto para poder ter a certeza absoluta, não que ele não acreditasse em sua avó, mas aquela história era demais para ele, é como se fosse um romance, um conto de fadas ou coisas assim, aquela foto veio em cheio para preencher as lacunas vazias da história que ele perseguia.
Disposto a realizar os desejos de sua avó, Celso começou então a pensar como faria isso. Ele voltou para Petrópolis.

O reencontro


As peças


De volta a sua cidade natal, Celso se prepara agora para reunir as peças deste enorme quebra-cabeça. Eram muitas as informações sobre a trajetória de sua família e ele queria reunir tudo para poder então analisar tudo e realizar o ultimo pedido de sua avó Albertina.
A vida e as forças que a regem não estavam tão dispostas a permitirem que ele realizasse essa tarefa ou então queriam testar o seu empenho e dedicação, mas muita coisa acontecia para evitar que ele obtivesse êxito.
Em 1998, Celso começou a namorar uma mulher que ele a considerava ideal, livre e desimpedia, Silvia era a companheira perfeita para um homem como ele, mas já nos primeiros meses as coisas não iam muito bem e Celso já não queria mais viver com Silvia, porém, uma notícia removeria de sua cabeça este desejo.
_Você será pai! Disse-lhe Silvia quando Celso chegou em casa, ele a olhou e ainda embriagado pela frase dita por ela, a perguntou:
_O que? Como assim?
Celso após se interar dos pormenores daquela notícia, desistiu de sua idéia de separação e jurou a si mesmo que aquela criança não iria passar pelo que ele havia passado quando criança. Dedicado e caseiro Celso aguardava ansioso pelo nascimento que aconteceu em fevereiro de 1999, Celso era todo alegria. A pequena menina recebeu o nome de sua bisavó paterna, ela recebeu o nome de Sophie Vollmann, e Celso a amava mais do que qualquer coisa, todos os dias ele cuidava dela como se só existisse aquele pequeno pedaço de gente, a quem ele apelidou de “Babú” sua alegria não poderia ser maior quando a primeira palavra dita por ela foi "Papa”, Celso chorava de emoção e alegria.
Tudo o mais havia sido esquecido por ele, mas a vida estava disposta a lhe trazer de volta a realidade e quando a menina completou um ano de idade, Celso já não vivia mais com a mãe de Sophie, entre idas e vindas, com sua ex-esposa, Celso conheceu alguém que mexeria com ele para sempre.
Monique Arantes era uma bela mulher, amiga de Celso a alguns anos, eles nunca tiveram nada além de conversas sobre coisas banais, sobre a vida e sobre seus problemas conjugais, mas nunca cogitaram a possibilidade de algo entre eles até que um dia, era véspera do aniversario de Celso e ele foi ate a casa de Monique. Os dois conversaram até tarde e devido ao avançado das horas, ela convidou Celso para ficar e dormir em sua casa, Celso aceitou e aquela noite seria o começo de uma grande alegria e de uma tristeza ainda maior. Os dois, como obra de um destino que não segue a padrões terrenos, uniram os dois em uma noite de amor que por um longo período seria uma das melhores lembranças de Celso, mas que estava com os dias de alegria contados.
Celso não tinha uma religião, ele tinha medo de mexer com coisas que ele não entendia muito bem, acreditava em Deus, mas a sua maneira e não aceitava muito bem as convenções dos homens a esse respeito. Tudo ia bem na vida do casal se não fosse um detalhe: a mãe de Monique.
Certo dia, pouco tempo depois de conhecer a mãe de Monique, durante o período em que Celso e Monique eram apenas amigos, Dona Ester, se deixou encantar por ele e lhe disse o que sentia, ele sem saber o que fazer contornou a situação e a levou como uma brincadeira. Isto só seria relembrado por Celso quando um dia, ele em casa sozinho Ester lhe disse que nunca tinha aceitado muito bem o fora que ele havia dado a ela e que ele sofreria por isso.
Quando as coisas começaram a ir mal, não começou aos poucos, Celso ainda tentou sair com a sua amada da cidade, mas isso não adiantou e os dois se separaram, Celso sofreria com isso.
Durante seu convívio com Monique, Celso descobriu algumas coisas que o ajudou a unir o seu quebra-cabeça e que era a chave final para o mistério dos Vollman’s.
Monique era de uma religião que acredita que as pessoas ao morrerem retornam ao mundo com outros corpos para concluírem a sua missão na terra ou purificar-se de pecados cometidos por ele a fim de evoluírem seus espíritos. Celso lembrou-se de tudo que sua avó disse ter acontecido com Theobald e do que o judeu Gustav, disse a ele quando esteve em Buenos Ayres. Ainda meio confuso Celso foi ler alguns livros sobre este assunto, que agora era quase uma obsessão para ele. Um livro prendeu a atenção de Celso, Monique o falou varias vezes sobre este livro, mas Celso no período em que viveu com ela nunca pegou este livro para ler e agora, entre lagrimas e risos, ele lia cada pagina com mais atenção do que qualquer outro daria. Ao terminar de ler o livro, seus pensamentos viajaram em uma trilha que ele não conseguia descrever, ele sentia a presença de seus avós, via coisas que ele, ainda confuso não conseguia entender, mas que agora eram aceitas por ele e por isso aumentavam a cada dia.
A separação de Celso e Monique era comemorada por muitos, inclusive amigos dos dois que sentiam inveja desta união e isso prejudicava Celso, que com essa força enorme o puxando para trás, ele não avançava e o cumprimento do seu destino estava por um fio. Tudo era motivo para Celso chorar, a solidão estava acabando com ele e um outro acontecimento o fez sentir-se pior. Quando ele ainda vivia com Monique, Celso começou a sentir dores em sua coluna e às vezes ele não conseguia andar, escondeu durante muito tempo isto de Monique até que um dia não deu mais, mas já era tarde, um pré-exame feito por ele ainda em Petrópolis acabou com ele. Ele foi a um médico que fez vários exames e disse que ele deveria procurar um oncologista, este nome fez Celso tremer, a especialidade que o havia sido indicado era uma confirmação para ele de que ele estava com câncer, ele se deprimia a cada dia e não controlava mais as suas reações, com depressão, ele discutia com todos e isso fez com que ele e Monique se separassem, mas ela não sabia o que passava com Celso e acreditava que ele era assim por ser assim e pronto.
Celso agora vivendo sozinho, sofria a cada dia a dor de mais uma perda e a sua saúde não ia bem, as dores estavam a cada dia maior e ele não tendo com quem conversar a este respeito se trancou ainda mais em seu processo depressivo até que, em um momento terrível para ele, não se sabe de onde, veio uma força que o acordou para a vida e ele lembrou do desejo de sua avó e decidiu cumpri-lo definitivamente.
Unindo tudo que sabia tudo que tinha ouvido e pedaços da história que ele colheu durante toda a sua vida, ele se pôs a pensar e a procurar como realizar o desejo de sua avó. Tentou entrar em contato com o governo alemão a fim de conseguir informações a respeito de Theobald, mas o governo disse que estes arquivos eram sigilosos e que somente autoridades poderiam ter acesso, Celso ainda tentou que por meio do governo brasileiro, estes arquivos fossem visto por ele, mas o governo não deu resposta ao pedido dele.
Com a medalha na mão e olhando para o monte de papel a sua frente, Celso se perguntava o que deveria fazer! Como ele iria honrar o nome de Theobald em um mundo que crucificou todos os alemães pelo que fizeram durante a guerra? E para piorar a situação, seu avô tinha sido ajudante de Adolf Hitler e só isso já era condenado pelo mundo, como? Ele se perguntou tanto isso que acabou jogando tudo que estava encima da mesa e foi deitar-se. Ele acabou adormecendo e teve um sonho. Ele sonhou que alguém chegava e via uma flor, ao ver a beleza daquela flor as pessoas, admiradas diziam: que bela flor. – Era um sonho estranho e Celso acordou sem entender o que aquele sonho significava.
No dia seguinte, ele saiu e foi até o centro da cidade, ele precisava ver outras pessoas e conversar sobre outros assuntos para que seus pensamentos fluíssem fora da pressão em que ele estava. Em dos pontos da cidade, ele viu a mulher que ele amava com outro e isso o deprimiu, ele pensou em chorar, mas não poderia fazer isto ali na rua e então decidiu voltar para casa, no caminho ele viu vários monumentos e estes chamavam a sua atenção, então ele teve uma idéia que o fez sorrir.
Chegou em casa e se pôs a procurar a medalha que sua avó o havia dado, quando a encontrou, ele lembrou-se do dia em que ele mostrou para Monique a medalha e disse a ela que iria doa-la para o museu da força expedicionária brasileira, este museu ficava atrás do Palácio Rio Negro, ele iria fazer isso naquele dia mesmo. Arrumou-se e com a medalha em suas mãos, ele foi para o museu.
Ao entrar no museu, ele tremia e sentia a mesma emoção que ele sentia quando estava para descobrir algo. Conversou com um rapaz que trabalhava no museu, este o apresentou ao diretor daquela instituição e que era o responsável pelos objetos expostos ali. Celso contou toda a sua historia e o diretor emocionado, pediu para ver a medalha, quando Celso entregou a ele aquela medalha, o diretor deixou cair de seus olhos, algumas lagrimas e lhe disse:
_Você vai mesmo doa-la ao museu?
_Sim, eu vou. Respondeu Celso que agora estava feliz por saber que estava fazendo a coisa certa.
_Então vamos marcar para daqui a uma semana o inicio da exposição desta honra que seu avô recebeu, vamos limpar e preparar a medalha e queremos que você a coloque no expositor, você aceita?
Celso estava tão emocionado que não conseguiu responder, sua boca não abria e ele apenas moveu a cabeça em sinal de que estava de acordo.

Enfim a paz


No dia e hora marcado com o diretor, Celso foi para o museu da F.E.B..
Já quase chegando a Av. Koeler, Celso encontrou com algumas pessoas que estavam conversando a respeito da diferenças sociais e religiosas que há no mundo e no Brasil e eles discutiam o que poderia ser feito para amenizá-las. Neste momento Celso lembrou-se de uma máxima do cristianismo e que para ele é pouco seguida pelos seus pregadores, ele pensava, a saída é simples, é só amarmos uns aos outros como ele nos amou. Sorrindo ele segui o seu destino.
Quando ele chegou ao museu, foi muito bem recebido lá estavam vários ex-pracinhas e ele viu a medalha apoiada sobre uma bandeira, uma bandeira alemã.
O diretor recebeu Celso e lhe disse que havia preparado uma cerimônia simples porque o museu não possuía muita verba e as coisas eram difíceis, Celso disse que isso não era problema, a cerimônia seria linda pelo ato que ela representava.
Celso segurou a medalha, que agora reluzia e mostrava o brilho de um herói, ele emocionou-se e levou a medalha até o local onde ela seria exposta. Houve uma emoção muita grande naquele momento e todos aplaudiam, Celso em meio a tudo que acontecia dizia apenas: “Vô Theobald, o senhor agora vai ficar onde deveria” e assim concretizava-se o desejo de Theobald e Albertina.
Quando terminou a cerimônia, Celso ia saindo do palácio e quando chegou na frente daquela construção, ele encontrou um casal de idosos, um homem vestido em um terno de linho branco, com seus olhos castanhos e um tipo altivo tendo ao seu lado uma senhora em um lindo vestido azul, como se fosse o céu e seus cabelos alvos lembravam as nuvens. O casal olhou para Celso, este pensou que devia ser mais um veterano e que havia se atrasado para a cerimônia, olhou-os também. A mulher virou-se para Celso e disse:
_Meu querido! Tire uma foto nossa.
Celso, ainda envolto pela emoção da cerimônia, sorriu para o casal e tirou uma fotografia do casal e se despediu deles, deu alguns passos e lembrou-se de onde conhecia aquele olhar doce e meigo daquela mulher, era o mesmo semblante de sua amada avó Albertina, ele olhou imediatamente para trás e não viu mais o casal, voltou correndo ao museu e não os encontrou, olhou para a maquina em sua mão e saiu correndo para o centro da cidade a fim de por aquele filme para revelar.
Entrou na primeira loja de revelação que encontrou e pediu para revelar aquele filme imediatamente. O atendente da loja lhe disse que levaria uma hora, era o tempo mínimo para isso, ele deixou seu filme lá e foi tomar um café. Depois de vários cigarros e uma quantidade enorme de cafés, Celso foi à loja pegar as fotos, olhou uma por uma e derrepente parou e olhou fixamente para a foto que havia tirado daquele casal enfrente ao Palácio Rio Negro, ele não consegui segurar as lagrimas que rolaram pelo seu rosto, emocionado, Celso olhou para o céu azul que fazia naquele dia quente de verão, a fotografia estava colada ao seu peito, nela estava um casal, sendo que o homem vestia o uniforme do exercito alemão e ele trazia a medalha pendurada em seu peito e a mulher vestia o vestido de cetim azul que ele havia visto, Celso sabia que ele tinha falado com seus avos e que aquele drama que o acompanhou durante vários anos havia ido embora e ele agora estava em harmonia com a vida novamente. Ele enfim havia compreendido tudo que precisava para ser feliz e disse:
 _Descansem em paz e que Deus abençoe vocês, Theobald e Albertina, meus avós, eu amo vocês.











“Esta é uma obra de ficção com base em fatos reais e os nomes e locais aqui descritos são apenas uma homenagem a quem sempre, de uma forma ou de outra, me ajudaram a chegar até aqui”.










In Memória de Albertina Neumann





A obediência cega imposta pelo serviço militar não te absolve dos crimes cometidos quando sob ordens você os cometeu.
A condecoração foi aceita, este é o seu triunfo, este é o seu preço.